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domingo, 18 de fevereiro de 2024

OH AS CASAS AS CASAS AS CASAS



O título do texto pertence a um poema de Ruy Belo que vive no seu livro O País Possível:

Oh as casas as casas as casas
as casas nascem vivem e morrem
Enquanto vivas distinguem-se umas das outras
distinguem-se designadamente pelo cheiro
variam até de sala pra sala

Nos inquéritos recolhidos por Alexandra Tavares-Telles, que o Diário de Notícias tem vindo a publicar, em que os diversos intervenientes se lembram dos dias de há 50 anos, hoje  coube a vez à escritora Ana Vidal que, então, tinha 17 anos.

A história que conta remete para tempos que são mesmo de outros tempos, como o existirem familiares em Lisboa que dispunham de uma quarto, de uma casa  para apoaiarem os jovens familiares,  vindos da província para estudar, e  não tivessem que enfrentar os preços pornográficos, miseráveis, absurdos, sei lá mais o quê, que os senhorios impõem, porque o estado não consegue, ou não quer?, construir apartamentos para estudantes.

É mais fácil dar dinheiro aos bancos do que enfrentar os problemas da habitação:

«Neste dia frio de fevereiro eu estava a meio do meu último ano letivo no Liceu de Santarém. O antigo “sétimo ano dos Liceus”, portanto. Era boa aluna, estava dispensada de ir a exame a quase todas as disciplinas. O meu futuro próximo desenhava-se paulatinamente, sem grandes ondas à vista: a ida para Lisboa, para entrar na Universidade – Direito ou Filosofia, ainda não me tinha decidido – e, o que mais me empolgava, o mergulho de cabeça no meu primeiro voo para a independência. Tal como a minha irmã mais velha, já no primeiro ano de Economia e Finanças, e alguns dos meus primos, ficaria alojada na casa da Rua da Junqueira que uns tios nossos, sem filhos, punham à disposição de todos os sobrinhos durante o tempo dos estudos na capital. Tios esses que não viviam lá, o que fazia daquela casa uma espécie de República de estudantes, muito apetecida e ponto de encontro de todos os nossos amigos que viviam com os pais.»


Legenda: imagem Shorpy