quinta-feira, 13 de outubro de 2016

SARAMAGUEANDO


9 de Outubro

Foi muito simples. Encontrávamo-nos na cozinha. Pilar e eu, sós, quando a rádio informou que o Prémio Nobel tinha sido atribuído a Dario Fo. Olhámo-nos tranquilamente (sim, tranquilamente, jurá-lo-ia se fosse necessário) e eu disse: «Pronto. Podemos voltar ao nosso sossego.» Amanhã partiremos para Colónia.

14 de Outubro

Frankfurt. Pilar telefonou hoje para casa, a saber se havia alguma novidade, e realmente, sim, havia novidade, a mais inesperada de todas as possíveis, aquela que nunca seríamos capazes de imaginar: nada mais nada menos que uma chamada telefónica de Dario Fo e dizer: «Sou um ladrão, roubei-te o prémio. Um dia será a tua vez. Abraço-te.» Mal saído do assombro em que a notícia me tinha deixado, disse a Pilar: «Suponho que uma coisa assim nunca terá acontecido na história deste prémio…», e Pilar, sábia, respondeu-me: «Não há que perder a confiança na generosidade humana.

José Saramago em Cadernos de Lanzarote, Vol. V.

Legenda: fotografia retirada da Fundação José Saramago

1 comentário:

Impontual disse...

Memórias perfeitas. O arquétipo do prémio Nobel do que quer que seja.