sábado, 31 de dezembro de 2011

AVISO À NAGEGAÇÃO


Este blogue não adoptará o novo acordo ortográfico.

De acordo com uma resolução do Conselho de Ministros, o acordo ortográfico foi adoptado no sistema educativo no ano lectivo de 2011/2012 e será adoptado, a partir de 1 de Janeiro de 2012, ao Governo e a todos os serviços, organismos e entidades na dependência do Governo, bem como à publicação do Diário da República.

Legenda: La dactylo du Vert Galant, fotografia de Robert Doisneau

QUOTIDIANOS


Branski Graffitti

DO BAÚ DOS POSTAIS

É PERMITIDO AFIXAR ANÚNCIOS

AGORA APANHO SOL


Agora apanho sol. Mas até agora
trabalhei cinquenta anos sem descanso.
Como o pão suando dia a dia
num labutar sem pausa.
Gastei o tempo com o salário dos sábados,
passou a primavera, veio o verão.
Dei ao patrão a flor do meu esforço
e a minha mocidade. Nada tenho.
O patrão está rico à minha custa,
eu à sua, estou velho.
Pensando bem, o patrão deve-me tudo.
Eu não lhe devo
nem sequer este sol que agora apanho.
Enquanto o apanho, espero.

POSTAIS SEM SELO


Quantos desertos atravessei para encontrar aquilo que morava entre os homens tão perto.

Sophia de Mello Breyner Andresen
.
Legenda: pintura de Van Gogh.

sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

JANELA DO DIA


1.

Os estabelecimentos comerciais que estiverem abertos no dia 1 de Janeiro já terão de aplicar a todos os produtos as novas taxas do IVA previstas no Orçamento para 2012 desde que este entre em vigor até essa data.

2.

O Bloco de Esquerda entregou hoje na sede do maior grupo corticeiro português uma taça dirigida a Américo Amorim, premiado pelo BE como Melhor Trabalhador do Ano em 2011, distinção atribuída também a Passos Coelho e Paulo Portas.
O gesto irónico tem por base as declarações de Américo Amorim quando, a propósito da possibilidade de se aumentarem os impostos sobre as grandes fortunas, declarou publicamente: Não me considero rico. Sou trabalhador.

3.

A Assembleia Legislativa Regional da Madeira prevê gastar no próximo ano quase 14 milhões de euros em despesas correntes. Deste valor, cerca de um milhão e 500 mil são para pagar subvenções vitalícias. Um documento revelado no dia em que Alberto João Jardim negoceia o plano de ajuda financeira à região e disse ter a " ambição de levar a Madeira para novos destinos", sem ter explicado a ideia.
Jardim, que continuará a acumular a reforma da Função Pública com o vencimento de presidente do Governo Regional, também não deverá aceitar a medida para os ex-políticos abdicarem da subvenção vitalícia quando auferem rendimentos no sector privado. Mantém assim invioláveis os direitos adquiridos, graças ao estatuto-administrativo da região.

OLHARES

Calçada do Cabra

ITINERÁRIOS


Foz do Ribeiro.
Tempo para respirar, lazeirar quanto possível.
Uma praia fluvial - Janeiro de Baixo.
O Zêzere a caminho de abraçar o Tejo em Constança.
Há luzes nos topos dos montes: são as bruxas a dançar à noite, dizem as gentes da Foz do Ribeiro.
O Cesare Pavese tem um livro a que chamou O Diabo Sobre as Colinas

POSTAIS SEM SELO


Amo devagar os amigos que são tristes com cinco dedos de cada lado.
Os amigos que enlouquecem e estão sentados, fechando os olhos,
com os livros atrás a arder para toda a eternidade.
Não os chamo, e eles voltam-se profundamente
dentro do fogo.
- Temos um talento doloroso e obscuro.
construímos um lugar de silêncio.
De paixão.


Herberto Hélder

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

JANELA DO DIA

1.

O Governo acaba de aprovar a proposta de lei que cria o novo regime do arrendamento urbano.

