Dito já que começaram as iniciativas que visam registar o centenário do nascimento de José Saramago, acrescenta-se que irei pegando num qualquer livro de José Saramago e copiarei dele uma frase, um parágrafo, aquilo que constituem os milhares de sublinhados que, ao longo dos muitos anos de leituras, invadiram os livros de José Saramago que habitam a Biblioteca da Casa.
Os primeiros livrosde José Saramago.
Como conta Juan
Arias: «… talvez por nunca ter desejado
nada na vida, por não ter tido maiores ambições, lhe pareça agora que conseguiu
tudo.»
Aos 12 anos a mãe
oferece-lhe o seu primeiro: «O Mistério
do Moinho» de J. Jefferson Farjeon, comprado numa pequena capelista na Praça
do Chile. O resto, e parte importante, são leituras de livros na biblioteca da
Escola Afonso Domingues e na Biblioteca do Palácio das Galveias no Campo
Pequeno.
«Depois de jantar ia a pé, apesar de ser longe da minha casa, para a
Biblioteca do Palácio das Galveais, e até à hora de fechar lia tudo o que podia,
sem nenhuma orientação, sem ninguém que me dissesse se aquilo era demasiado ou
pouco para mim. Lia tudo o que me parecia interessante…»
Os Cadernos Inquérito
estavam divididos em 9 séries:
Série A – Política e
História
Série B – Economia e
Sociologia
Série C – Filosofia e
Religião
Série D – Pedagogia e
Linguística
Série E – Direito
Série F – Ciências
Série G – Crítica e
História Literária
Série H - Literatura Clássica
Série I
- Arte
Os volumes dos
Cadernos Inquérito existentes na Biblioteca da Casa apresentam dois preços: 3
escudos e 4 escudos.
Caros? Baratos?
Talvez acessíveis.
Talvez.
Lembro-me do meu pai
contar que muitos livros foram comprados com sacrifícios de ordem vária: andar
a pé em vez de utilizar o electrico, um café, um whiskinho a menos, uma não ida aqui ou acolá, mas do que
nunca conseguiu prescindir foi os três maços de tabaco «UNIC» que fumava por
dia.
Diga-se que a 10 de
Novembro de 1941 José Saramago é contratado como serralheiro mecânico dos
Serviços Industriais dos Hospitais Civis de Lisboa, com um salário de 8$00, que
em breve passa a 9$00.
Em 1942 um amigo
empresta-lhe 300$00 com os quais compra os seus primeiros livros que são
constituídos por volumes dos Cadernos Culturais Inquérito publicados pela
Editorial Inquérito.
«Vivi com toda a naturalidade, sem nenhuma ambição. E como disse antes:
«o que tiver de ser meu, às mãos me há-de vir ter, uma coisa depois da outra.
Por vezes digo que talvez hoje tenha tudo porque nunca quis nada. Esta é a pura
realidade: nunca quis nada.»
E assim aconteceu: um
dia deram-lhe o Prémio Nobel.
Um Nobel que leu
Cadernos Culturais da Inquérito, possíveis porque um amigo lhe emprestou 300
escudos.
Um Nobel que tanta e tanta gente desejou, rezou, que quando fosse atribuído a um escritor português calhasse a António Lobo Antunes, ou Agustina Bessa-Luís.
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