quinta-feira, 4 de julho de 2024

SERRA-MÃE

 

O agoiro do bufo, nos penhascos,...
foi o sinal da Paz.
O Silêncio baixou do Céu,
mesclou as cores todas o negrume,
o folhado calou o seu perfume,
e a Serra adormeceu.

Depois, apenas uma linha escura
e a nódoa branca de uma fonte antiga :
a fazer-me sedento, de a ouvir,
a água, num murmúrio de cantiga,
ajuda a Serra a dormir.

O murmúrio é a alma de um Poeta que se finou
e anda agora à procura, pela Serra,
da verdade dos sonhos que na Terra,
nunca alcançou.

E outros murmúrios de água escuto, mais além :
os Poetas embalam sua Mãe,
que um dia os embalou .

Na noite calma,
a poesia da Serra adormecida
vem recolher-se em mim.
E o combate magnífico da Cor,
que eu vi de dia :
e o casamento do cheiro a maresia
com o perfume agreste do alecrim ;
e os gritos mudos das rochas sequiosas que o Sol castiga
--passam a dar-se em mim .

E todo eu me alevanto e todo eu ardo.
Chego a julgar a Arrábida por Mãe,
quando não serei mais que seu bastardo.

A minha alma sente-se beijada
pela poalha da hora do Sol-pôr ;
sente-se a vida das seivas e a alegria
que faz cantar as aves na quebrada ;
e a solidão augusta que me fala
pela mata cerrada,
aonde o ar no peito se me cala,
descem da Serra e concentrou-se em mim.

E eu pressinto que a Noite, nesse instante,
se vai ajoelhar ...

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Ai não te cales , água murmurante !
Ai não te cales , voz do Poeta errante !

-- se não a Serra pode despertar .

Sebastião da Gama em Serra-Mãe

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