terça-feira, 31 de julho de 2012

POSTAIS SEM SELO


Ulisses atraiu-me e derrotou-me várias vezes ao longo dos anos, desde que comprei nos distantes anos 70 a edição de volumes brancos da Lumen traduzida por José María Valverde. Um leitor tem de ser sincero consigo próprio e tal como não deve envaidecer-se com os cumes que conquistou, também não deve envergonhar-se dos seus fracassos nem esconder a sua capitulação diante de uma obra-prima.

Antonio Muñoz Molina, em El País.

segunda-feira, 30 de julho de 2012

À LUPA


No momento em que escrevo, Miguel Relvas ainda não se demitiu. Talvez no lapso de tempo que decorre entre a escrita deste texto e a sua publicação, ocorram outros lapsos que o obriguem a demitir-se. Mas não parece provável. Nem, devo dizer, necessário. Um número relativamente alargado de pessoas exige uma demissão, ignorando que já houve várias. Ricardo Alexandre deixou de ser director-adjunto da RDP, Maria José Oliveira deixou de ser jornalista do Público e Fernando Santos Neves deixou de ser reitor da Lusófona do Porto. Quase todos os envolvidos nestes casos abandonaram as suas funções, menos Relvas. A troika bem avisou que um dos problemas mais graves do País era a dificuldade de despedir gente na função pública. Agora é possível apostar, na internet, no momento que Relvas escolherá para se demitir. É dinheiro deitado à rua. O mais provável é que todo o povo português se demita antes de Miguel Relvas.

Ricardo Araújo Pereira na Visão.

OLHARES


Lisboa vista do Miradouro do Monte Agudo.

SARAMAGUEANDO



OS DOIS DE LANZAROTE

Eram um casal aéreo, cruzavam aeroportos,
digo eu o delator, o escriba acocorado, e sigo-os
nas suas fantasias voadoras,
açambarcando as nuvens, os romances,
toda a luta de classes
nas longas, estreitíssimas passagens dos jactos
pelo céu alucinante e cru.
Um casal a encher uma península.
Ruídos pérfidos perseguiam a sua alta rota revoltada,
a ela lambuzavam-lhe os vestidos, transparentes,
abertos sobre as nuvens.
E a ele arrancavam-lhe os cabelos
agarrados ao cérebro.
Mas eles voam mais alto, no assombro, mais livres.
Só eu pareço agora um cão acabrunhado
nas coxias deste chão sem ar,
e os olhos presos naquela exuberância.
Eles são dois padrões erguidos na terra retalhada
pelos elegantes domadores da fala,
e do mar mediterrâneo.
Recordai, ó leitores, a exibição da ternura,
a estridência feliz dos abraços frente à multidão,
a imponência do sucesso a pulso.
Um velho, uma mulher madura, uma ilha vulcânica.
E o ar que acolhe os seus impulsos
com a firme decisão de fazer estremecer
o mundo.

Armando da Silva Carvalho em De Amore, Assírio & Alvim Lisboa 2012

SÍRIA: UMA GUERRA DE PROPAGANDAS

 

O jornalista brasileiro Raphael Tsavkko Garcia é de  opinião que a ingerência estrangeira no, ainda interno, conflito na Síria, só contribui para torná-lo ainda pior.
Esta é uma visão que foge à normalidade do que, por aqui, vamos lendo nos jornais, nos blogues, vendo nas televisões.

