domingo, 31 de dezembro de 2017

POSTAIS SEM SELO


A festa de passagem do ano é tanto uma ocasião de celebração como de amnésia. É como um adolescente que discute com os pais e depois vai ouvir “hard rock com os “headphones” postos. É uma fuga, uma desconversa, um desatino.

Pedro Mexia

ILUMINAÇÕES DE NATAL



Praça da Figueira.

SARAMAGUEANDO


Hoje é o último dia do ano. Em todo o mundo que este calendário rege andam as pessoas entretidas a debater consigo mesmas as boas acções que tencionam praticar no ano que entra, jurando que vão ser rectas, justas e equânimes, que da sua emendada boca não voltará a sair uma palavra má, uma mentira, uma insídia, ainda que as merecesse o inimigo, claro que é das pessoas vulgares que estamos falando, as outras, as de excepção, as incomuns, regulam-se por razões suas próprias para serem e fazerem o contrário sempre que lhes apeteça ou aproveite, essas são as que não se deixam iludir, chegam a rir-se de nós e das boas intenções que mostramos, mas, enfim, vamos aprendendo com a experiência, logo nos primeiros dias de Janeiro teremos esquecido metade do que havíamos prometido, e, tendo esquecido tanto, não há realmente motivo para cumprir o resto, é como um castelo de cartas, se já lhe faltam as obras superiores, melhor é que caia tudo e se confundam os naipes.

José Saramago em O Ano da Morte de Ricardo Reis

NÃO ACONTECE SÓ AOS OUTROS...


Aconteceu-me agora, neste findar de ano.
Tenho de notícias de amigos e conhecidos que, junto aos ecopontos da cidade, encontram caixas e sacos com livros e revistas.
O José Pacheco Pereira, por exemplo, é um campeão na recolha de livros e outros documentos.
Manhã cedo, a caminho na padaria, encontrei um saco com livros, que já tivera mais quantidade, mas ainda consegui respigar:

A 23º edição (1998) de A Sibila de Agustina Bessa-Luís,
A Ilha do Tesouro, uma adaptação na colecção de Clássicos Juvenis da Porto Editora,
Lugar de Massacre  de José Martins Garcia
Ulisses, numa adptação  de Maria Alberta Menéres
O Segredo do Rio de Miguel Sousa Tavares
Livros para colorir da Porto Editora
O Manual do Pai de Will Glennon
Contra o Fanatismo de Amos Oz
Diversos livros infantis para desenhar e colorir.

Que leva alguém a abandonar livros?
Serão vários os motivos, mas convém realçar que houve o cuidado de os deixar à disposição de quem passasse e não os enfiar ecoponto abaixo.
Num agradecimento a esse alguém, irei ler – finalmente! – A Sibilina de Agustina Bessa-Luís.
Já por aqui deixei escrito que os meus preconceitos com a autora são mais políticos que literários.

Tentarei, por estes primeiros tempos do ano prestes a começar, tentarei explicar melhor esse preconceito.

É PERMITIDO AFIXAR ANÚNCIOS



Até 6 de Janeiro ainda está a tempo de olhar as Iluminações de Natal de Lisboa.
A Câmara diz-lhe para deixar o trenó em casa e ir ver a s iluminações utilizando os transportes públicos.

NATAL DE 1934


Todas as coisas aumentavam de sentido
havia doçuras de lã na própria neve
e a resina sangrando na lareira
punha milagres etéreos entre os ramos

Os ornamentos dos linhos e das arcas
fartas farturas premeditadas para a hora
exalavam uma tradição quentinha
todos os anos morrendo mais um pouco

Os sinos disputavam com os galos
a dialéctica dos mitos comoventes
renascendo no sapatinho do meu pé

Memória antiga de uma ternura doce
meu sentimento retomado dos ausentes
noite de lendas mágicas e solenes

João Apolinário, poema retirado da Antologia Natal… Natais

sábado, 30 de dezembro de 2017

ILUMINAÇÕES DE NATAL



Largo do Martim Moniz e, ao longe,  as ameias dos Castelo de São Jorge.

NATAL


Um anjo imaginado,
Um anjo diabético, atual,
Ergueu a mão e disse: — É noite de Natal,
Paz à imaginação!
E todo o ritual
Que antecede o milagre habitual
Perdeu a exaltação.

