segunda-feira, 8 de julho de 2024

POEMA DOS MOTORISTAS OFICIAIS

Encontram-se um pouco por todos os lugares.

ora fumando,

Orando pelos filhos junto a um deus

Secretariado por magníficos

Patrões.

De fato azul e gravata preta

de anel cachucho e jornal da bola,

o rabo habituado aos bons cabedais

pousado no capot ultra-reluzente.

Trazem da província em cada bolso do corpo

e estendem olhos julgadores às mulheres solitárias

de cigarro na boca em plana rua.

Às vezes são quatro ou cinco à espera do final

de um conselho em pleno parto,

de uma portaria inacabada

ou de uma reunião de economia mística.

Derramam no passeio

o ócio inexplicável de rústicos fiéis

e contam anedotas num bocejo amarelo de melancolia.

Quem lhes dera a reforma, a courela da mãe,

ou num sonho longínquo

essa noite sem lua em que engravidaram

a prima por descuido.

Sinto por todos eles um sentimento soturno

e muito gostaria

que Cesário os conhecesse

ao passear  sozinho

pelas novas avenidas ao anoitecer.


Armando Silva Carvalho em Lisboas

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