Escrevi ainda em janeiro um artigo para este Brasil de Fato sobre a situação da revolta Síria que, hoje, se encaminha para a guerra civil. Pouco mudou em termos de cenário e de participantes, mas a percepção popular sobre os eventos parece ter mudado. E para pior.
A mídia comercial insiste em retratar os insurgentes sírios como um grupo homogêneo de lutadores pela liberdade, ao passo que Assad e toda a “situação” síria, pró-governamental é mostrada como sanguinária e apenas interessada no poder. Esta visão é datada e carregada de interesses.
Os opositores de Assad são vários e nem de longe unificados. Pequenas facções divididas não apenas em cores religiosas, mas também divididas em tribos e clãs e com os mais diversos interesses. A franca maioria dos insurgentes é da maioria sunita, que é marginalizada por Assad, um alauíta, mas também é possível encontrar alguns poucos cristãos junto a eles. Há grupos laicos e militantes islâmicos, grupos com cristãos e grupos anticristãos, além de grupos financiados pelos EUA, outros vindo do Líbano e grupos independentes, enfim, uma salada indigesta sob todos os pontos de vista.
Ao lado do governo luta não apenas o exército, mas a milícia Shabbiha, cuja influência governamental é incerta, e outros grupos menores, especialmente cristãos e drusos.
Os EUA, por sua vez, tem dificuldade em conseguir organizar e armar a oposição – fragmentada -, ao passo que Israel teme que o regime que venha a surgir pós-Assad seja ainda pior e mais ferrenhamente opositor. A Síria se assemelha à Líbia, um país com relativa estabilidade e bons índices sociais, relativamente laicos e com mulheres com mais liberdade que os vizinhos, mas dividido em clãs e tribos, ainda que controladas.
Com a ação dos EUA e aliados para desestabilizar o país – aliado com um princípio legítimo de revolta – as fraturas sociais começam a aparecer e uma guerra civil torna-se inevitável. Se por um lado há tanques e aviões de Assad realizando ataques às regiões controladas pelos vários grupos rebeldes, por outro as principais atrocidades são cometidas por grupos governistas e não pelo exército. Se Assad é o responsável direto, porém, pelas ações destes grupos é algo que não passa de especulação.
É preciso considerar que as minorias drusas, xiitas, cristãs e alauítas temem um regime islâmico sunita não apenas pelo caráter religioso, mas também pela possível vingança que este grupo majoritário organizaria contra minorias que passaram décadas senão no poder, próximos a ele.
O exército sírio é povoado por cristãos e alauítas e motivo de ressentimento por parte da maioria sunita. A resposta desta maioria dominada pode ser um banho de sangue e a limpeza étnica.
Uma saída “iemenita”, como também aventam altos oficiais dos EUA não seria simples. Em outras palavras, um acordo para que Assad deixasse o poder, como fez o presidente/ditador do Iêmen, Saleh, poderia acirrar ainda mais os ânimos de um conflito que, diferentemente do Iêmen, não é apenas tribal e pelo fim de uma ditadura, mas também sectário, religioso. As minorias que hoje apoiam Assad poderiam revidar ainda com mais força a insurgência sunita devido à derrota e ao pânico de serem dizimados.
Da mesma forma, a saída de Saleh do poder não veio acompanhada do fim dos conflitos separatistas no sul do Iêmen ou dos conflitos tribais no norte, assim como a ação da Al Qaeda local, como bem lembrou o jornalista Gustavo Chacra em artigo recente.
É preciso ainda ter em mente também o efeito que o conflito sírio vem causando no Líbano, que pode mergulhar novamente no caos caso o Hezbollah – financiado pela síria – e grupos próximos, como os cristãos de Michel Aoun ou os sunitas do Amal, resolvam intervir ou mesmo passem a repetir o conflito no país vizinho em seu próprio quintal.
Novamente, não há como negar que Assad ou elementos próximos ao regime vem cometendo atrocidades, mas estas também são cometidas pelos insurgentes, mas apenas não encontram eco semelhante na mídia comercial. Michel Chossudovsky, por exemplo, publicou recentemente artigo do jornalista russo independente Marat Musin em que ele denunciava o já famoso Massacre de Houla como resultado da ação do Exército de Libertação Sírio, ou seja, dos rebeldes que teriam massacrado famílias leais a Assad.
Não é possível corroborar tais informações, da mesma forma que é impossível provar categoricamente que a ação tenha sido obra do exército de Assad ou da milícia Shabbiha, mas o caso serve para ilustrar o jogo de propaganda e contrapropaganda que esconde o que efetivamente acontece no país.
Outro aspecto importante do conflito – e que é fruto do processo de desinformação midiático de ambos os lados - é a guerra particular travada entre a Rússia e os EUA por zonas de influência. A Rússia vê na Síria – assim como no Irã – bastiões de resistência de sua influência no Oriente Médio, ao passo que boa parte dos vizinhos estão sob esfera americana – alguns depois da quase destruição via intervenção dos EUA.
Afeganistão, Iraque, Israel, Arábia Saudita e demais países do Golfo são um entrave aos interesses russos e a queda do regime sírio imporia uma nova derrota à diplomacia deste país.
A defesa tenaz de Serguei Lavrov, ministro das relações exteriores da Rússia, ao regime sírio se explica por estes interesses e, também, mas em menor parte, pela dúvida que continua pairando sobre as reais intenções dos insurgentes.
A Líbia é um excelente paralelo, onde, depois de uma intervenção por parte dos EUA e aliados europeus, mergulhou no caos, em disputas de facções rivais divididas em tribos e clãs, e não dá mostras de se recuperar brevemente. Uma intervenção armada, como querem os EUA, poderia pulverizar ainda mais o conflito, ampliando o número de grupos lutando pelo poder e ampliar os massacres. Apesar da grande mídia se limitar a denunciar massacres cometidos ou supostamente cometidos pelo governo e seus aliados – inclusive com fotos falsas de corpos e através de denúncias com pouca credibilidade – massacres vem ocorrendo também contra grupos pró-governo, vitimando crianças, mulheres e não combatentes.
A autoria dos massacres é, por vez, de difícil identificação, sobrando para a propaganda midiática de um ou outro lado fazer seu trabalho.
Não resta dúvida de que a situação é complicada, cuja resolução não está apenas longe, mas ainda não parece possível. A certeza, porém, é que a pressão dos EUA e aliados sobre o governo junto a uma campanha difamatória midiática e o financiamento que chega até à doação de armamento à oposição apenas contribui para o acirramento que periga chegar até Damasco e tornar-se de vez uma sangrenta guerra civil. Em outras palavras, a ingerência estrangeira em um conflito – ainda – interno da Síria apenas contribui para torná-lo ainda pior.

POSTAIS SEM SELO


O Verão deixa-me os olhos mais lentos sobre os livros.


