Nasci
em casa, na Rua Mestre António Martins, ali à Penha de França.
Decorria
o parto e a minha avó tinha uma galinha a coser. Acreditem ou não, fiquei com o
cheiro da hortelã que salpicava a canja.
Nas
traseiras havia quintais, hortas, urtigas e azedas, batatas e couves diversas,
lagartixas espreguiçavam-se, corriam pelas pedras dos muros.
E
havia a Vila Amaral, terra aberta às brincadeiras, às púrrias.
Foi
nessas hortas muradas que olhei os primeiros girassóis de que guardei o gosto, que,
muitos anos depois, Van Gogh haveria de prolongar e consolidar.
As
quintas, os quintais, as hortas já não existem, deram lugar a prédios mas a
Vila Amaral sim, e ainda lá estão as casas-barracas, constituindo um estreito e
comprido corredor.
Havia
os rapazes da rua Mestre António Martins e a malta ranhosa da Vila Amaral.
A
minha infância dividiu-se entre os rapazes da rua e a malta que vivia na vila.
Dos
pais da malta miúda que vivia na Mestre António Martins, apenas o meu não proibiu
o convívio com a malta da vila. Essa malta era a que eu preferia para passar os
dias. Muitos anos depois, a minha avó materna diria que não cheguei a doutor
nem a engenheiro porque preferi esse convívio onde nada se aprendia.
Sim,
não cheguei e doutor nem engenheiro, mas aprendi vivências e solidariedades,
outras maneiras não de viver, mas sobreviver.
A
pátria da minha infância.
A
infância não envelhece, escreveu algures o Dinis Machado.
Sem comentários:
Enviar um comentário