Agosto
de 1965.
O
meu pai chega a casa revelando que o Carvalho da Clássica Editora, antes da chegada da
PIDE para proibir o livro, conseguiu esconder alguns.
O
livro era A Revolução de 1383 de António Borges Coelho. Em 1964 já tinha
colocado «Fora do Mercado», também da autoria de António Borges Coelho um livro
editado pela Prelo: Raízes da Expansão Portuguesa.
Lê
e depois conversamos, disse-me.
Antóbio
Borges Coelho abre o livro com uma citação tirada do Emílio de Jean Jacques
Rousseau, seguindo-se uma homenagem a Fernão Lopes:
«Os
sublevados de 1383 ganharam a sua causa. Se a tivessem perdido, talvez
conhecêssemos tão só as maldições do poder.
Assim
todo o 1º e boa parte do 2º volumes da Crónica de D. João I são dedicados à
narrativa e exaltação da gesta revolucionária.»
Tenho que ir muito longe nas leituras para balizar a primeira vez que vi uma referência a Rio de Onor. Foi em A Revolução de 1383 de António Borges Coelho.
E hoje não consigo de adiantar os porquês do fascínio.
É
na Viagem a Portugal de José Saramago que volto a encontrar Rio Onor. Pelo meio
há um poema do Ruy Belo, mas só o li depois da Viagem de Saramago, pertence ao
livro A Nau dos Corvos e está na página 326 de Todos os Poemas de Ruy Belo:
O
GIRASSOL DE RIO DE ONOR
«Existe
juro um girassol em rio de onor
mais
importante por exemplo para mim que seja lá quem for
Eu
vi hoje na andaluzia o girassol de rio de onor
à
beira de uma estrada pouco antes de chegar a fernan nuñez
(Amigos
que passais em direcção a córdova ou aos cobres de lucena
dai-me
notícias desse girassol menos brilhante sol
mas
bem mais acessível pelo menos para nós que não temos raízes
mas
pomos o que temos sobre a terra)
Reconheci-o
logo embora há muitos anos o não visse
além
de o conhecer sabia ser ele natural de rio de onor
e
lá habitualmente residente
É
ele raios o partam disse idênticas as pétalas igual a cor
é
ele ó céus é ele sem tirar nem pôr
o
meu amigo girassol de rio de onor
(é
fácil ter na flor um verdadeiro amigo
se
o não sabíeis antes desde agora que o sabeis)
Era
mesmo era ele sem tirar nem pôr
o
girassol de rio de onor há tantos anos visto
Mas
nós os que lá fomos e por lá passámos
nós
é que já não somos quem lá fomos
e
muito menos nós que somos vivos menos os mesmos somos
que
tu ó meu amigo com as tuas
duas
pernas pendentes lá da ponte sobre o rio
pequena
ponte e diminuto rio
a
dois passos dos olhos tão redondos que solares
dessas
duas ou três quatro no máximo crianças
(meu
deus essas crianças onde é hoje o seu país?)
Viajo pela espanha mas é este julgo juro o girassol
pois
embora não esteja em Portugal
não
há ainda julgo plantas nacionais
e
além disso aquela terra é meio espanhola
Mas
nós que assim passamos pelos campos pelos dias
nós
que não temos nem nunca tivemos
coisa
pequena como uns palmos de país
pomos
tudo o que somos nestes seres que
passamos
e
nos fixamos só em certas fotografias que tiramos
Era
aquele julgo juro o girassol de há anos
mas
nós que como sombras por aqui passamos
porventura
seremos os que éramos há anos?
Qual
é ao certo o nosso verdadeiro país?
Lanço
a pergunta aos verdes campo outonais da andaluzia
mas
esta paisagem que tanto me diz
quem
sou isso é que ela nem ninguém mo diz»
Mas voltemos A José Saramago:
Mas o viajante reconhece que «Não está bem em si: Afinal chegou a Rio de Onor, tanto o quis e agora nem parece contente. Certas coisas que muito se desejam, não é raro que nos deixem perdidos quando as obtemos.»
Também se encontra confuso. De Rio de Onor, para além do livro comovedor de que atrás fala, Saramago não indica o nome do autor do livro e apenas guarda a generosidade de Daniel São
Romão e sua mulher que lhe deram pão e bagaço.
«Afinal
de contas, onde está a fronteira? Como se chama este país, aqui? Ainda é Portugal?
Já é Espanha? Ou é só Rio de Onor, e nada mais que isso?»
A
Rio de Onor chamaram um dia uma das aldeias Maravilhas de Portugal. Ao lado há uma
outra aldeia vizinha com o mesmo nome, mas em terras de Espanha. Contudo uma
placa lembra: "Mentalmente somos um
só povo.".
E de novo António Borges Coelho:, pág.36 de A Revolução de 1383:


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