Legenda: pintura de Nikolay Bogdanov-Belsky

domingo, 29 de julho de 2012

PEDRO RAMOS DE ALMEIDA (1932-2012)


Quando cheguei à Universidade de Lisboa Pedro Ramos de Almeida, militante do PCP, era um mito da luta anti-fascista. Preso em 1954 fora libertado em 1960 e trabalhara para a eleição da lista de Jorge Sampaio para a Associação de Direito. Todos me falavam dele, do seu comportamento digno na PIDE, do brilhantismo dos exames que fizera mesmo preso, da sua inteligência, e até do seu pendor sectário. Seria o mais parecido da nova geração com Álvaro Cunhal, e muitos previam que lhe sucederia.
Só o conheci melhor anos mais tarde. Fugazmente na Suíça, com mais tempo depois do 25 de Abril, e do seu desastre de viação, na pastelaria Alsaciana onde coincidíamos a tomar café. Falámos então longamente do rumo da sociedade portuguesa. Não era fácil concordar com ele mas era sempre enriquecedor e estimulante ouvi-lo.

José Medeiros Ferreira, Córtex & Frontal

QUOTIDIANOS


A história é contada pela estação de televisão norte-americana ABC. Andrea e Charles eram frequentadores de uma igreja em Crystal Springs no Mississipi,  e, quando decidiram casar religiosamente, escolheram-na. O pastor, Stan Weatherford, marcou a cerimónia mas a comunidade baptista, composta por brancos, não gostou. O templo existe desde 1883 e nunca ali houvera um casamento de pessoas negras; queriam que assim continuasse.

Stan Weatherford disse à ABC que a oposição foi tão forte que foi ameaçado de despedimento.

"A minha filha de nove anos ia estar na cerimónia. Como é que se diz a uma criança desta idade 'Olha querida, não podemos casar aqui porque somos negros'", disse Charles Wilson à WAPT-TV, uma estação local.

A congregação branca começou entretanto uma série de reuniões para decidir o que fazer se surgirem novos pedidos de casamento de casais negros ou mistos.

DA MINHA GALERIA


Tenho pendente com o Miguel, há largos anos, o fazermos uma cassette de finais de filmes.
A minha lista está feita.
O final da Imitação da Vida não poderia faltar.
Arrepiante.
E acreditem que sempre que vejo este final ,choro como uma Madalena.


POSTAIS SEM SELO


Então, peço-te, fecha esse livro; e
limita-te a olhar em frente, onde uma
porta se abre e o tempo que esperas
entra pela casa, com o sol da manhã.


Nuno Júdice

Legenfa: fotografia  de Cartier-Bresson

sábado, 28 de julho de 2012

O QU'É QUE VAI NO PIOLHO?


O principio de tudo num velho disco de 78 rpm que o meu pai comprou.

Anton Karars, mais a sua cítara, a tocar o tema do filme O Terceiro Homem.

Tinha visto o filme com o meu avô e ambos ficaram encantados com a música.

Tinha para aí 9 anos e a música, de tanto rodada no gira-discos, o que eu gosto desta palavra e tudo o que a envolve, ficou-me também no ouvido.

Só muito mais tarde vi o filme de Carol Reed e encontra-se na minha lista de filmes negros preferidos, longa lista diga-se.

Dizem as más-línguas que o filme tem mais de Orson Welles do que Carol Reed, mas isso já são contas de outro rosário.

Todo o filme está pontuado pelo tema musical e quase se poderá pensar que o filme foi feito para aquela música, filme que ainda tem Orson Welles Josephh Cotten, Alida Valli, os olhos mais verdes que já vi, uma testa altíssima, uma boca sôfrega, perfil suavíssimo e um corpo que, sem ser vistoso ou agressivamente sensual, tinha as proporções feitas para a sedução, e aquele final de filme, um dos muitos grandes finais que o cinema já nos deu.





Altiva e orgulhosa, Alida Valli deixa o cemitério de Salzburgo e caminha estrada fora, indiferente à boleia que Joseph Cotten lhe oferece. Em fundo ouve-se a cítara de Anton Karas, até Alina Valli se perder, sublimemente, na linha do horizonte.

Percebo que a imagem só se moveu, ou seja, só houve cinema, para nos dar movimentos desses e mulheres assim, para voltar a citar João Bénard da Costa.

Em Itália, Alida Valli, manteve suspensa a sua carreira por se recusar a aparecer naquilo que, no seu lúcido entender, considerava ser propaganda fascista.

Orson Welles deixou escrito: Não penso no que ficará de mim, nem isso me importa. Creio que é tão vulgar trabalhar para a posteridade como por dinheiro.

Quando no seu Muito Lá de Casa, João Bénard da Costa, chama à boca de cena Alida Valli, o título que escolhe é: Condessa Alida Livia Valli Serpieri e começa assim:

Disse Proust que nunca se deve desejar demasiado ardentemente qualquer coisa. Porque a alancaremos, mas tarde demais.

Apaixonei-me por Alida Valli quando me curei da minha paixão por Esther Wulliams. Por muito estranho que pareça, assim foi. E foi a segunda vez (a terceira, se incluir inconsciências de que só muito mais tarde tive consciência) que mulher foi melhor e que nela todo inteiro me despenhei. O meu desejo era tão mais ardente quanto mais se assumia por impossível. Saciá-lo era pecado contra o meu espírito e a natureza dela. Nessa altura, não sonhava transgredir tanto. Era novo de mais na terra e na carne. Se um duende, maligno ou benigno, me viesse profetizar que um dia lha seguraria o pulso e lhe fecharia os olhos, respondia-lhes que não abusasse da minha tendência para excessos imaginativos. E se o dito espírito acrescentasse que isso só não aconteceria por recusa ou incompetência minha, mais nomes violentos lhe teria chamado.

