Escrever é fazer recuar a morte, é dilatar o espaço da vida.
Quando andei pelos jornais, mesmo antes de trabalhar dentro das redacções, exprimia já as mesmas ideias. De uma maneira geral a literatura que hoje faço continua ligada a esse tipo de textos. Às vezes, confesso, vem-me a saudade dos jornais… não sou um caso único, penso que qualquer um que passou por eles há-de lembrar-se até ao fim, há-de sentir essa espécie de apelo, essa voz que chama de longe, essa sensação de estar metido dentro das coisas, que a literatura de um modo geral não dá.
Nós, os que temos a responsabilidade de escrever, e tanto falo em literatura como em jornalismo, temos o dever de levantar a nossa língua, de cuidar dela, de fazê-la reviver.
Se a literatura nesta terra ainda serve para alguma coisa, isto é, se for mais do que alguns estarem ainda a escrever para alguns estarem ainda a ler, torna-se urgente recuperá-la já que a nossa sociedade corre o risco, devido aos audiovisuais, de emudecer, ou seja, de haver cada vez mais uma minoria com grande capacidade para falar e uma maioria crescente limitada a ouvir, não entendendo sequer muito bem o que escuta.
José Saramago, entrevistado por Fernando Dacosta para o semanário O Jornal s/d, aquando da publicação de O Memorial do Convento.
Legenda: fotografia de Luís Ramos, publicada na Ler, nº 6, Primavera 1989.
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