Estamos, hoje, com o nº
25 da Colecção Poetas de Hoje, editados pela Portugália Editora.
O poeta é o
António Reis mais os seus Poemas Quotidianos.
Quem escreveu o
prefácio, quase obrigatório, como disse José Gomes Ferreira, foi o Eduardo
Prado Coelho.
«Em António Reis, toda a poesia emerge do silêncio –
processo difícil, lento, convulsivo. Porque se trata dum silêncio tenebroso,
feito de cegueira e rouquidão, feito de dias alucinados repetidos, feitos de
esgares apenas – esse silêncio de pedra que é o quotidiano de muitos.»
A lápis, o
livreiro, escreveu, naquele tempo, o quanto custavam Os Poemas Quotidianos:
35$00. Trinta e cinco escudos que, ao câmbio de hoje, são 0, 175 euros. Dá
mesmo para acreditar? Dá! E terá que se dizer que aqueles 35 escudos eram
tirados de ordenado curtíssimo porque muitos livros da Biblioteca da Casa foram
comprados com sacrifícios vários.
Não tenho
palavras para vos contar o que foi a alegria, o prazer, o espanto que a leitura
destes Poemas me trouxe.
O Eduardo Prado
Coelho, no 1º volume de Tudo o Que Não Escrevi, fala assim de António Reis:
«Pensava-o imortal, não sei porquê. Talvez porque
nunca o vi envelhecer. Entrou em minha casa há vinte anos – uma casa vagamente
«minha», onde morei apenas alguns meses ali para os lados da avenida de Roma.
Uma casa que nem me chegou a ser casa, a não ser por duas ou três coisas muito
nítidas que nela me aconteceram. Uma delas foi o António Reis. Ele vinha do
Porto, não sei se naquele dia ou no meu imaginário, e era alguém que tinha
escrito uns poemas de uma extrema sensibilidade, rasantes ao solo, de uma sensibilidade
minimalista, a que chamar por isso mesmo Poemas Quotidianos. O meu mérito estava em ter gostado daqueles versos; o
erro seria complicá-los demasiado. Desde esse dia que me ligou ao António Reis
uma enorme cumplicidade. E isso transbordou para o cinema. Para o Jaime, primeiro.
E depois para o Trás-os-Montes.»
Sim, porque
António Reis, para além de poeta e professor na Escola de Cinema, foi o
cineasta de filmes que realizou com a sua mulher Margarida Cordeiro e escreveu
os diálogos para o filme Mudar de Vida de Paulo Rocha.
Maria João Duarte
escreveu:
«Não sei se este
homem nasceu primeiro poeta ou cineasta.»
Manuel António
Pina no Jornal de Notícias escreveu uma crónica «Lembrança De António
Reis»:
«Muitos anos antes, tínhamos (eu, o Chico, o Eduardo
Guerra Carneiro, o Manuel Bernardo, o Madureira, quase todos já mortos) pouco
mais de 20 anos e trazíamos o coração, sob a forma dos Poemas Quotidianos de
António Reis, debaixo do braço, partilhando-os nos cafés do Carmo e de São
Lázaro e lendo-os em voz alta pela noite
fora no TUP, como uma espécie de senha por que nos reconhecíamos».
António Reis
morreu por um Setembro de 1991 e quase não foi notícia. António Cabrita, no
Expresso, insurgiu-se contra esse facto, as muitas ausências no funeral, ou
como escreveu João Mário Grilo: «chocou-me ver como é que se morre tão
sozinho. Foi a enterrar com os amigos, o que também é bonito, mas não sei… o
Reis merecia mais, foi alguém de quem fomos testemunhas. Acho que este país lhe
deve mais do que lhe pagou.»
É este o poema
que António Reis escolheu para Autógrafo da Colecção Poetas de Hoje:
Tenho nome
nome
tem nome um tecido
um objecto
o vento
oh murmúrio
de lábos juntos
no tempo que me esconde
António Reis, como epígrafe para os seus Poemas Quotidianos, escreveu uma frase de Saint-Exupéry tirada de A Terra dos Homens:
«Os homens não sabem o que é uma laranja.»

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