DO BAÚ DOS POSTAIS


Almoçageme, Praia da Adraga, A Pedra de Alvidrar.

À LUPA


O Banco Central Europeu  - cuja actuação tem sido a de continuar a alimentar o processo especulativo e a própria crise - perante o agravar dos problemas em Espanha e em Itália, já "admite" reforçar o fundo de resgate e coloca a "possibilidade" de os fundos de resgate comprarem dívida pública no mercado. Olhando o rumo que o BCE tem seguido, isso pode não significar mais do que um encanar a perna à rã.
Entretanto, utilizar ou não a designação e a formatação de um "resgate" é em grande medida indiferente, pois as políticas que estão no terreno a ser implementadas, lá como cá, têm o mesmo cariz e conduzem à destruição de emprego, à fragilização da economia, ao aumento das desigualdades, ao empobrecimento, à degradação da democracia.

Os nossos governantes prosseguem na construção da intrujice, do logro com que pensam continuar a submeter os portugueses. Insistem na tese de que Portugal terá êxito seguindo o comportamento do "bom aluno", quando sabem muito bem que quando as coisas correm mal é o aluno que acaba por ser acusado de algum desvio e nunca o professor. Ora eles, como todos os portugueses e portuguesas atentos, também sabem que a crise é sistémica e que a cartilha que nos impuseram está repleta de erros e falsidades, aprisionando inexoravelmente o desenvolvimento da generalidade dos países, mesmo que em tempos diferenciados e com diferentes intensidades.

Manuel Carvalho da Silva, Jornal de Notícias

sexta-feira, 27 de julho de 2012

OLHAR AS CAPAS



Erro Próprio

António Maria Lisboa
Prefácio de Mário Cesariny de Vasconcelos
Guimarães Editores, Lisboa Março de 1962

Uma vez por todas não escrevo para os que não sabem ler.

OS CROMOS DO BOTECO

quinta-feira, 26 de julho de 2012

OS ACROBATAS



Entre os profissionais de marketing da Indústria Farmacêutica, havia uma “espécie” que era conhecida como os “acrobatas”. Eram aqueles que estavam sempre do lado certo, saltavam de grupo em grupo, para estarem próximo de quem dominava e decidia, tinham a qualidade de emitir as opiniões que sabiam ser as mais convenientes e que mais agradavam à corrente dominante. Normalmente eram desprovidos de coluna vertebral, o que dava jeito para defenderem uma coisa hoje e amanhã estarem a defender o contrário, como se sempre o tivessem feito. Vem isto a propósito da estupefacção com que hoje fico, ao ler certos opinadores, a criticarem os resultados da política económica, baseada nas ideologias e nos modelos que sempre defenderam, como se de repente tivessem descoberto que afinal eram os “radicais irresponsáveis” que tinham razão. Claro que não vão tão longe, até porque a soberba e presunção não lhes permite reconhecerem que afinal não passam de pessoas cheias de vento e de certezas patetas. Passam então, em majestosos flic-flac´s à retaguarda, a falarem como se nunca tivessem defendido o que agora criticam. Vão assim, qual Narciso, de engano em engano até à derrota final. O gozo que isto dá é relativo, porque no fundo todos sofremos as consequências das opções que os “responsáveis do arco do poder” tomaram, ajudados por alguns destes “acrobatas”, mas enfim, fica sempre o gozo de ver confirmada a superioridade moral de quem segue a sua linha, mesmo que em minoria. Quem sabe um dia a maioria das pessoas perceba que o dinheiro foi inventado para facilitar as trocas entre elas, e não para as dominar e criar supostas elites que geralmente mais não sabem fazer do que contar o dinheiro dos outros.

É PERMITIDO AFIXAR ANÚNCIOS

DESDE TOMAR, O TELEMÓVEL DO RELVAS...


Educadinho que sou, limito-me a transcrever parte do estudo da Visão de hoje.

Cada um, que pense o que muito bem entender:

Miguel Relvas teve, durante 10 anos, e enquanto presidente da assembleia municipal de Tomar, telemóvel e chamadas pagas pela Câmara. Sem limites.

Para se ter uma ideia das despesas, a VISÃO procurou exemplos nas duas maiores câmaras do País. Em 2006, ano em que Relvas gastou ao município de Tomar quase 4 mil euros em chamadas, a autarquia de Lisboa, então presidida por Carmona Rodrigues (PSD), estabelecera 85 euros como plafond máximo para os seus autarcas e funcionários. Acima disso, pagavam os próprios. Os dados do município do Porto são mais atuais: Valente de Oliveira, presidente da assembleia municipal, tem direito a telemóvel, mas prescindiu dele. Se o usasse, teria direito a um plafond máximo de 135 euros. A última fatura de Relvas em Tomar é de 27 de junho do ano passado, seis dias após tomar posse no Governo PSD/CDS. O valor acumulado nesse período ultrapassava 1200 euros. Segundo dados do próprio executivo camarário de Tomar, a dívida global da autarquia é hoje de 39 milhões de euros, 22 milhões dos quais à banca. O ministro não esteve disponível para falar à VISÃO sobre os temas que constituem a reportagem da edição desta semana.

