«Nem sempre é preciso falar. Há alturas em que as palavras não fazem
falta, estão a mais, e talvez possam ser ditas depois.
A minha mãe estava já muito doente e não quis que o meu pai a fosse
ver. Ele não foi, e um dia depois de ter regressado a Lanzarote, ela morreu.
Quando lho disse, pediu-me para adiar o funeral. Regressou a Lisboa no dia
seguinte. Fui esperá-lo ao aeroporto. Um abraço apertado e choroso substituiu
qualquer palavra. Durante o funeral não trocámos uma palavra, mas não saiu de
ao pé de mim. Quando o fui levar ao aeroporto para regressar a casa, só me
disse: Vai, vai procurar descansar.
Nesse ano, uns meses depois, ganhou o Nobel da Literatura. Quando nos
encontrámos, disse-lhe: Ela havia de ter gostado. Sim havia, respondeu.
Não voltámos a falar sobre o assunto. Ao chegar a Estocolmo, em
Dezembro, demos um grande abraço. Sem palavras que não precisaram de ser ditas,
por um brevíssimo instante, naquele abraço apertado, estivemos os três.
Para ser sincera, nunca tive com o meu pai intermináveis conversas.
Naqueles momentos realmente bons ou nos realmente maus, nunca precisámos de muitas
palavras.
O olhar e o tato substituíram-nas frequentemente.
1 comentário:
E ao longo da vida há tantos afastamentos injustificados, tantas ausências que só muito tarde lamentamos.
Há coisas no ser humano absolutamente incompreensíveis.
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