Era no tempo em que, nas imediações do Cine-Teatro, florescia
o chamado «mercado negro das legendas», onde se negociavam sobretudo gerais e superiores. Alfabetos
privilegiados vendiam os seus serviços de leitores pelo preço do bilhete e dez
tostões de tremoços. Um murmúrio subia dos lugares populares, um zumbido de
abelhas na escuridão da sala, traduzindo aos vizinhos do lado os diálogos de
Humphrey Bogart com Lauren Bacall, as tiradas de sir Lawrence Olivier, o
discurso romano de Ana Magnani. O Pires marchante, cuja posição social impunha
o primeiro balcão, só ia aos filmes portugueses. Em família definia assim o seu
conflito com as legendas:
- Começo a solitrar,
a solitrar, e quando vou arrebanhar já não tá lá nada!
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