Comeu-se, bebeu-se, riu-se, dançou-se, sem que, como sempre, alguma vez se tivesse tocado no essencial. Ou talvez que, finalmente, as coisas sejam mais simples e o essencial seja apenas isso…
Acompanhar os convidados à escada, com a habitual recomendação de “cuidado com os degraus!”. Correr para um último aceno à varanda…
Arrumar a sala num ápice e respirar de alívio por não se ter quebrado nenhuma “flute das caras” ou alguma “das peças importantes” do “serviço”, para que a digníssima esposa não nos venha deitar à cara, pela estafadissima vez, que as festas acabam sempre assim…
Ir de novo á janela e reparar que, entretanto, as nuvens já passaram, a noite se tornou calma, serena e acolhedora e a grande lua já pode estender, finalmente, o seu manto de luminosidade sobre o rio.
Já não é hora dos cacilheiros deixarem as suas marcas sobre as águas, mas, ao longe, uma pequena luz cintila, como se pedisse socorro e todas as angústias da cidade se tivessem concentrado, por um momento, nesse minúsculo ponto vermelho, à espera não se sabe bem de quê.
Tempo de relaxar. Passar os dedos pela estante e escolher qualquer coisa tranquila para fim de festa. Cliff Richard a cantar em espanhol, como não poderia deixar de ser…
Acender os restos do que outrora fora um garboso charuto cubano, mas que agora não era mais do que um pequeno coto que teimosamente resistia a ser violentado uma vez mais…
Estender o corpo no sofá e as pernas sobre a mesa.
Escolher as músicas e deixá-las rodar, repetidamente, deixando que a pouco e pouco se instale a calma que as músicas de “When in Spain” sempre proporcionam: começando por “Tus Besos” (“Kiss”, na versão que a Marilyn cantava languidamente no “Niagara” provocando um acesso de ciúmes ao Joseph Cotten…), passando por “Amor, Amor, Amor”, “Te Quiero Dijiste”, “La Cancion de Orfeo”, do “Orfeu Negro” e por aí fora… Tudo em perfeita harmonia e estado de graça, com uma cumplicidade total entre os arranjos de Norrie Paramor e as entradas de Marvin, Welch e Farrar
Enquanto se escuta, ver o fumo esgueirar-se lesto pela janela, como se levasse dentro de si algo de essencial que não tivéssemos conseguido segurar e se perdesse para sempre.
E vir desaguar a “Vaya com Dios”…
“Si llegó momento ya de separarnos
En silencio el corazón dice y suspira:
Vaya con Dios mi vida,
Vaya con Dios mi amor
Las campanas de la iglesia suenan tristes
Y parece que al sonar también te dicen:
Vaya con Dios mi vida,
Vaya con Dios mi amor
Adonde vayas tú yo iré contigo
En sueños siempre junto a ti yo estaré,
Mi voz escucharás dulce amor mío
Pensando como estarás
Volvernos siempre a ver
La alborada al despertar feliz te espera
Si en tu corazón yo voy, adonde quieras
Vaya con Dios mi vida,
Vaya con Dios mi amor…”
Não pensar em mais nada, a não ser que o corpo já pede cama e amanhã será um novo dia, em que teremos de recomeçar tudo, com um sorriso no rosto, se possível…
Colaboração de Luís Miguel Mira
3 comentários:
Bonito demais para que possa dizer alguma coisa.
Com olhos molhados fica um grande beijinho
Com o rio à vista, as longas noites do nosso contentamento.
Que diabo...! Não é caso para lágrimas, minha Querida...
Bjo
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