TELEMÓVEL MIGUEL RELVAS (GASTOS ANUAIS)

•Ano 2002 - 1 598,50€
•Ano 2003 - 934,40€
•Ano 2004 - 947,79€
•Ano 2005 - 559,49€
•Ano 2006 - 3 896,03€
•Ano 2007 - 5 623,32€
•Ano 2008 - 4 858,29€
•Ano 2009 - 7 444,46€ (ano de eleições europeias, legislativas e autárquicas)
•Ano 2010 - 3 391,55€
•Ano 2011- 1 251,03€ (até o dia 27 de junho de 2011; as eleições legislativas que deram a vitória ao PSD realizaram-se a 5 de junho e o Governo tomou posse a 21; Posteriormente o número do telemóvel foi cedido à Secretaria-Geral da Presidência do Conselho de Ministros.)

POSTAIS SEM SELO


Saber-se, depois de ver Match Point de Woody Allen, que os jogadores de ténis são mentirosos.


Legenda: Maria Sharapova, tenista russa

TUDO MAIS FRESQUINHO...


Rua 1º de Dezembro, ontem, ao cair da tarde.

Dois sem-abrigo, à conversa, em redor de um pak de branco.

Calmamente comentam as alterações que, segundo o Público, a revista Exame vai publicar por uns destes dias, e que, preto no branco, mostram que Alexandre Soares dos Santos destronou Américo Amorim, da lista dos mais ricos de Portugal, coisa que o homem da cortiça mantinha há quatro anos consecutivos.

-  E não queres ver que o património dos mais abastados do país equivale a 8,5% do PIB de 2012?

-  Caramba! É de se lhe tirar o chapéu!...

-  Ainda por cima depois de se saber que a campanha que o grande merceeiro fez no 1º de Maio, deu-lhe um prejuízo do caraças!...Ele há coisas!... Já agora diz lá quem são os outros ricaços.

-  Pois aponta aí:

1. Alexandre Soares dos Santos: 2070 milhões de euros

2. Américo Amorim: 1955,9 milhões de euros

3. Família Guimarães de Mello, 700,1 milhões de euros

4. Belmiro de Azevedo: 680,9 milhões de euros

5. Família Alves Ribeiro: 650,8 milhões de euros

6. Rita Celeste Violas e Sá, Manuel Violas: 609,3 milhões de euros

7. Família Cunha José de Mello: 560 milhões de euros

8. Fernando Figueiredo dos Santos: 542,3 milhões de euros

9. Maria Isabel dos Santos: 542,3 milhões de euros

10. Luís Silva e Maria Perpétua Bordalo Silva: 521 milhões de euros.

- Sim senhor!... pena o branco não estar fresquinho!...

quarta-feira, 25 de julho de 2012

MARCADORES DE LIVROS

O FATO NOVO DO REI


Acrónica de Manuel António Pina no Jornal de Notícias de ontem:

Quem, como eu e a generalidade dos portugueses, não percebe nada de Finanças nem consta que tenha biblioteca e ouve repetidamente dizer, ao fim de um ano de inauditos sacrifícios, desemprego, miséria e fome, que "estamos no bom caminho", acabando por descobrir que afinal, em Março, a dívida pública portuguesa cresceu mais 26 mil milhões em relação a Março de 2011 (reinava então Sócrates, cognominado pelo actual Governo de "o Gastador"), perguntar-se-á legitimamente onde irá dar o "bom caminho".
Mas talvez, quem sabe?, seja assim que se combate a dívida, aumentando a dívida. Como o desemprego se combate facilitando e embaratecendo os despedimentos e destruindo emprego.

Dir-se-á que nem eu nem os portugueses mais pobres cuja existência tem sido imolada no altar da dívida, somos economistas, do mesmo modo que o menino que não conseguiu ver a fatiota invisível do Rei e gritou "O Rei vai nu" não era, obviamente, alfaiate. Mas quem escute as homilias diárias dos alfaiates da política de austeridade demonstrando, mediante equações só acessíveis a pessoas inteligentíssimas e com vastas bibliotecas, que "não há alternativa", esperaria ver o Rei, já não digo com sapatos novos, mas ao menos um pouco mais apresentáveis do que há um ano.

Sobretudo depois de, em Janeiro, o alfaiate-mor ter anunciado no Parlamento que 2012 seria o "ano de viragem económica para o país".

HISTÓRIAS P'RA CAMELOS!!!...


A notícia vem hoje nos jornais e diz que a promoção inesperada de 50% em quase todos os produtos no feriado do 1º de Maio ajudou o Pingo Doce a aumentar em 2,4% as vendas no segundo trimestre, depois de um início de ano com quebras de 0,8%, em comparação com o período homólogo de 2011 e tendo em conta o mesmo número de lojas.

Contudo, a aposta nos descontos teve impactos negativos na margem EBITDA, indicador que representa a geração de lucro, excluindo os efeitos financeiros e de impostos. E implicou custos extra de 10 milhões de euros, assumidos pelo grupo Jerónimo Martins como investimento para reforçar a marca Pingo Doce e a sua posição competitiva no mercado.

Se eu fosse o dono daquela mercearia - Livra! -, e os meus colaboradores tivessem lançado uma campanha para perder dinheiro, perguntava-lhes o que é que andavam a fazer por ali e aconselhava-os a arranjar outro modo de vida.