Nem senhorios nem inquilinos gostam do que o governo lhes acaba de apresentar.

Como a toroika tem a força que se sabe, siga a dança…

2.

A REN - Redes Energéticas Nacionais anunciou hoje a renúncia de João Nuno Palma ao cargo de administrador executivo da empresa para assumir funções executivas no conselho de administração da Caixa Geral de Depósitos.

A dança pode continuar…

3.

A proposta de redução salarial apresentada pela administração do Público foi aceite por 95% dos trabalhadores, como contrapartida para que fosse evitado um plano de lay-off.

4.

Desemprego entre emigrantes é significativo, admite secretário de Estado. Só no Luxemburgo há mais de quatro mil portugueses sem trabalho.

Do número anual de portugueses que emigram para o Luxemburgo, quase dois terços acabam por regressar a Portugal. Maioritariamente sem formação, a população portuguesa neste país representa já cerca de um terço do total dos desempregados.

5.

Há147 anos, no seu primeiro número, o Diário de Notícias, colocava em destaque, na 1ª página:

É PERMITIDO AFIXAR ANÚNCIOS


Postal da primeira página do Diário de Notícias de 28 de Dezembro de 1864, distrubuído com a edição de hoje.

PREVISÃO DO TEMPO


Esta é a previsão do tempo publicada no Diário de Notícias de hoje, dia em que comemora 147 anos de existência.

No mesmo dia, mas em 1864, quando saiu para as ruas, o Diário de Notícias também informava, os seus leitores da previsão do tempo:


Para uma melhor leitura, por favor, click sobre as imagens.

DO BAÚ DOS POSTAIS

QUOTIDIANOS



José Viale Moutinho em Jornal de Letras, s/d.

POSTAIS SEM SELO


Nunca estou tão ocupado, como quando não tenho nada para fazer. Nunca estou em tão boa companhia como quando estou sozinho.

Cipião, general africano, citado por Bob Dylan.

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

SONETOS


Legenda: postal que faz parte de uma colecção posta à venda em 2007 durante uma exposição sobre Fernando Assis Pacheco, na Casa Fernando Pessoa, para assinalar os seus 70 anos.

DO BAÚ DOS POSTAIS

O QU'É QUE VAI NO PIOLHO?


Meet Me In St. Louis, que em português teve o ridículo título de Não Há como a Nossa Casinha, é um dos meus filmes de Natal, e, estatelando-me no costumeiro lugar-comum, um dos filmes que levaria para a tal ilha deserta.

É um filme de paixão, a paixão nascida entre Vincente Minnelli e Judy Garland.

Não sei quantas vezes já o vi, quer na sala escura de um cinema, quer em DVD.

Numa sala escura de cinema, o único sítio onde os filmes podem ser vistos, a última vez foi na Cinemateca ,no dia 28 de Dezembro de 2004.

Este é o início da Folha da Cinemateca desse dia, escrita por João Bénard da Costa:




Por falar da paixão entre Minnelli e Judy Garland, dizer que o cinema tem alguns destes casos de paixão entre realizadores e actrizes, entre actores e actrizes, e que deram momentos inolvidáveis e únicos de grande cinema. São os chamados estados de graça.

Final de  Strombolli , filme de 1949 de Roberto Rossellini com Ingrid Bergman no papel de Karin, : a história de uma pecadora tocada pela graça, no dizer de  Eric Rohmer:

Deus! Oh! Meu Deus! Ajuda-me! Dá-me força, a compreensão e a coragem.

Strombolli é o primeiro, de seis filmes, que Rossellini fez com Ingrid Bergman. Conta-se que fez o filme sem ter um guião e apenas um bloco-notas com algumas ideias. Aconteceu um dos mais extraordinários filmes da história do cinema. Robert Altman também era avesso a guiões. Quando lhe perguntaram para que é que serve um guião ele respondeu: para saber se há cavalos ou não.

Em todos os filmes de Rossellini, feitos com Ingrid Bergman, é possível ver o quanto eles são verdadeiros actos de amor de um pelo outro.