Em vez de excelsos hinos de confiança
No mistério divino,
E de mirra, e de incenso e ouro
Derramados
No presépio vazio,
Duas perguntas brancas, regeladas
Como a neve que cai,
E breve como o vento
Que entra por uma fresta, quizilento,
Redemoinha e sai:

À volta da lareira
Quantas almas se aquecem
Fraternalmente?
Quantas desejam que o Menino venha
Ouvir humanamente
O lancinante crepitar da lenha?

24.12.1962

Miguel Torga, poema retirado da Antologia Natal… Natais

OUTROS NATAIS

sexta-feira, 29 de dezembro de 2017

POSTAIS SEM SELO


Porque a gente que viu pouco mundo, como viu pouco, também costuma dar pouco crédito ao muito que os outros viram.

Fernão Mendes Pinto

Legenda: fotograma do filme Peregrinação de João Botelho.

1947


Mécia:
Não é já de Natal esta poesia.
E, se a teus pés deponho algo que encerra
e não algo que cria,
é porque em ti confio: como a terra,
por sobre ti os anos passarão,
a mesma serás sempre, e o coração,
como esse interior da terra nunca visto,
a primavera eterna de que existo,
o reflorir de sempre, o dia a dia,
o novo tempo e os outros que hão-de vir.

31.12.47

Jorge de Sena, poema retirado da Antologia  Natal…Natais

Legenda: Mécia de Sena

OUTROS NATAIS

quinta-feira, 28 de dezembro de 2017

POSTAIS SEM SELO


A felicidade não é coisa fácil de se contar. É também uma coisa que se vai gastando, sem que ninguém dê pelo desgaste.

Henri-Pierre Roché em Jules e Jim

A ÚNICA COISA A QUE TENHO DIREITO


Carta de Mário-Henrique, sem indicação do local da escrita, apenas Fevereiro, 25 – seis da manhã, o desespero a saltar por linhas e entrelinhas:

«Acredita, amor, é a primeira vez na vida em que me sinto totalmente vencido, num beco sem saída, completamente desesperado e com um enorme desejo de desaparecer. Para quê viver assim? Para quê tentar ainda ir à procura de qualquer coisa?»

E ainda:

«Afinal, para que te conheci eu, se te vou perder? Para quê, amor? Mais uma das boas e cínicas partidas que a vida me vai fazendo e que, afinal, é a única coisa a que tenho direito neste mundo.»

NATAL


 Inverno lactescente, adormecido
Querer, noite encantada
Já não sinto, porém, aquele amor,
Nem a vida sonhada

Tudo se foi, pouco nos resta,
Ilhas não há. Montanhas só no espírito
Se elevam, distantes e coroadas pela solidão.

No muro da minha alma há uma fresta.
Por ela entra o vento e a multidão
Das vozes e dos signos.

Quando a certeza chega, o coração
Lança de si os trajes mais indignos
E entra, sorrindo, na festa.

Ruy Cinatti, poema retirado da Antologia Natal… Natais.

Legenda: fotografia de Savas Kazantzides

OUTROS NATAIS

quarta-feira, 27 de dezembro de 2017

POSTAIS SEM SELO


Uma boa consciência é um Natal contínuo.

Benjamim Franklin

UM NATAL DE CABO VERDE


Da longa haste a despontar do Gólgota
não desceu até agora
a flor sobre esta face da terra.

Nem na noite de Natal!...

Nossa encosta é ressequida,
nem um prelúdio de asa
ou uma gota
a pontilhar a fímbria
do amplo céu espraiado.

Terra dos olhos fincados
numa ruga do horizonte
oh, longas mãos apontando
o alúde de chuva
no mais além insculpido!...

Nuno de Miranda

Legenda: desenho de Nuno de Siqueira

NOTÍCIAS DO CIRCO


Estava na banca dos jornais, a aguardar vez para renovar o passe da Carris, quando ouvi uma mulher a dizer para outra: «quem lhe enfiasse as cartolas por um sítio que eu cá sei».

Falavam de 57 mil euros que a Camara de Lisboa vai gastar com cartolas para a Festa de Final de Ano.

Também achei esquisito, mas passei à frente.

Hoje, Paulo Tavares no editorial do Diário de Notícias, volta ao assunto:


O busílis da questão é que a esmagadora das pessoas apenas se fica pelos títulos que, com contornos altamente especulativos, se vão lançando!...

É PERMITIDO AFIXAR ANÚNCIOS


Ano de 1964, anúncio ao Vinho Lagosta que penso que já não se produz.

terça-feira, 26 de dezembro de 2017

POSTAIS SEM SELO


Já tudo escureceu;
contudo ainda resta algum dia
suspenso de onde veio a noite que chegou primeiro.