Claro que o Pingo Doce ganhou bem com a ordinarice da  campanha do Dia do Trabalhador. Não tanto quanto costuma - ou costumava ganhar antes de chegarmos ao ponto onde agora estamos - mas ganhou!

Os fornecedores que o digam!

Estou farto de chicos-espertos, farto mesmo!

terça-feira, 24 de julho de 2012

OLHARES


Lisboa, Avenida Duque de Loulé.
O homem já tem à frente um café e um bagaço.
Para o cachorro há-de chegar um bolo de arroz.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

SE NADA TENS PARA DAR-ME


Dá-me algo mais do que silêncio ou doçura
Algo que tenhas e não saibas
Não quero dádivas raras
Dá-me uma pedra.

Não fiques imóvel fitando-me
como se quisesses dizer
que há muitas coisas mudas
ocultas no que se diz

Dá-me algo lento e fino
como uma faca nas costas
E se nada tens para dar-me
dá-me tudo o que te falta!


Poema de Carlos Eduardo de Ory em Doze Nós Numa Corda, mudado para português por Herberto Helder


Legenda: pintura de Alfredo Keil.

PARAÍSOS...



Dizem os entendidos,  que há um enorme buraco negro na economia mundial: as fortunas privadas guardadas em paraísos fiscais.
Ninguém sabe ao certo qual o montante, mas um economista norte-americano lança um número na ordem dos 26,3 biliões de euros.
Só?

DO BAÚ DOS POSTAIS


Bairro nativo, Port Said, Egipto

domingo, 22 de julho de 2012

UMA VEZ MAIS!!!


 Em Aurora, um subúrbio de Denver, um louco investiu por um cinema onde se exibia um filme da saga Batman.

Matou 12 pessoas e feriu 58.

Sempre que acontece uma tragédia como esta, vem à baila a velha história da facilidade com que, nos Estados Unidos se podem adquirir armas: podem encomendar-se pelo correio, podem ser oferecidas a quem abra uma conta bancária, compre uma treta qualquer.

Não se  sabe quantos milhões de armas circulam pelo país.

Michael Moore, um cineasta não muito escrupuloso, realizou um documentário a que chamou Bowling for Columbine que regista o massacre ocorrido em Abril de 1999, no Colorado, em que dois jovens, depois de terem jogado bowling, entraram pelo liceu e, durante horas, entretiveram-se a disparar sobre alunos e professores, provocando dezenas de mortos e feridos.

No documentário de Moore, ressalta o poder que os lobbies dos defensores da posse de armas, concentrados na National Rifle Association, detêm no país, o chorudo negócio que representa, há mesmo alguém diz que se não culpamos os fósforos pelos incêndios, por que motivo há que culpar as armas pelos massacres que ocorrem?

Todo o arsenal que James Hiltom, o atirador, usou para atirar sobre os espectadores de uma sala de cinema de Aurora - uma espingarda de assalto semiautomática AR-15, uma espingarda Remington de calibre 12 e duas pistolas Glock de calibre 0,40 - foi comprado legalmente em lojas de armas do Colorado, sem qualquer tipo de impedimento, registo ou supervisão, dois meses antes do massacre durante a estreia do filme de Batman.

James Holmes também não teve dificuldade em adquirir, na Internet, as munições necessárias para todo esse armamento: 300 balas para a caçadeira e mais de 6000 cartuchos de balas para as pistolas e para a semiautomática (a AR-15 encontrada no local do crime tinha um tambor de cem balas, podendo disparar até 60 tiros por minuto).

Recomeça o debate sobre o uso de armas nos Estados Unidos, as opiniões estão extremadas, e, aos poucos, se irão desvanecendo.

Até à próxima tragédia.

Legenda: fotografia de Elliott Erwitt

O RELVAS NO TOUR


Terminou a 99ª edição da Volta à França.

A vitória sorriu ao britânico Bradley Wiggins.

Os entendidos dizem que o Tour deste ano, foi pouco empolgante e verificaram-se novos casos de dopagem.

Portugueses também andaram pelo Tour: dois a correr, Rui Costa e Sérgio Paulinho, que concluíram a prova nos Campos Elíseos, e um outro, Miguel Relvas, que alguém, muito judiciosamente, mandou que fosse para casa estudar.

Para o ano acontecerá a 100ª edição do  Tour de France.

sábado, 21 de julho de 2012

OLHAR AS CAPAS


Manual de Alfabetização

Helena Cidade Moura
Capa de Jorge Palha com o pormenor de um desenho de Rogério Ribeiro
Editorial Caminho, Lisboa Maio 1979

Àqueles que cortam à noite as estradas desertas a pé ou de motoreta contra o vento e contra a chuva e se dirigem à luz acesa na escola da terra adormecida.
Aos jovens que trocam as noites de descanso ou de convívio pelo grupo de alfabetizandos e que no fim de pouco tempo trazem no olhar as marcas da luta daqueles que passaram a ser os seus companheiros.
Àqueles que mal acabado o exame da 4ª classe entendem que devem alfabetizar os seus vizinhos. E depois de um dia de trabalho vão à noite à escola transformar em vida participada os gestos dos professores letrados que os ensinaram.
A todos os companheiros com quem tenho trocado experiências e que comigo são autores deste trabalho.

