As Baleias Não Choram
D.H. Lawrence
Desenho de Diogo Alcoforado
Capa: Armando Alves
Colecção: O Aprendiz de
Feiticeiro nº 9
Editorial O Oiro do Dia,
Porto, Outubro de 1983
o sangue mais vivo, quente e impetuoso.
Nos grandes abismos são quentes todas as baleias,
quando se agitam
sem descanso e mergulham sob os icebergues.
As verdadeiras baleias, cheias de sémen, com as cabeças
em forma de martelo, prontas a matar,
ei-las lançando do mar os seus jactos violentos, quentes
e brancos.
E balançando-se, balançando-se ao longo das idades sem
tempo da sensualidade,
nas profundidades dos sete mares,
vacilam através das águas salgadas com um prazer
embriagador,
estremecem de amor sob os trópicos
e caminham pesadamente com um desejo maciço e
poderoso, como deuses.
Então o grande touro estende-se sobre a sua noiva
através do abismo azul do mar,
montanha sobre montanha na voluptuosidade da vida:
para além do íntimo rumor do oceano vermelho e oculto
do seu sangue
estende-se a longa ponta do desejo, forte e imensa como
um redemoinho, até repousar
na união, o suave e selvagem encontro do corpo
insondável da baleia fêmea.
E sobre a ponte fálica poderosa, unindo o prodígio das
baleias,
arcanjos em fogo submersos no mar demoram-se
a passar,
de um para o outro lado, arcanjos da felicidade
que vão dele para ela e dela para ele, grandes Querubins
que os acompanham no seio do oceano, suspensos nas
ondas do mar,
grande céu das baleias entre as águas, antigas
hierarquias.
E as enormes baleias mães sonham estendidas, ao
aleitarem as suas crias,
sonham com os seus estranhos e grandes olhos abertos
nas águas do princípio e do fim.
As baleias-touros reúnem as fêmeas e os filhos-bezerros
num círculo
quando o perigo os ameaça, à superficie das marés
incessantes,
e alinham-se como grandes Serafins ferozes, ao
defrontarem o perigo,
rodeando o rebanho dos seus montros de amor.
E toda esta felicidade no mar, entre a água salgada
onde Deus é também amor, mas sem palavras,
e é Afrodite a esposa das baleias,
feliz, plenamente feliz;
Vénus salta entre os peixes e torna-se a fêmea do delfim,
ela, a graciosa e alegre marsuína brincando com o maor
e o mar,
a fêmea do atum redonda e feliz entre os machos,
pesada com o seu sangue cheio de delícia, obscura
felicidade de um arco-íris no mar.
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