É de sempre este resto de dia
e acompanha-a pelo céu em busca das estrelas frágeis.

A noite, uma vez,
compreenderá que ele vem do mesmo lado que ela.

 Jorge de Sena

Legenda. Ilustração de Carlos Dotro

TU HABITARÁS A TERRA


I

Não te irritem os actos dos maldosos.
Não invejes quem edifica a falsidade.
Não sigas quem prospera.
Não te impacientes à beira do abismo.

Os dias estão contados. Tu
habitarás a Terra.

II

Fui novo. Envelheci
e guardei a memória da justiça.

À beira do caminho
o soberbo esperou para matar-me.
Alastrou sua árvore frondosa.

Porém segui. Quando por lá voltei
já nada havia.´

Mário Castrim em Do Livro dos Salmos

OUTROS NATAIS

LADAINHA PARA QUALQUER NATAL


Não seja esta noite, agora e sempre,
Igual às outras noites.
Não seja esta noite, agora e sempre,
Igual às outras noites:
Tumba de carne viva em ódio amortalhada,
Anunciando sangue e pranto e morte.
Não seja esta noite, agora e sempre,
Igual às outras noites.
Que esta noite não seja para sempre
De fome pra lá de tantas portas
Como flor viçosa em campa rasa.
Que esta noite não seja para sempre
De amor vendido a horas mortas
E o pudor lembrando e a raiva queimando.

Não seja esta noite, agora e sempre,
Igual às outras noites.
Não seja esta noite, agora e sempre,
Igual às outras noites:
Chaga aberta, como rubra flor de pesadelo,
Escorrendo sangue e pranto e morte.
Não seja esta noite, agora e sempre,
Igual às outras noites.
E seja para sempre esta noite
Cheia de graça na terra dos homens.

Assim seja

Tomaz Kim, poema retirado da Antologia Natal… Natais

segunda-feira, 25 de dezembro de 2017

POSTAIS SEM SELO


Entre aquilo que Portugal deixou neste país africano, podemos destacar o costume de se comer bacalhau na noite de Natal. E não se pense que é hábito de reduzida elite urbana, nostálgica de tempos coloniais, que alguns estudiosos gostam de impropriamente chamar “crioula”. Para já, a população urbana é metade da de Angola e vai servindo de matriz cada vez mais avassaladora da cultura angolana. E o costume está absolutamente espalhado, pelo menos por todas as cidades.


ILUMINAÇÕES DE NATAL




Praça de Londres.

PANORAMA


Número de Dezembro de 1961 da revista PANORAMA, publicada pelo Secretariado Nacional da Informação Cultura Popular e Turismo.
Colocando de lado a propaganda da ditadura salazarista, tratava-se de uma revista graficamente muito bem feita e que dava oportunidade a pintores e desenhadores que até nem eram simpatizantes do regime, publicarem os seus trabalhos e ganharem alguns trocos. Lembro-me, por exemplo das capas de Bernardo Marques e Manuel Ribeiro de Pavia.
Por uma história, que ainda hoje me provoca arrepios, eu hei-de voltar a falar da revista PANORAMA.

SONHOS


Hei-de sempre acreditar no Pai Natal.
De uma maneira ou outra acontece sempre uma surpresa.
Esta, reservou-me o Nuno Potes, oferecendo-me um velho disco de um dos ídolos da minha juventude.
Cantam Adão e Eva, Serás tu para Mim, Sonhos e Fantoche do Amor.
Um grande beijinho, Nuno.

NATAL


Fadas é nas histórias
e reis é nos presépios.
-: Pariste sem mistério,
como os bichos.

Mas a menina veio
graciosa e delicada.
Sua única fada,
a graça do teu seio.

Ganhaste-a com arranques,
e gritos, e suor,
com sangue, com ternura,
e Amor e Amor e Amor.

Por tudo isto é que é bela.
Feliz ou infeliz?
Se as fadas não existem
quem sabe a sua estrela?

Concha rolada à praia,
fechada, fechadinha,
nem o Mar adivinha
que segredo ela guarda.


Sebastião da Gama, poema retirado da Antologia Natal… Natais

domingo, 24 de dezembro de 2017

POSTAIS SEM SELO



David Mourão-Ferreira

OUTROS NATAIS

HISTÓRIA ANTIGA


Era uma vez, lá na Judeia, um rei.
Feio bicho, de resto:
Uma cara de burro sem cabresto
E duas grandes tranças.
A gente olhava, reparava e via
Que naquela figura não havia
Olhos de quem gosta de crianças.