HELENA CIDADE MOURA (1924-2010)


Morreu, ontem Helena Cidade Moura.

Soube sempre que não era necessário colocar-se em bicos de pés para ficar na história do seu país.

Incansável lutadora contra a ditadura, foi responsável, após o 25 de Abril, da mais consequente campanha de alfabetização que este país conheceu, e que tão mal aproveitou.

Num livrinho, Manual de Alfabetização deixou registados os passos de uma experiência acontecida numa zona rural a 20km de Lisboa, onde faltam os transportes, a água, por vezes a luz, médicos, escolas, estradas, habitações, creches, lojas, jardins, cinemas, ginásios, teatros, etc.,etc.

Muitos não a conhecem, outros já esqueceram.

Militante do MDP/CDE, foi sua dirigente e, durante três legislaturas, deputada à Assembleia da República.

O lugar-comum que brota nestas ocasiões, é dizer que com a sua morte ficamos mais pobres.

Mas é que ficamos mesmo!

DA MINHA GALERIA


Desculpem lá, está um calor de não se poder sair de casa e eu gosto muito deste pedacinho de Viver é o que Importa.
Podem considerar um filme da treta - não me ofendo! - mas é um filme da minha adolescência, bem ao gosto do meu lado romântico e sentimental. Troca de olhares, mãos entrelaçadas e ficamos a perceber tudo.
Originalmente o filme chama-se Rome Adventure e foi realizado por Delmer Daves em. 1962.
Interpretações de Troy Donahue, Angie Dickson, Rossano Brazi, Suzanne Pleshette.
No filme, Al Di La é cantada por Emilio Percoli, mas gosto muito da interpretação da Connie Francis.
Os brasileiros chamarama ao filme O Candelabro Italiano.

sexta-feira, 20 de julho de 2012

OS CROMOS DO BOTECO

JOSÉ HERMANO SARAIVA (1919-2012)


José Hermano Saraiva morreu hoje.

Historiador, advogado, deputado da Assembleia Nacional, ministro da educação da ditadura entre 1968 e 1969.

Devido à crise académica de 1969, foi substituído no cargo por Veiga Simão.



Em 1972 é nomeado embaixador de Portugal em Brasília.

Em 1961 iniciara na Rádio Televisão Portuguesa uma série de programas sobre história, gentes e lugares, colaboração que, após o 25 de Abril, retomou e que manteve até aos dias de hoje.

Coimbra, 17 de Abril de 1969.

Em plena crise académica o chefe de Estado Américo Tomás desloca-se a Coimbra para a inauguração do novo edifício das Matemáticas.

As autoridades tinham negado o pedido, feito pelos estudantes, de um seu representante, durante a palavra, usar da palavra.

A Associação de Estudantes de Coimbra incumbiu o estudante Alberto Martins de pedir directamente a palavra ao Chefe de Estado.

A fotografia acima, reproduz o momento em que Tomás, depois do pedido de Alberto Martins diz:

Bem… bem… mas agora fala o sr. Ministro das Obras Públicas.

Na mesma fotografia, José Hermano Saraiva, olha insistentemente para o local onde se encontrava a brigada da Pide/DGS, aguardando a sua entrada para colocar ponto final ao insólito pedido de Alberto Martins.


Legenda:  fotografia e elementos retirados do livro Coimbra 1969, Celso Cruzeiro, Edições Afrontamento,  Porto 1989.

POSTAIS SEM SELO


Sonho que salto, que nado, que corro, que brinco. Sonho que estalo de riso, atravesso o rio de um salto, me perseguem muitas viaturas e nunca me alcançam.


Legenda: não foi possível localizar o autor/origem desta fotografia.

quinta-feira, 19 de julho de 2012

DOUTORES DA MULA RUÇA


O Parecer de equivalências é por si só um documento muito interessante, não só porque é feito à medida do aluno muito especial, mas também pelo que revela de uma certa maneira de pensar a política. O seu conteúdo é danoso para a Universidade Lusófona e compreende-se a preocupação dos seus alunos e professores de se porem a milhas deste processo. Mas é também um documento sobre o Portugal dos nossos dias.

Começa porque os saberes que o documento refere são todos vivenciais e não será difícil a todos os deputados da Assembleia, todos os dirigentes da JSD e JS, os funcionários dos grupos parlamentares, os presidentes de secções, distritais, federações, organismos regionais, seja lá o que forem, ou seja todo o pessoal com experiência de cargos partidários, de Monção a Vila Real de Santo António, que não tenha um grau académico, obter uma licenciatura na Universidade Lusófona e usar o "dr." antes do nome. É que os argumentos para dar o título a Relvas aplicam-se a todos eles e a muitos deles com mais mérito e razão.

