«O tempo tudo muda. Antes de a União Soviética se ter tornado no paraíso dos pobres e oprimidos, o sonho que se acalentava era a América. Fartura de horizontes e de trabalho (que escasseava por cá), cidades e estradas largas e o cinema (ah! o cinema!), cadillacs e arranha-céus desvairados, o progresso a todo o vapor ou, melhor dito, a gasolina, pois que a cada cámone – muito antes dos camónes de Molero, invenção maior de Dinis Machado, esse cometa solitário das letras portuguesas que bem podia ter nascido americano – se atrelava um carro, pelo menos. Dizia-se. E um futuro revolucionário que só mais tarde haveria de ler Babbitt de Sinclair Lewis, desconfiado ainda assim de tanta e tamanha largueza, propunha com pragmatismo que mais sensato seria adiar os cadillacs e reivindicar uma bicicleta a pedais para cada português, era Eisenhower presidente dos states e Américo Tomás ainda ministro da Marinha.»
«Um dia perguntaram-me na América: “Já
tem muitos Marc Chagall na sua colecção?”. Coisas de ricos. E, na mesma viagem,
o porteiro de um casino sorriu-me, enquanto eu transcrevia para um caderno o
horário das frozen margaritas gratuitas: “Are you writing a poem?”, disse ele e
eu naquele momento acreditei ter compreendido tudo: a América só podia ser
terra de grandes romancistas.»
Sem comentários:
Enviar um comentário