Carta de
Mário-Henrique Leiria, enviada de S. Paulo com a data de 11 de Fevereiro de
1964, para a «Isabelinha bonita»:
Dou-te agora algumas notícias da minha vida, que mão tem sido das mais
aleres, talvez porque eu não tenha jeito para saber viver.
O trabalho, coisa que mão tenho outro remédio senão fazer, continua um
tipo “free lance”, visto que, indocumentado (ainda), calcula tu!) quase
2indesejável”, não posso ter emprego fixo. Tenho ultimamente trabalhado em
arquitectura promocional, realizando stands para Feiras e Salões que abundam
por aqui. É geralmente bem pago… quando pagam; e eu sou um razoável criador
desse tipo de coisas; muito alumínio, muito vidro, estruturas metálicas, montagens
fotográficas e pronto, Não esqueças que fui “quase” arquitecto antes de ser
expulso (com o Zé Dias Coelho) da ESBA em 1942, por políticas, claro, diziam
até que eu tinha muito jeitinho e ia ter um lindo futuro… viu-se…
Entretanto a minha teimosia cabeçuda tem-me continuado a levar para
aquilo que ainda continuo a acreditar como justo e certo. Entrei para o PC cá
da terra, mas já tive briga grossa. Raios me partam, porque diabo nunca mais
aprendo a ser aluno e pacífico? Quando te disse que estive perto de ti é porque
estive de facto. Fui, há meses, com outro nome e só por quatro dias, a uma
espécie de congresso num país socialista. Mas, ó diabo, voltei a toque de
caixa, porque também aí briguei quando pensaram que eu devia fazer só que sim
com a cabeça. Sou ou não sou briguento? Como me pagaram tudo (não tenho nem
sombra de dinheiro para uma viagem dessas) pensaram talvez que eu era um
boneco. Porra, não sou.
Mário-Henrique Leiria em Depoimentos Escritos
Mário-Henrique Leiria em Depoimentos Escritos
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