quinta-feira, 15 de fevereiro de 2024

APOGEU E MORTE DE UM HOMEM ENTUSIASMADO

conheci uma vez um homem entusiasmado.

era domingo, vinha do futebol e o barreirense tinha ganho.

a meu lado, numa tasca feia e suja, bebia e dizia:

«hei-de dar uma bicicleta ao meu filho levá-lo a treinar ao clube

talvez que com um toque do sampaio ele fique nos juvenis   um

púcaro de três   e aqui mais um para este meu amigo»

eu, calado, na expectativa do que o homem entusiasmado bebia

e sonhava:

«amanhã vou ao chefe e peço-lhe aumento    falo-lhe da renda da

casa do  meu filho   no clube    ele será do barreirense? não

me lembro tenho de perguntar ao sampaio    ó manel traga mais

três copos aqui para nós que eu pago»

o outro que também tinha sido contemplado desta vez, piscou-me

o olho e deu duas pancadas encorajantes no homem entusias

mado, que bebia e vivia:

«e vou mudar de casa    vou para lisboa    é mais perto do meu

emprego e não preciso de andar de barco e de me levantar tão

cedo    vou já à procura de casa»

no dia seguinte, li no jornal que um homem possivelmente bê-

bado, se tinha atirado para o mar junto ao barreiro deixando

na desgraça a mulher e um filho ainda em idade escolar.

morreu. entusiasmado.

 

Luís Paixão Martins

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