Foi depois de ter visto dois filmes de Rossellini, que Ingrid se determinou que tinha de fazer um filme com o realizador, e escreveu-lhe oferecendo-se de corpo e alma:

Vi os seus filmes Roma Cittá Aperta e Paisá, de que gostei muito. Caso precise de uma actriz sueca que fala muito bem inglês, que não esqueceu a língua alemã, que não é fluente em francês e que em italiano só sabe dizer Ti amo estou pronta a fazer um filme consigo.

Rossellini nunca tinha ouvido falar de Ingrid Bergamnn mas escreveu-lhe a dizer que quando entendesse poderia aparecer por Itália.  Ingrid, logo que ficou livre dos compromissos que tinha entre mãos, voou para Itália e apalavraram fazer um filme em tempo oportuno.

Na altura Roberto Rossellini vivia com Anna Magnani. Conta a lenda que quando Magnani soube, num restaurante, que Ingrid iria chegar para fazer um filme com Rossellini, perguntou-lhe como era. Rossellini começou a entaramelar a língua e Anna Magnani, não pensou duas vezes, e espetou-lhe com uma travessa de esparguete na cara.

O filme de Peter Bogdanovich, Romance em Nova Iorque, que vi na saudosa sala do Apolo 70, tem, em redor dele, dois destes casos, um deles completamente sórdido e que contribuiria para a escassa aceitação que o filme teve.

Quentin Tarantino considera-o um dos Dez Melhores Filmes de Sempre, e dou razão a Tarantino, mas sou suspeito porque gosto francamente de Bogdanocivh.

Audrey Hepburn e Bem Gazarra, que entram no filme, viviam, então, um caso de amor na vida real. Na biografia que Donald Spoto (1) escreveu sobre Audrey Hepburn, o facto é educadamente referido, mas o de Bogdanovich é assim contado:

Bogdanovich, então com quarente e um anos, conhecera e apixonara-se por uma modelo de vinte anos da Playboy chamada Dorothy Stratten, que incluiu no filme. Ao mesmo tempo ela era casada com um gabarola desequilibrado chamado Paul Snider. Duas semanas depois de Bogdanovich concluir as filmagens, ela mudou-se para casa do realizador e disse a Snider que o ia deixar. A 14 de Agosto, este atraiu-a para o apartamento de ambos, atacou-a, matou-a com um tiro e virou a espingarda para si.

Mas não é possível falar de paixões como estas, sem ir buscar Lauren Bacall e Humphrey Bogart em Ter e Não Ter que Howard Hawks  realizou em 1944.

 Bacall aparece a Bogart e diz-lhe:, se quiseres alguma coisa, basta assobiar, explicando-lhe em seguida como se faassobia e deixando para a posteridade uma das sequências mais sensuais da história do cinema.

Como diria João Bénard da Costa nos seus Natais Brancos:

No cinema, como no Natal, tudo mudou para tudo ficar na mesma. Louvados sejam. (2)

(1)   Audrey Hepburn: a Biografia, Donald Spoto, Edições ASA, Porto, Outubro 2007.
(2)   Os Filmes da Minha Vida, João Bénard da Costa, Assírio & Alvim, Lisboa, Novembro 1990.

POSTAIS SEM SELO


Não gosto de sonhar, gosto de dormir bem. Sonhos gosto de os ter acordado e em boa companhia.


Legenda: Almoço sobre a Erva, pintura de Edouard Manet

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

JANELA DO DIA


 1.

A ocupação de hotéis no Algarve, durante a passagem de ano,deverá cair até 30 por cento face aos níveis de 2010/2011, apesar de os preços terem baixado.

2.

A oferta de festas gratuitas de passagem de ano está a aumentar, até porque a crise e a austeridade limitam as opções de escolha dos portugueses. Um pouco por todo o país, há eventos e espectáculos gratuitos.

3.

O corte radical das autarquias e juntas de freguesia com os gastos em iluminações de Natal deixou as empresas que instalam estas luzes decorativas quase sem trabalho e, em alguns casos, totalmente paradas.