E, na verdade, assim acontecia.
Porque um dia,
O malvado,
Só por ter o poder de quem é rei
Por não ter coração,
Sem mais nem menos,
Mandou matar quantos eram pequenos
Nas cidades e aldeias da Nação.

Mas,
Por acaso ou milagre aconteceu
Que, num burrinho pela areia fora,
Fugiu
Daquelas mãos de sangue um pequenito
Que o vivo sol da vida acarinhou;
E bastou
Esse palmo de sonho
Para encher o mundo de alegria;
Para crescer, ser Deus;
E meter no inferno o tal das tranças,
Só porque ele não gostava de crianças.

Miguel Torga, poema retirado da Antologia Natal...Natais

UMA MORTE ANUNCIADA


A Blitz acabou.
Esta é a capa do último número.
Nunca simpatizei com a Blitz, mas é sempre triste ver chegar o fim de um título de jornal ou revista.
Continuam péssimos os tempos para a imprensa escrita.

sábado, 23 de dezembro de 2017

POSTAIS SEM SELO


Não quero deixar de o saudar nesta quadra do Natal em que, em plena festa, a sua solidão lhe deve parecer mais dura do que em qualquer outro momento. Se assim for, regozije-se. Ora pense: que seria uma solidão que não fosse uma grande solidão? A solidão é una e, por essência, grande, pesada e difícil de suportar. Quase todos conhecem horas que trocariam de boa vontade pela mais banal e medíocre das convivências, pela aparência do menor acordo com qualquer ser, por mais indigno. Mas talvez essas horas sejam precisamente aquelas em que a solidão se amplifica – e o seu crescimento é dolorosos como a ante Primavera. Mas não se importe. Uma só coisa é necessária: a solidão, a grande solidão interior. Caminhar em si próprio e, durante horas, não encontrar ninguém – é a isso que é preciso chegar. Estar só – como a criança está só quando as pessoas crescidas se agitam, ocupadas com coisas que lhe parecem grandes e importantes pelo simples facto de preocuparem os adultos e ela nada compreender do que estes fazem.

Rainer Maria Rilke em Cartas a um Poeta

Legenda: não foi possível identificar o autor/origem da fotografia.

ILUMINAÇÕES DE NATAL



Avenida João XXI.

OUTROS NATAIS

NATAL


Turvou-se de penumbra o dia cedo;
Nem o sol apertou no meu beiral!
Que longas horas de Jesus! Natal...
E o cepo a arder nas cinzas do brasedo...

E o lar da casa, os corações aos dobres,
É um painel a fogo em seu costume!
Que lindos versos bíblicos, ao lume,
Plo doce Príncipe cristão dos pobres!

Fulvas figuras pra esculpir em barro:
À luz da lenha, em rubro tom bizarro,
Sou em Presépio com meus pais e irmãos

E junto às brasas, os meus olhos postos
Nesta evangélica expressão de rostos,
Ergo em graças a Deus as minhas mãos. 

Afonso Duarte, poema tirado da Antologia Natal… Natais

sexta-feira, 22 de dezembro de 2017

POSTAIS SEM SELO


Os filósofos afirmam que isto há-de ser sempre assim: o mais nobre de entre eles, Jesus, cujo nascimento estamos exactamente celebrando, ameaçou-nos, numa palavra imortal, que “teríamos sempre pobres entre nós”. Tem-se procurado com revoluções sucessivas fazer falhar esta sinistra profecia – mas as revoluções passam e os pobres ficam.

Eça de Queiroz em Cartas de Inglaterra

Legenda; não foi possível identificar o autor/origem da fotografia.

OUTROS NATAIS

AS PESSOAS DESAPARECEM


Carta de Jorge de Sena, datada de 9 de Janeiro de 1968 para Sophia de Mello Breyner Andresen, e em que lhe transmite os sentimentos pelas mortes da mãe e do irmão:

… a morte súbita de seu irmão me chocou; a de Sua Mãe, como me conta, foi apesar de tudo uma coisa diferente, se a morte é diferente de si mesma alguma vez. A impressão que cada vez mais tenho é a de que, de certa altura em diante, na vida, nós começamos a viver como o Rilke diria que os anjos se sentiam: sem saber se estamos entre vivos ou entre mortos, porque as pessoas desaparecem, transformam-se em memória, e a gente vai ficando numa cada vez mais estranha irrealidade em que a maioria dos vivos não faz parte do nosso mundo que atravessam como espectros secundários, enquanto o espaço vazio se acumula de espectros autênticos que precisamente são os que deixaram de existir.

