Durante mais de vinte anos José Saramago foi director literário na Editorial Estúdios Cor.
Serafim Ferreira (1) realça a importância de Saramago à frente da editora.
É sob a sua direcção que são publicados Histórias das Grandes Literaturas, História do Romance Português de João Gaspar Simões, Dicionário de Pintura Universal em três volumes e um deles exclusivamente dedicado à pintura portuguesa, planeado e coordenado por Mário Tavares Chicó, Armando Vieira Santos e José-Augusto França, as obras completas de Tchekov, Guy de Maupassant, a publicação de escritores como José Rodrigues Migueis, José Marmelo e Silva e Jorge de Sena.
O seu trabalho com José Rodrigues Migueis está amplamente descrito na troca de correspondência que com ele manteve.
Em carta dirigida a José Rodrigues Migueis, Saramago escreve:
Já terá sabido que saio da editora. Hoje é o último dia que aqui estarei. São largos anos de trabalho que aqui me ficam, sem falar nos sacrifícios pessoais de toda a ordem. Aguentei esta casa de pé até ao momento conveniente… para os outro. É uma história algo suja que talvez ainda acabe por vir a público (se a tanto me forçarem) mas de que, em qualquer caso, lhe darei conta quando nos encontrarmos…
Em carta a José Rodrigues Migueis, datada de 8 de Novembro de 1971, Saramago desabafa:
Demiti-me da editora em virtude de me terem criado uma situação vexatória, qual seja admissão de um novo director literário (Natália Correia), imposto pelo grupo financeiro que tomou posição na firma.
Tudo isto se passou na minha ausência em férias (entre 15 de Outubro e 2 de Novembro), e depois de ao longo de anos se ter dito aqui, em todos os tons, que nunca se quereria um director literário realmente director. E quando a questão foi posta aos Srs. Canhão e Correia, estes senhores não tiveram a coragem moral mínima de defenderem a minha posição aqui dentro, o meu trabalho de quinze anos. Aceitaram tudo a troco do prato dos feijões. Venderam-me, supondo que eu estava à venda. No que se enganaram
Aliás, tudo isto já vem de longe. Por alguma razão as suas cartas têm caído num poço de silêncio. Tenho-me recusado a tratar de certos assuntos enquanto toda a minha situação na editora não fosse esclarecida de vez. Acabou por sê-lo agora em termos que, confesso, não esperava. Porque a safadeza ainda foi maior que a minha ingenuidade.
Saio no dia 31 de Dezembro para entregar com tempo, os assuntos noutras mãos, mas foi a partir do dia 3 de Novembro que deixei de tratar de qualquer questão para além do que considero ser minha estrita obrigação. Outras pessoas comunicarão consigo para tratar dos seus assuntos.
E é tudo. Se no dia em que sair daqui não estiver ainda (já) outro emprego, começo o ano da estaca zero, completamente desprovido. Mas continuo a ter uma grande consideração por mim mesmo!
Segundo Serafim Ferreira, Natália Correia ainda emprestou à Cor uma certa fulgurância editorial, mas foi sol de pouca dura, como diz a sabedoria popular, porque de seguida, depois de Abril ter chegado, eclipsou-se quase por completo.
Nas conversas que Saramago manteve com João Céu e Silva, fica a saber-se que, pouco depois após a saída da Cor, José Cardoso Pires indicou o nome de José Saramago para o Diário de Lisboa, porque o jornal precisava de alguém para escrever uns editoriais. Por ali esteve entre 1972 e 1973 onde se ocupava em tarefas muito dispersas.
Para além dos editoriais, Saramago dirigiu o Suplemento literário do jornal.
(1) Olhar de Editor, Editora Escritor, Lda, Lisboa Outubro 1999
(2)
(3) José Rodrigues Miguéis/José Saramago, Correspondência 1959-1971, Editorial Caminho, Abril 2010.
Legenda. a ilustração do texto é a capa de A Escola do Paraíso, um dos livros de José Rodrigues Migueis que a Cor publicou enquanto Saramago foi seu director literário.
Numa carta a Migueis Saramago escreverá que A Escola do Paraíso é a sua melhor obra e um dos melhores livros destes tempos.
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