quinta-feira, 3 de abril de 2025

OLHAR AS CAPAS


Inquérito Póstumo

Horácio Tavares de Carvalho

Capa: Antunes

Círculo de Leitores, Lisboa, Março de 1981

O Echevarria é que tinha razão. A Costa é para gozar no Inverno. A única diferença reside na temperatura da água, Mas que importa isso, afinal? O prazer do mar, como dizia o Luís, é poder vê-lo, sentir-lhe o cheiro e apanhar-lhe a brisa. É poder sonhar com ele no Inverno. Para manter o calor, temos o chuveiro… É diferente, eu sei, mas, ponderados os pós e os contras, continuo a preferir a Costa fora da estação. Poder pelas ruas quase vazias, poder escolher o restaurante que no Verão está sempre apinhado de gente, poder tudo observar calmamente, sem a presa de só poder ver e desandar, não ter as estradas congestionadas por uma Babel de línguas e não ver a paisagem estragada pelos restos das refeições enlatadas. Cada um tem o direito de fazer turismo onde lhe der na gana. Como cada um tem o direito de fugir ao turismo para se refugiar num buraco onde ninguém ponha os pés. Dizia o Echevarria, esse oráculo da sabedoria popular.

6 comentários:

Seve disse...

O CÍRCULO DE LEITORES foi um grande divulgador da cultura, ou pelo menos fez com que em muitas casas dos portugueses houvesse pelo menos um livro (mesmo que não saísse do plástico), o que, infelizmente já não acontece nos dias de hoje.
E é tão desolador entrar numa casa e não ver um livro.

Sammy, o paquete disse...

Há méritos no trabalho que o Círculo de Leitores desenvolveu, em determinado tempo, na divulgação do livro entre os portugueses. Principalmente quando começou a publicar as obras completas de alguns escritores. Lembro José Rodrigues Migueis, Aquilino Ribeiro, Ferreira de Castro.
Mas gosto de salientar, acima de tudo, o ter possibilitado a José Saramago a escrita de «Viagem a Portugal».
O Círculo de Leitores pretendia assinalar os 10 anos de existência em Portugal e pediu a Saramago um guia de viagem, algo que pudesse ser útil a uma pessoa que vai dar um passeio pelo país e que leva um livro com informação dos lugares, dos restaurantes, dos hotéis.
Saramago disse aos directores do Círculo que não conseguia fazer um livro desse género e ocorreu-lhe dizer:
«Se vocês quiserem, se estiverem interessados nisso, eu posso fazer uma viagem e depois conto»
Os directores pediram uns dias para pensar na proposta.
Três, quatro dias depois, disseram-lhe para fazer a viagem.
E o viajante partiu à descoberta do que não sabe, porque ninguém é viajante se não for curioso.
Entre Outubro de 1979 e Julho de 1980, José Saramago, percorreu o país.
«O viajante viajou no seu país. Isto significa que viajou por dentro de si mesmo.»
Aconteceu um livro lindíssimo e isso permitiu um certo desafogo à sua vida económica.
Por via da máquina de divulgação que o Círculo de Leitores possuía, - a 1.ª edição de «Viagem de Portugal» teve a tiragem de 30.000 exemplares! – o nome de José Saramago rasga outros horizontes.
Saramago disse que aquele Portugal já, praticamente, não existe.
Resta-nos o livro.

Seve disse...

Aquele Portugal já não existe nem aquele mundo...

Sammy, o paquete disse...

Terrível e dramática verdade!...

Seve disse...

Ó Sammy já viu que o mundo actual vive numa terrível solidão e todos falam com todos.
Já viu tamanha obscuridade que rodeia o mundo actual.
Já viu tamanha ignorância nas gentes que estão constantemente nas redes ditas sociais.
Que mundo está esra geração a germinar?

Sammy, o paquete disse...

Provavelmente, poderei ser demasiado drástico, mas o mundo que me viu nascer, ACABOU!
Lamento, como escreveu o José Gomes Ferreira, deixar aos filhos e aos netos, um mundo pior do que aquele que encontrei.