Oh as casas as casas as casas
as casas nascem vivem e morrem
Enquanto vivas distinguem-se umas das outras
distinguem-se designadamente pelo cheiro
variam até de sala pra sala
Nos inquéritos
recolhidos por Alexandra Tavares-Telles, que o Diário de Notícias tem
vindo a publicar, em que os diversos intervenientes se lembram dos dias de há
50 anos, hoje coube a vez à escritora
Ana Vidal que, então, tinha 17 anos.
A história
que conta remete para tempos que são mesmo de outros tempos, como o existirem
familiares em Lisboa que dispunham de uma quarto, de uma casa para apoaiarem os jovens familiares, vindos da província para estudar, e não tivessem que enfrentar os preços
pornográficos, miseráveis, absurdos, sei lá mais o quê, que os senhorios impõem,
porque o estado não consegue, ou não quer?, construir apartamentos para
estudantes.
É mais fácil dar dinheiro aos bancos do que enfrentar os problemas da habitação:
«Neste dia frio de fevereiro eu estava a meio do meu último ano
letivo no Liceu de Santarém. O antigo “sétimo ano dos Liceus”, portanto. Era
boa aluna, estava dispensada de ir a exame a quase todas as disciplinas. O meu
futuro próximo desenhava-se paulatinamente, sem grandes ondas à vista: a ida
para Lisboa, para entrar na Universidade – Direito ou Filosofia, ainda não me
tinha decidido – e, o que mais me empolgava, o mergulho de cabeça no meu
primeiro voo para a independência. Tal como a minha irmã mais velha, já no
primeiro ano de Economia e Finanças, e alguns dos meus primos, ficaria alojada
na casa da Rua da Junqueira que uns tios nossos, sem filhos, punham à
disposição de todos os sobrinhos durante o tempo dos estudos na capital. Tios
esses que não viviam lá, o que fazia daquela casa uma espécie de República de
estudantes, muito apetecida e ponto de encontro de todos os nossos amigos que
viviam com os pais.»
Legenda: imagem Shorpy
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