domingo, 29 de agosto de 2010

TRAFARIA


Em 1923, num texto que vem “Os Pescadores”, Raul Brandão escrevia: 

“Da horrível Trafaria à Caparica gastam-se dezoito minutos num carrinho pela estrada através do pinheiral plantado há pouco”.

Num apontamento, a que deu o título “Amor de Trafaria”, Jorge Listopad escreveu, no “JL”, a 4 de Julho de um ano que o recorte não menciona:


A Trafaria nunca foi grande coisa mas tinha a poética do banal, a praia com vista para o mar (!) um panorama de Lisboa ocidental, umas tasquinhas de fim-de-semana com saborosa caldeirada, e até grupos de teatro de merecimento. Sobretudo ia-se de barco, ida e volta, numa viagem azulada, simpática, com paragem no meio do caminho, Porto Brandão, para columbófilos apaixonados.




A Trafaria continua a não ser grande coisa: mais parece um advérbio. Não se declina, não se conjuga, não tem plural. Parou. Não melhorou, não piorou, ou se sim, a praia é agora dos cães, dos meninos perdidos, os engenhos industriais tapam as vistas, as tascas transformaram-se em restaurantes, o café da esquina embora não mudasse, parece o café de estação de comboios, ou de garagem de autocarros. Não respira. Não se move.
São assim os nossos pequenos amores de outrora. Ficou o barco: ida e volta, sem descer, sem parar, com rumo contínuo, como no sonho.”

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