terça-feira, 21 de outubro de 2025

O OUTRO LADO DAS CAPAS


A Cidade e as Serras

Será com certeza o livro mais conhecido, mais lido de Eça de Queiroz.

Grande parte das edições dos livros de Eça que fazem parte da Biblioteca da Casa, são os que a Lello & Irmão editaram.

Foi num desses livros que li pelos meus 13 anos, A Cidade e as Serras. 

Acontece – e aconteceu algumas vezes – que o livro desapareceu. 

Num escritório de import-export, meu primeiro emprego, os processos, volta e meia, não apareciam. O patrão alemão clamava «onde está o processo da Miele?». Silêncio gritado na pequena sala. 

Voltava o alemão,  sr. Heick de seu nome: « foi para a praia?»

Por onde anda o livro do Eça editado pela Lello & Irmão, tantas vezes lido, tantas vezes manuseado?

O exemplar que agora existe, comprei-o num alfarrabista. A edição do Círculo informa que o livro tinha uma sobrecapa de Antunes. Mas o alfarrabista garantia que o livro já o comprara sem a sobrecapa.

Razão da deselegância desta capa do livro que se publica.

Mas não sairei sem voltar a ler o pedacinho em que Eça fala do arroz de favas e dos peitos trementes da «formidável moça, de enorme peitos que lhe tremiam dentro das ramagens do lenço cruzado»

Que maravilhosos Eça de Queiroz!

«… Santo Deus! Há anos que não sinto esta fome.

Foi ele que rapou avaramente a sopeira. E já espreitava a porta, esperando a portadora dos pitéus, a rija moça de peitos trementes, que enfim surgiu, mais esbraseada, abalando o sobrado – e pousou sobre a mesa uma travessa a transbordar de arroz com favas. Que desconsolo! Jacinto, em Paris, sempre abominava favas!... Tentou todavia uma garfada tímida – e de novo aqueles seus olhos, que o pessimismo enevoara, luziram procura os meus. Outra larga garfada, concentrada, com uma lentidão de frade que se regala. Depois um brado:
-Óptimo!... Ah, destas favas, sim! Ó que fava! Que delícia!

E por esta santa gula louvava a serra, a arte perfeita das mulheres palreiras que em baixo remexiam as panelas, o Melchior que presidia ao bródio…

- deste arroz com fava nem em Paris, Melchior amigo!»

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