sábado, 19 de janeiro de 2019

OLHAR AS CAPAS


O Jogo do Reverso

Antonio Tabucchi
Prefácio: José Cardoso Pires
Tradução: Maria José de Lencastre, Maria Emília Marques Mano, José Colaço
                   Barreiros
Capa: Rogério Petinga
Livros Quetzal, Lisboa, Abril de 1999

À noite falávamos de Fitzgerald ouvindo Tony Bennett que cantava Tender is the Night. Do filme, para dizer a verdade, ninguém tinha gostado, nem sequer o senhor Deluxe, embora não fosse de gostos difíceis. Mas o Tony Bennett tinha uma voz «pungente como o romance», e o Gino tinha de voltar a pôr o disco uma quantidade de vezes. Inevitavelmente pediam-me o início do livro, todos achavam delicioso que eu soubesse de cor o início dos romances de Fitzgerald: só os inícios, que eram uma das minhas paixões. O senhor Deluxe, sério como de costume, pedia silêncio, eu procurava esquivar-me, mas não era possível dizer que não, o disco do Tony Bennett tocava em surdina, o Gino tinha servido os bacardis, eu olhava fixamente para ti, tu sabias qua quele início te era dedicado, era quase como se tivesse sido eu a escrevê-lo, acendias um cigarro na boquilha, também aquilo fazia parte da representação, brincavas à flapper, mas não tinhas nada de uma flapper, nem a franja, nem as meias de rayon e muito menos o espírito; tu pertencias a outra categoria, poderias ter entrado talvez num romance de Drieu, ou de Pérez- Galdós, tinhas um sentimento trágico da vida, talvez fosse o teu egoísmo sem solução como um castigo.

Sem comentários: