Se a parte do
cérebro que tem adormecida lhe permitisse, lembrar-se-ia quando começou a ser
selectivo no que respeita ao cinema, ao teatro, aos livros, à música.
De certeza certa sabe que por um qualquer dia de Março de 1961, se sentou no
Pavilhão dos Desportos em Lisboa, para ver teatro.
A Câmara Municipal de Lisboa, o SNI, patrocinava o “Teatro Popular de Lisboa”
dirigido por Pedro Bom.
Não viu tudo, não leu tudo, não ouviu tempo mas consumiu tudo o que lhe viesse
parar, aos olhos, aos ouvidos, às mãos.
Razão suficiente para estas Duas-Peças-Duas:
“O Morgado de Fafe em Lisboa”, comédia em 2 actos de Camilo Castelo Branco e
“Falar Verdade a Mentir”, comédia em 1 acto de Almeida Garrett.
No programa poderia ler-se:
Espectáculo para maiores de 12 anos.
Haverá um intervalo de 10 minutos entre os 1º e 2º actos de “O Morgado de Fafe
em Lisboa” e outro de 20 minutos entre esta peça e a comédia “Falar Verdade a
Mentir”.
Encenações de Pedro Bom.
Apontamentos cenográficos e arranjos de cena de Mário Alberto.
Guarda-roupa gentilmente cedido pela Empresa Rey Colaço-Robles Monteiro.
Cabeleiras de Alberto Madureira.
Sonorização de Luís Moreira e Afonso Araújo.
Ponto: João da Silva.
Contra-regra João Leiria.
Actores que participavam nas duas peças: Carlos Costa, Fernanda Alves,
Alexandre Vieira, António Anjos, Maria José, Ruy Mendes, Victor Ribeiro.
Actores que apenas participavam na peça de Camilo: Maria Albergaria, Mário
Sargedas, Cândida de Lacerda, Roberto Viana, Manuel de Oliveira.
Na contracapa do programa, Luiz Francisco Rebelo situava historicamente as duas
peças e os autores.
Notas à margem:
Imaginem as condições acústicas do Pavilhão dos Desportos para ver teatro.
Imaginem que o espectáculo começava às 21,45, havia meia-hora de intervalo, e
calculem a que horas o espectáculo acabava.
Imaginem que ele descia, a pé, parte do Parque Eduardo VII, toda a Avenida da
Liberdade para ir apanhar, ao Martim Moniz, o eléctrico para a Graça, que o
deixava em Sapadores, e depois ia para casa, na Rua da Penha de França, não
tinha a chave de casa, tocava à campainha, o pai abria-lhe a porta.
Imaginem que ele naquele tempo tinha 16 anos e daí a pouco, às 08,30, horas
começava as aulas no Liceu Gil Vicente”.
Era feliz, sabe-o agora.
Sente hoje um arrepio gelado quando presencia uma enormidade de gente a
proclamar, ufana, a sua incultura.
Sabe que os governantes deste país têm um soberano desprezo pela cultura.
O 25 de Abril já fez 52 anos.
Sempre é verdade que se envelhece!
Mas a Cultura nunca é um enfeite.

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