O negócio está mau, estamos com quebras de 70%, porque 90% dos nossos clientes eram autarquias,, disse um empresário do sector ao Público.

4.

Os trabalhadores do sector público vão perder 5,4 por cento de remuneração real em 2012, o valor mais significativo dos 27 países da União Europeia e o mais baixo desde 1985.

5.
Ao longo deste ano, Alberto João Jardim despachou 111 resoluções através das quais concedeu subsídios, sob a forma de contratos-programa de desenvolvimento desportivo na Madeira.

CHAMINÉS



Este é o bunker da sede da Caixa Geral de Depósitos, em Lisboa.
Mais um exemplo das chamadas obras do regime.
Neste espaço estava uma fábrica de telhas e tijolos.
Num rasgo de bom senso, integraram a chaminé da fábrica no conjunto do edifício.

OLHARES


Numa esquina da Rua Barão de Sabrosa, em Lisboa.

DO BAÚ DOS POSTAIS

POSTAIS SEM SELO


Habituei-me a calar a dor até não sentir nada. Acreditem. Nada.

Marta Cristina de Araújo em Os Meios de Transporte, Edições ASA, Porto, Março de 2004

Legenda: pintura de Edward Hopper

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

JANELA DO DIA


1.

Os ingleses inventaram o futebol e ninguém como eles vive o futebol.

O Natal é uma festa e se festa é, o futebol não poderia faltar.

Enquanto nos restantes campeonatos os jogos são interrompidos, em Inglaterra não só não são interrompidos, como se intensificam.

26 de Dezembro é o boxing day.

São controversas as origens. Para uns, a ocasião consagra o primeiro dia da semana em que os empregados recebiam, dos patrões, o bónus de Natal; outros dizem que remonta à tradição eclesiástica de partir a caixa das esmolas no dia a seguir ao Natal; outros ainda, que era o dia, a seguir ao Natal, em que se colocavam, em caixas, roupas, comida, dinheiro, para serem distribuídos pelos pobres.

Seja pelo que for, a jornada futebolística do boxing day é um dia feliz para ingleses, um enorme prazer, um dia de paixão – os espectadores acorrem em massa aos estádios, levam a família, bebem, cantam, põem barretes vermelhos de Pai Natal, sentem-se gloriosos.

E quem ganhou ou perdeu, não é certamente o mais importante.

Resultados dos jogos de hoje:

Chelsea  1-1  Fulham  
Bolton  0-2  Newcastle   
Liverpool  1-1  Blackburn  
Man. United  5-0  Wigan Athletic  
Sunderland  1-1  Everton  
West Bromwich  0-0  Man. City.
Stoke City 0-0 Aston Villa

Amanhã há mais!

2.

Pedro Passos Coelho, na sua mensagem de Natal, entre outras coisas, falou de confiança.

Há razões para olhar de frente o futuro com esperança, que os portugueses têm sido corajosos e que o seu esforço vai valer a pena.

Aproveitemos esta quadra natalícia para recobrar o fôlego para as grandes tarefas que nos aguardam.

Saber de palavras como estas perturbam-me até ao limar do vómito.

3.

O Governo vai compensar as empresas de transportes pelo adiamento de Janeiro para Fevereiro da entrada em vigor dos aumentos dos preços dos passes e dos bilhetes.

3.

O número de beneficiários do subsídio de desemprego aumentou mais de cinco por cento em Novembro em relação ao mês anterior, chegando a 307.969 pessoas em Novembro, o valor mais elevado do ano, segundo dados divulgados pela Segurança Social.

4.
O Ministério da Agricultura tem uma frota de cerca de 4.000 automóveis, destinados a representação e de uso pessoal, o que, contas por alto, dá, para os 10.500 funcionários do ministério, um carro por cada 2,5 funcionários.

DO BAÚ DOS POSTAIS

O DIA SEGUINTE


Por um Natal lá muito para trás, o envinagrado Vasco Pulido Valente, publicou uma crónica em O Independente, a que chamou Troca de Tralha. Era assim:



COISAS EXTINTAS OU EM VIAS DE...


