segunda-feira, 12 de fevereiro de 2024

A SESTA

Na rede, que um negro moroso balança,
      qual berço de espumas,
formosa crioula repousa e dormita,
enquanto a mucamba nos ares agita
      um leque de plumas.

Na rede perpassam as trémulas sombras
     dos altos bambus;
e dorme a crioula de manso embalada,
pendidos os braços da rede nevada
     mimosos e nus.

A rede, que os ares em torno perfuma
     de vivos aromas,
de súbito pára, que o negro indolente
     espreita lascivo da bela dormente
as túmidas pomas.

Na rede, suspensa de ramos erguidos
    suspira e sorri
a lânguida moça cercada de flores;
aos guinchos dá saltos na esteira de cores
    felpudo sagui.

Na rede, por vezes, agita-se a bela,
     talvez murmurando
em sonhos as trovas cadentes, saudosas,
     que triste colono por noites formosas
descanta chorando.

A rede nos ares de novo flutua,
     e a bela a sonhar!
Ao longe nos bosques escuros, cerrados,
de negros cativos os cantos magoados
     soluçam no ar.

Na rede olorosa… Silêncio! Deixa-a
     dormir em descanso!...
Escravo, balança-lhe a rede serena;
mestiça, teu leque de plumas acena
     de manso, de manso...

O vento que passe tranquilo, de leve,
     nas folhas do ingá;
as aves que abafem seu canto sentido;
as rodas do engenho não façam ruído,
     que dorme a Sinhá!

Gonçalves Crespo

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