sexta-feira, 16 de fevereiro de 2024

REVISÃO DE NOTÍCIAS LIDAS


 A Fundação Calouste Gulbenkian, o ano passado, celebrou o centenário do nascimento de Madalena Perdigão.

Esta é a biografia de Margarida Perdigão postada pelo Centro Nacional de Cultura:

«Maria Madalena Bagão da Silva Biscaia de Azeredo Perdigão licenciou-se em Matemática (1944), em Coimbra, e concluiu o Curso Superior de Piano (1948) do Conservatório Nacional, seguindo depois estudos de aperfeiçoamento em Paris. Na Emissora Nacional, foi responsável pelo programa radiofónico A Música e os Seus Sortilégios.
Ingressou na Fundação Calouste Gulbenkian em 1958 e até 1974 dirigiu o seu Serviço de Música, criando os Festivais de Música (1958-1970), a Orquestra (1962), o Coro (1964) e o Ballet Gulbenkian (1965). Entre 1978 e 1984, convidada pelo ministro Sottomayor Cardia, dirigiu o Gabinete Coordenador do Ensino Artístico do Ministério da Educação para definir uma proposta de um Plano Nacional de Educação Artística. Em 1983, organizou o I Festival Internacional de Música de Lisboa. Em 1984, regressou à Gulbenkian, para criar o ACARTE- Serviço de Animação, Criação Artística e Educação pela Arte que dirigiu até 1989, ao mesmo tempo que criou o CAI – Centro Artístico Infantil da Fundação Gulbenkian, tendo concretizado três edições dos Encontros ACARTE – Novo Teatro/Dança da Europa (1987, 1988 e 1989). Foi condecorada com a Ordem do Infante D. Henrique e as insígnias da Ordem do Cavaleiro da Legião Francesa.
Casada com José de Azeredo Perdigão, presidente da Fundação Gulbenkian, Madalena Azeredo Perdigão desenvolveu um diversificado trabalho em prol da cultura portuguesa durante o Estado Novo e o período democrático.».

Hoje, relemos um artigo que Bárbara Reis publicou no Público de 17 de Junho de 2023, em que entre outras coisas, pergunta:

«Sabia que em 1974 quiseram sanear Madalena Perdigão da Gulbenkian porque ela era “incompetente” e 2Fascista”? Se não sabia, não está sozinho.»

«Outra pergunta: pensa que os colóquios a celebrar 100 anos disto e daquilo só servem para elogiar os mortos? Se sim, está enganado.

Um exemplo: foi preciso um colóquio sobre os 100 anos do nascimento de Madalena de Azeredo Perdigão (1923-1989) para eu aprender que nos anos do PREC (Processo Revolucionário em Curso), a era da pré-democracia portuguesa, ela foi insultada e chamaram-lhe tudo e mais alguma coisa.

Desconhecia a história e só sabia sobre Madalena Perdigão aquilo que sabem muitos dos que eram adolescentes nos anos 1980: que era culta, moderna, vanguardista e enérgica, que trouxe o melhor do mundo para Portugal, que acreditava na importância da educação artística e musical, que ajudou a criar a orquestra, o coro e o ballet Gulbenkian, que inventou o Jazz em Agosto e os Encontros Acarte.

Logo a seguir ao 25 de Abril de 1974, houve uma “campanha de imprensa hostil” contra Madalena Perdigão, com “ataques injustos, tendenciosos e assentes em informação falsa ou parcelar”, escrevem Rui Vieira Nery e Inês Thomas Almeida em Vamos Correr Riscos. Textos escolhidos de Madalena de Azeredo Perdigão, acabado de editar pela Fundação Calouste Gulbenkian e Tinta-da-china.

Um é o Manifesto sobre a situação da música em Portugal, publicado no Diário de Lisboa a 14 de Maio de 1974 e assinado por 50 pessoas, entre as quais Fernando Lopes Graça, António Victorino d'Almeida, Sequeira Costa, Filipe de Sousa, Jorge Peixinho, Manuel de Lima, Mário Vieira de Carvalho, Manuel Jorge Veloso, Francisco D’Orey, Olga Prats, João José Cochofel, Francine Benoît, António de Oliveira e Silva, Maria Regina de Vasconcelos, Clotilde Rosa, etc. — é assim que está assinado.

No colóquio, José Sasportes disse que não queria “entrar numa zona infecta, em parte estimulada pelo Partido Comunista e pelo controleiro do sector intelectual — ‘controleiro do sector intelectual’, belo título de glória — que me diziam ser Mário Vieira de Carvalho”.

Não queria, mas entrou. Disse que, na altura, “o Carvalho” escreveu no
Diário de Lisboa “artigos em termos tão falsos e imperdoáveis como os que se podem ler nos relatórios soviéticos para isolar compositores como Shostakovich ou eliminar o encenador Meyerhold”.

E rematam dizendo que é urgente acabar com “o escândalo” de manter a Gulbenkian “nas mãos de uma ‘clique’ fascista”.

António Pinto Ribeiro disse no colóquio que Madalena Perdigão foi “a mais importante programadora cultural da segunda metade do século XX”. Sabendo tudo o que sabemos dos excessos, loucuras e erros do PREC, ingenuamente pensava que Madalena Perdigão, matemática, pianista, cosmopolita e “agitadora cultural”, tinha sido poupada às injustiças primárias do PREC. Estava enganada.»

A releitura deste artigo de Bárbara Reis tem o intuito de marcar alguns dos episódios negros que o PREC trouxe, vindos de pessoas que admiramos e situávamos longe de estarem de acordo com propósitos, não só injustos, como caluniosos.

Diga-se, por fim, que o sinistro Mário Vieira de Carvalho acabou por deixar o Partido Comunista e partiu para outros ventos, outras aventuras.

Sem comentários: