domingo, 13 de abril de 2025

POEMAS AUTOGRAFADOS


 É o nº 16 da Colecção Poetas de Hoje: Ciclo de Pedras de Luís Veiga Leitão com prefácio de Fernando Guimarães: «Significado e Estrutura da Poesia de Luís Veiga Leitão.»

Copio o poema ilustrado que Luís Veiga Leitão escolheu para o seu livro:

 

Homem

 

É no silêncio do caminho aberto:

 

Quanto maior a alma maior o deserto

maior a sede e a miragem

do mundo à nossa imagem

 

Gosto deste poema mas gostaria que tivesse sido escolhido: 


A uma bicicleta desenhada na cela


Nesta parede que me veste
Da cabeça aos pés, inteira,
Bem hajas, companheira,
As viagens que me deste.


Aqui,
Onde o dia é mal nascido,
Jamais me cansou
O rumo que deixou
O lápis proibido…
Bem-haja a mão que te criou!
Olhos montados no selim
Pedalei, atravessei
E viajei
Para além de mim.

 

Mas o que conta aqui é o critério do autor.

Luís Veiga Leitão desempenhava funções de escriturário numa Brigada Cadastral da Federação dos Vinicultores da Região do Douro, quando foi demitido por ser contra a ditadura salazarista.

Em 30 de Março de 1952 Luís Veiga Leitão foi preso pela PIDE e ficou em Caxias cerca de um ano. Na cela 13 do Aljube, incomunicável, iniciou a redacção mental dos poemas que memorizava, dizendo-os repetidas vezes em voz alta e foi-os guardando na memória, os guardas a ouvi-lo chegaram a pensar que estava louco. Veiga Leitão considerou esses poemas, ao todo 20 poemas, um diário de prisão, e um itinerário das cadeias por onde passou: Pide do Porto, Aljube e Caxias. Viria a publicá-los em 1955 num livro com o título Noite de Pedra - imagens da noite fascista e que foi apreendido e proibido pela censura.

Luís Veiga Leitão desempenhava funções de escriturário numa Brigada Cadastral da Federação dos Vinicultores da Região do Douro, quando foi demitido por ser contra a ditadura salazarista.

Recordo, como se fosse hoje, a leitura deste livro de Luís Veiga Leitão, um livro que me marcou profundamente, largamente sublinhado. Como este poema:


Manhã 


- Bom dia. Diz-me um guarda.

Eu não ouço...apenas olho

das chaves o grande molho

parindo um riso na farda.

 

Vómito insuportável de ironia

Bom dia, porquê bom dia?

 

Olhe, senhor guarda

(no fundo a minha boca rugia)

aqui é noite, ninguém mora,

deite esse bom dia lá fora

porque lá fora é que é dia!

 

Num seu livro de viagens, Livro de Andar e Ver cita Van Gogh:

«Há mais grandeza nuns olhos humanos que numa catedral.»

Escreve Fernando Guimarães no prefácio a Ciclo de Pedras:

«A poesia de Veiga Leitão tem, sem dúvida, um carácter realista.»

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