«Tive sempre um fraquinho pelos jornalistas. Juntamente com cowboys,
músicos de jazz, agentes do FBI, detectives privados, jogadores e mágicos,
alimentei a fantasia de ser um homem dos jornais, um repórter duro, na senda do
crime, cujas investigações implacáveis desvendavam a história da corrupção da
câmara municipal ou salvavam um homem inocente do cadafalso. Era isso ou
jornalista desportivo, onde poderia documentar a poesia do atletismo, tal como
o meu ídolo, Jimmy Cannon.
Infelizmente, o destino tinha outros planos para mim, mas uma das
melhores memórias que tenho foi a noite em que fiz as rondas da Broadway com o
jornalista Leonard Lyons. Lyons era um colunista de Nova Iorque que não dependia
das esmolas dos assessores de imprensa, antes cobrindo a vida nocturna da
cidade pessoalmente e acumulando centenas de histórias excelentes sobre as
celebridades da cidade. Ele e a mulher convidaram-me para jantar, certa noite,
no seu apartamento em Beresford, quando eu era um comediante em ascensão. Por
volta das dez da noite começava o seu dia de trabalho. Despediu-se da mulher
com um beijo e descemos às ruas escuras de Manhattan. Levou-me ao Sardi’s, ao
Oak Room do Plaza, ao Toots Shor’s, depois ao Watford e ao Lindy’s, tudo isto
enquanto conversava e ouvia autores e atores, atrizes e produtores. Foi uma
noite com a qual apenas podia ter sonhado em miúdo, na Avenue J, em Brooklyn.
Por vezes, estou deitado na cama, à noite, incapaz de dormir e tenho uma rara
pausa em relação ao imaginar da morte, esmagado numa prensa de carros ou
engolido por uma píton, penso nostalgicamente nessa noite, na cidade, com
Leonar Lyons.»
Woody Allem em A Propósito de Nada.
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