12
de Outubro de 1967
Parece que sempre
conseguiram matar o Che Guevara, ao que dizem os jornais. Embora o sinta, não
adiro com o mesmo sentimento que tive e tenho pelo Lumumba. É muito diferente
lutar e morrer no seio do próprio povo ou agir como caixeiro-viajante da
aventura revolucionária, no sei de outros. A dinastia dos Malraux nunca me foi
simpática e a realidade confirma que há boas razões para isso.
Mário
Sacramento em Diário
«Muitos consideram-me
um aventureiro e na verdade sou-o, mas de um tipo diferente, do tipo dos que
arriscam a pele para provar o que dizem.» Frase-resumo, em que há Sol e Trevas
– e que incendeia a imaginação do radicalismo pequeno-burguês, neo-romântico
ainda, em sua masturbação. Não basta querer a revolução. É preciso saber
fazê-la.
Poema
para Che Guevara escrito por Jorge de Sena:
Neste vil mundo que nos
coube em sorte
por culpa dos avós e de
nós mesmos
tão ocupados em
desculpas de salvá-lo,
há uma diferença de
revoluções.
Alguns sofrem do
estômago, escrevem versos,
Outros reúnem-se à
semana discutindo
o evangelho da semana;
outros agitam-se
na paz da consciência
que adquirem
com agitar-se em
benefícios e protestos;
outros param com as
costas na cadeia,
para que haja
protestos. Há também
revoluções, umas a
sério, que se acabam
em compromissos, e
outras a fingir,
que não acabam nem
começam. Mas são raros
os que não morrem de
úlcera ou de pancada a mais,
e contra quem agências
e computadores
se mobilizam de
sabê-los numa selva
tentando que os
campónios se revoltem.
Os campónios não se
revoltam. E eles
São caçados, fuzilados,
retratados
em forma de cadáver
semi-nu,
a quem cortam depois
cabeça, mãos,
ou dedos só (numa ânsia
de castrá-los
mesmo depois de mortos)
e o comércio
transforma-os logo num
cartaz romântico
para quarto de jovens
que ainda sonhem
com rebeldias antes de
se empregarem
no assassinar pontual
da sua humanidade
e da dos outros, dia a
dia, ao mês,
com seguro social e
descontando
para a reforma na
velhice idiota.
Ó mundo pulha e pilha
que de mortos vive!
No
8º volume do seu Diário, Miguel Torga, sobre a morte do Che, colocava este
poema:
Não choro, que não
quero
Manchar de pranto
Um sudário de força combativa.
Reteso a dor, e canto
A tua morte viva.
A tua morte morta
Pelo próprio terror em
que ficaram
À sua frente
Aqueles que te mataram
Sem poderem matar o
combatente.
O combatente eterno que
ficaste,
Ressuscitado
Na voluntária
crucificação.
Herói a conquistar o
inconquistado,
Já sem armas na mão
Quem te abateu, perdeu a guerra santa
Da liberdade.
Fez brilhar na manhã do
mundo inteiro
Um sol de redentora
claridade:
O teu rosto de Cristo guerrilheiro.
.jpg)
Sem comentários:
Enviar um comentário