Este não é o dia seguinte do dia que foi ontem.
João Bénard da Costa
Será um desfilar de histórias, de opiniões, de livros, de discos, poemas, canções, fotografias, figuras e figurões, que irão aparecendo sem obedecer a qualquer especificação do dia, mês, ano em que aconteceram.
O recorte de hoje pertence ao jornal República
de 14 de Julho de 1972.
O poeta Fernando Assis Pacheco ofereceu ao autor um exemplar de Câu Kiên: um resumo e o autor demonstra a sua felicidade.
Pela oferta
e pela excelência da obra.
O mundo nunca deixou de viver sem a infernal presença da guerra.
Nunca.
Aquela guerra tinha nomes e lugares de outra
parte do mundo.
O poeta era português, queria colocar os
nomes das terras e das gentes, mas
existiam censores-analfabetos.
O poeta era Fernando Assis Pacheco.
Em Maio de 1972 chamou ao livrinho: «CÂU KIÊN: UM RESUMO».
Em Maio de 1976, finalmente, chamou ao
livrinho: «CATALABANZA QUILOLO E VOLTA.»
Neste último livrinho, o poeta escreveu:
«Catalabalanza
Quilolo e Volta é basicamente a versão original de um título que publiquei em
Maio de 1972, Câu Kiên: um resumo, tirado a 500 exemplares para ofertas.
A toponímia
vietnamita, e outros disfarces de circunstância, não têm razão de ser. Reposto
o texto tal como era, junto agora alguns poemas, todas da mesma época e quase
todos considerados para o Câu Kiên, mas então eliminados.
Catabalanza vai
dedicado a João Cabral de Andrade, um amigo morto em Angola.
F.A.P.»
Tanto em Cãu Kiên, como em Catabalanza, Quilolo
as palavras são as mesmas.
Monólogo e Explicação.
Mas não puxei
atrás a culatra,
não limpei o óleo
do cano,
dizem que a guerra
mata: a minha
desfez-me logo à
chegada.
Não houve pois
cercos, balas
que demovessem
este forçado.
Viram-no à mesa
com grandes livros,
com grandes copos,
grandes mãos aterradas.
Viram-no mijar à
noite nas tábuas
ou nas poucas
ervas meio rapadas.
Olhar os morros,
como se entendesse
o seu torpor de
terra plácida.
Folheando uns
papéis que sobraram
lembra-se agora de
haver muito frio.
Dizem que a guerra passa: esta minha
passou-me para os
ossos e não sai.
Fernando Assis Pacheco
«Pode esquecer-se a guerra, mas ela não nos esquece. Deu cabo da nossa juventude e há-de dar cabo da nossa velhice».
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