Em Correspondência

OLHAR AS CAPAS


Cartas de Inglaterra

Eça de Queiroz
Lello & Irmão Editores, Porto s/d

O Natal, a grande festa doméstica da Inglaterra, foi este ano triste – dessa tristeza particular que oferece, por um dia de calma ardente, a praça deserta de uma vila pobre, ou dessa melancolia que infundem umas poucas de cadeiras vazias em torno de um fogão apagado, numa sala a que se não voltará mais…
O que nos estragou o Natal, não foram decerto as preocupações políticas, apesar da negrura de borrasca, nem a situação da Irlanda, que já não é governada pela Inglaterra, mas pelo comité revolucionário da Liga Agrária – seriam inquietações suficientes para tirar o sabor tradicional ao “plum-pudding do Natal. As desgraças públicas nunca impedem que os cidadãos jantem com apetite; e misérias da pátria.
Não; o que estragou o Natal, foi simplesmente a falta de neve. Um Natal como este que passámos, com um sol de uma palidez de convalescente, um Natal sem neve, um Natal sem casacos de peles, parece tão insípido e tão desconsolado como seria em Portugal a noite de S. João, noite de fogueiras e descantes, se houvesse no chão três palmos de neve e caísse por cima o granizo até de madrugada! Um desapontamento nacional!

ROSAS DE INVERNO


Corolas, que floristes
Ao sol do inverno, avaro,
Tão glácido e tão claro
Por estas manhãs tristes.

Gloriosa floração,
Surdida, por engano,
No agonizar do ano,
Tão fora da estação!

Sorrindo-vos amigas,
Nos ásperos caminhos,
Aos olhos dos velhinhos,
Às almas das mendigas!

Desse Natal de inválidos
Transmito-vos a bênção,
Com que vos recompensam
Os seus sorrisos pálidos. 

Camilo Pessanha, poema tirado da Antologia Natal… Natais

quinta-feira, 21 de dezembro de 2017

POSTAIS SEM SELO


Por aqueles dias, saiu um edito da parte de César Augusto, para ser recenseada toda a população. Este recenseamento foi o primeiro que se fez, sendo Quirino governador da Síria. E iam todos recensear-se, cada qual à sua própria cidade. Também José, deixando a cidade de Nazaré, na Galileia, subiu até à Judeia, à cidade de David, chamada Belém, por ser da casa e linhagem de David, a fim de recensear-se com Maria, sua mulher, que se encontrava grávida. E quando eles ali se encontravam, completaram-se os dias de ela dar à luz e teve o seu filho primogénito, que envolveu em panos e recostou numa manjedoira, por não haver para eles lugar na hospedaria. Na mesma região encontravam-se uns pastores, que pernoitavam nos campos, guardando os seus rebanhos durante a noite. O anjo do Senhor apareceu-lhe e a glória do Senhor refulgiu em volta deles, e tiveram muito medo. Disse-lhes o anjo: “Não temais, pois anuncio-vos uma grande alegria, que o será para todo o povo: Hoje na cidade de David, nasceu-vos um Salvador, que é o Messias, Senhor. Isto vos servirá de sinal para o identificardes: Encontrareis um Menino envolto em panos e deitado numa manjedoira”. De repente, juntou-se ao anjo uma multidão do exército celeste, louvando a Deus e dizendo:
“Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens do Seu agrado”.


Do Evangelho Segundo São Lucas, 2 , 1-14

CANÇÕES DE NATAL


Um velho disco de Natal, uma canção de sempre, uma voz de todos os tempos.


NUNCA PERGUNTAM O ESSENCIAL


As pessoas crescidas gostam de números. Quando lhes falais de um novo amigo nunca perguntam o essencial. Nunca vos dizem: «Como é a fala dele? Quais os seus jogos predilectos? Colecciona borboletas?» Perguntam: «Que idade tem? Quantos irmãos são? Quanto pesa? Quanto é que o pai ganha?» E só julgam que o conhecem depois disto. Se disserdes às pessoas crescidas: «Vi uma bela casa de tijolos vermelhos, com gerânios nas janelas e pombas no telhado… » elas não conseguem imaginar uma casa. É preciso dizer-lhes: «Vi uma casa de quinhentos contos». Então exclamam: «Ai que bonita!»

Antoine de Saint-Exupéry em O Principezinho


Legenda: Desenho de Antoine de Saint-Exupéry