quarta-feira, 14 de maio de 2025

HÁ-DE FLUTUAR UMA CIDADE NO CREPÚSCULO DA VIDA

há-de flutuar uma cidade no crepúsculo da vida

pensava eu... como seriam felizes as mulheres

à beira mar debruçadas para a luz caiada

remendando o pano das velas espiando o mar

e a longitude do amor embarcado

 

por vezes

uma gaivota pousava nas águas

outras era o sol que cegava

e um dardo de sangue alastrava pelo linho da noite

os dias lentíssimos... sem ninguém

 

e nunca me disseram o nome daquele oceano

esperei sentado à porta... dantes escrevia cartas

punha-me a olhar a risca de mar ao fundo da rua

assim envelheci... acreditando que algum homem ao passar

se espantasse com a minha solidão

 

(anos mais tarde, recordo agora, cresceu-me uma pérola no

coração. mas estou só, muito só, não tenho a quem a deixar.)

 

um dia houve

que nunca mais avistei cidades crepusculares

e os barcos deixaram de fazer escala à minha porta

inclino-me de novo para o pano deste século

recomeço a bordar ou a dormir

tanto faz

sempre tive dúvidas que alguma vez me visite a felicidade

Al Berto de Salsugem em O Medo

  

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