Houve um tempo, depois de Abril, em que existiu um genuiíno interesse pela cultura.

Mas cedo o entusiasmo morreu.

Esta é a capa do programa do Mercado Popular do Livro e do Disco, que, durante uma semana, num Abril de 1977em Abril de 1977, os livros andaram de braço dado com a musica, o teatro, o cinema, a pintura.

O Mercado realizou-se no pavilhão da antiga FIL  e por lá aconteceu de tudo um pouco
Ao acaso:

Exposições de Manuel Ribeiro de Pavia, Ernest Wolland.

Pelos quatro auditórios aconteceram concertos, espectáculos de circo, teatro e um festival de cinema.

Presentes a maior parte das editoras de livros e discos, que proporcionaram sessões de autógrafos dos seus escritores e artistas, bem como colóquios e debates.

Entre muitos outros, actuaramJ osé Carlos Ary dos Santos, Luís Cilia, Paulo de Carvalho, Coro da Academia dos Amadores de Música, Carlos do Carmo, Fernando Farinha, Plexus - Conjunto de Jazz Contemporâneo, José Barata Moura, Carlos Mendes, Adriano Correia de Oliveira, Carlos Paredes, Pedro Caldeira Cabral, Vitorino, Carlos Zingaro.

Para além do Restaurante da FIL, estavam montados dois bares que asseguravam serviço de refeições ligeiras e bebidas.

Foram dias de intenso convívio, um riquíssimo programa cultural.

Recordo-me: o meu orçamento levou um tal pontapé que demorou alguns tempos recompor-se.

Não mais se realizou um mercado popular.

Foi assim que chegámos ao embrutecimento que hoje nos envolve: insípidos, ignorantes, incultos, a maior concentração de parvos por metro quadrado, para citar José Rodrigues Migueis..

POSTAIS SEM SELO


Não perguntem nada que podem descobrir sozinhos.


Legenda : pintura de Fabian Perez

domingo, 25 de dezembro de 2011

QUOTIDIANOS


Abro a janela à noite e a noite cheira a fumo. É o fumo das lareiras das casas nossas vizinhas. Não há cheiro melhor. É tão bom que antecede a inveja.

Miguel Esteves Cardoso, Público, 27 de Novembro de 2011.

MATINÉ DAS 3



O Estranho Mundo de JackRealização: Henry Selick

É vasta a possibilidade de escolha para um filme a ser exibido na matine das 3 deste dia de Natal.
A pensar nos meus netos escolhi este.
Um filme divertido e maravilhoso.

DO BAÚ DOS POSTAIS

Este é o postal que a Helga e o Dieter enviaram por este natal.
Abre-se o postal e, para além das palavras amíveis, Paul MacCartney canta Wonderful Christmastime.

RECEITA PARA UM NATAL


Primeiro, ficar parado
durante um momento, de pé
ou sentado, numa sala ou mesmo
noutra dependência do lar.
Depois preparar
os olhos, as mãos, a memória
e outros utensílios indispensáveis. A seguir
começar a reunir
coisas, por ordem bem do interior
do coração e do pensamento:
a ternura dos avós, uma mancheia;
rostos de primos distantes, uma pitada;
sons de sinos ao longe, quanto baste;
a recordação duma rua, uns bocadinhos
um velho livro de quadradinhos
duas angústias mais tardias, alguns restos de azevias,
a lembrança de vizinhos   ainda vivos mas ausentes
e de uns já passados.
Quatro beijos de seres amados ou de parentes
um cachecol de boa lã  cinzenta aos quadrados
e um pouco de azeite puro e fresco
igual ao que a mãe usava noutro tempo saudoso.
Mexe-se bem, leva-se ao forno
e fica pronto e saboroso
– mesmo que, nostálgica, se solte uma pequena lágrima.



Legenda: pintura de Anton Pieck

POSTAIS SEM SELO



Existe algo de grandioso, solene e até belo na solidão, quando um homem, depois de ter tido um quinhão satisfatório de vida, resolve recolher-se  a uma casa modesta e afastada na montanha, para aí desfrutar da memória dos seus amores, seus sucessos e fracassos, os livros que ele não julga mais imperioso escrever, deixando as comportas abertas para uma vida mais contemplativa.

sábado, 24 de dezembro de 2011

LADAINHA DOS PRÓXIMOS NATAIS



“Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que se veja à mesa o meu lugar vazio

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que hão-de me lembrar de modo menos nítido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que só uma voz me evoque a sós consigo

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que não viva já ninguém meu conhecido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem vivo esteja um verso deste livro

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que terei de novo o Nada a sós comigo

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que nem o Natal terá qualquer sentido

Há-de vir um Natal e será o primeiro
em que o Nada retome a cor do Infinito”

David Mourão-Ferreira em “Obra Poética”, Editorial Presença, Julho 1996

DO BAÚ DOS POSTAIS

OLHAR AS CAPAS


O Presépio Barroco Português
Arnaldo Pinto Cardoso
Fotografias: Massimo Listri
Design: Franco Maria Ricci
Bertrand Editora, Lisboa, Novembro 2003

Afirmação pletórica dos conceitos artísticos de uma época (século XVII-XVIII), os presépios barrocos eram orientados a emocionar as pessoas que com eles passavam a “conviver” numa contemplação festiva. Eles deviam alimentar o êxtase, proporcionar o arrebatamento do sentido da vista mediante a plasticidade das figuras, a assimetria dos espaços, a profusão das cenas, o cromatismo dos diversos elementos.
Os mestres da rate barroca não buscavam a beleza em si, para se recrearem com ela, mas sobretudo tinham como objectivo impressionar a imaginação e o coração das pessoas que na plateia conventual ou familiar se movimentavam. Estas, como espectadoras activas e interpeladas existencialmente, deveriam sentir a mensagem. De acordo com esta ideia o presépio tornava-se um momento vital, um sermão estentórico, um apelo moral, mediante a representação de cenas da história e da vida, e para além delas.

ATÉ NO BOLO-REI!...



A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico divulgou um estudo sobre as desigualdades ente os mais ricos e os mais pobres. Portugal é o quinto país da OCDE onde o fosso entre ricos e pobres é maior.
O fosso entre o Bolo-Rei do El Corte Inglês e o do Lidl é, exactamente, 27,91 euros.

É POSSÍVEL?

Os filhos, os netos, os amigos, são a única possibilidade de dar um toque humano a este Natal.
Será possível desejar Bom Natal a alguém?
Penso que não.
Mas algo tem que ficar.
Foi quando me lembrei da lindíssima e caprichada gravata com que, por um Natal do Ié-Ié, o meu amigo Luís Pinheiro de Almeida fez questão de nos saudar.

POSTAIS SEM SELO


Natal em toda a parte, menos tu, menos eu,
menos todos os outros perdendo seus aviões:
Pólo Norte deserto, a neve já não cai
nem volta a ser manhã nem o bafo nas janelas
se corta de desenhos que um dedo ali inventa.

Bernardo Pinto de Almeida

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

É PERMITIDO AFIXAR ANÚNCIOS


Para ele o Natal começava no momento em que, passado o calor, a televisão passava os anúncios que permitiam ficar a saber que Ambrósio voltava a ter algo para oferecer à madame.

SERÁ QUE VAI NEVAR ESTE NATAL?


os natais são natais     passam uns atrás dos outros     mal damos por nós estamos a dizer olha é natal outra vez     e já não podemos estar tão certos ao interiorizar que seria bom que todos os dias fossem de natal     ou que natal é quando um homem quiser     tudo  porque o natal troikiano passou a ser um dia como todos os outros e outros natais resumem-se à matéria indefinível dos sonhos    ou o pior dos pesadelos ver a gorda alemã merkel       o seu anão francês,   empoleirados numa rena     a desejar a toda a europa um santo e feliz natal