Por exemplo, se Jerónimo de Sousa quisesse ser "doutor da mula ruça", como coloridamente se referiu ao título de Relvas, teria o curso de imediato. Não tem ele experiência do "exercício de cargos públicos, o exercício de funções políticas e o desempenho de funções em domínios empresariais, ou de intervenção social e cultural"? Militante e funcionário do PCP, dirigente sindical, autarca (tudo "exercício de cargos públicos, o exercício de funções políticas"), organizador tanto de greves como de festas como a do Avante! ("desempenho de funções em domínios empresariais, ou de intervenção social e cultural"), não encaixa nos critérios da Lusófona? Não tem ele "experiência (...) que se estende ao longo de mais de duas décadas de actividades essencialmente focadas no domínio da política nacional e local"? Até mais do que duas décadas, o que devia dar um doutoramento. Não tem ele "desde muito jovem uma participação activa nos mais relevantes palcos do debate e da discussão política nacional, nomeadamente enquanto deputado à Assembleia da República"? Não tem ele por essa experiência "a aquisição de competências relevantes na área de (...) Ciência Política e Relações Internacionais, nomeadamente aquelas que dizem respeito à compreensão dos quadros institucionais da actuação política e partidária em Portugal, (...) ao funcionamento dos sistemas eleitorais, (...) métodos e técnicas de análise política e (...) consequências sociais do fenómeno político"? Se tem! Até se podem acrescentar várias "universidades da vida" muito complicadas: fez a Guerra Colonial, trabalhou numa fábrica, estudou ao mesmo tempo que trabalhava, militou num partido "duro", em que os riscos sociais de exclusão são muito mais pesados do que no PS e no PSD depois de 1975.

Mas Jerónimo de Sousa nunca pediria equivalências académicas pela sua vida, até porque entenderia que isso a diminuiria no seu valor de esforço, ou naquilo a que chamaria "de luta". E não tenho dúvidas de que Jerónimo de Sousa, que é em grande parte um autodidacta, gostaria de ter tido mais qualificações académicas. Como muita gente que não pode estudar para além do ensino básico e profissional (também ele "frequentou" o antigo Curso Industrial, que interrompeu para ir trabalhar), com a sua condição social, valoriza o estudo, o conhecimento, e a escolaridade.

José Pacheco Pereira no Abrupto

MARCADORES DE LIVROS

"FAIT-DIVERS"


Para que os contribuintes beneficiem do máximo de incentivo ao combate à evasão fiscal, com uma dedução em IRS de 250 euros, o agregado familiar terá de gastar, em 2013, mais de 26 mil euros em reparação automóvel, alojamento, em restauração e cabeleireiros, algo como 2228 euros por mês. E a dedução só será sentida no reembolso de IRS enviado em 2014.

OLHAR AS CAPAS



Mulheres Que Lêem São Perigosas

Stefan Bollmann
Tradução Maria Filomena Duarte
Prefácio Elke Heidenreich
Tradução do prefácio: Paulo Rêgo
Quetzal Editores, Lisboa Abril 2007

Entender-se-iam homens e mulheres melhor se os homens lessem tanto como as mulheres? Saberiam eles mais acerca das nossas vidas, dos nossos pensamentos, dos nossos sentimentos, se lessem Sylvia Plath, Virginia Woolf, Carson McCullers, Jane Bowles, Annemarie Schwarzenbach ou Dorothy Parker, do mesmo modo que nós lemos Hemingway, Faulkner, Updike, Roth, Flaubert e Balzac? «As mulheres lêem de maneira diferente», observa Ruth Kluger ao abordar este interessante tema. Elas também lêem mais. E, ao ler, são ambas as coisas, homem e mulher, não têm sexo, sofrem com o herói, com a heroína, com o autor, com a autora, é-lhes indiferente. Estão reféns do livro. Apenas consigo amara homens que lêem, que de repente erguem a cabeça com aquela expressão no olhar, vinda de bem longe, suave, uma expressão repleta de um conhecimento não apenas de si, mas também acerca de mim. No entanto, regra geral, os homens não gostam de mulheres que lêem. E só muito de quando em quando é que homens e mulheres lêem em conjunto.

(Citação retirada do prefácio)

quarta-feira, 18 de julho de 2012

O BISPO QUE NÃO SE ESCONDE


A crónica de Manuel António Pina, hoje, no Jornal de Notícias:

O que o bispo D. Januário disse na TVI não foi, como clama o jornalismo de "soundbyte", que "este Governo é profundamente corrupto". Disse que "há jogos atrás da cortina, habilidades e corrupção, este Governo é profundamente corrupto nestas atitudes a que estamos a assistir". Há uma diferença essencial. E há uma desonestidade igualmente essencial quando se retiram da frase algumas palavras omitindo o resto.
Por coincidência, no mesmo dia o vice-presidente da Transparência Internacional afirmava que os envolvidos nas privatizações da EDP e da REN devem ser chamados a responder pelo que se terá passado "atrás da cortina". E, no dia anterior, fora noticiado que a PJ e o DCIAP fizeram buscas nos bancos ligados a essas privatizações, não decerto por estarem seguros de que tudo se terá passado sem as "habilidades" ou sem a "corrupção" de que fala o bispo.

A reacção do ministro Aguiar-Branco, tomando as dores dos "alguns" a quem D. Januário insistentemente se reporta, traiu-o: mandou o bispo escolher entre "ser bispo (...) e ser comentador político". O mesmo que Salazar queria que D. António Ferreira Gomes fizesse.

E imagino o que diria Aguiar-Branco se D. Januário também tivesse, como o bispo do Porto, condenado o "financismo 'à outrance'", o "economismo despótico", o "benefício dos grandes contra os pequenos", a "opressão dos pobres" e o "ciclo da miséria" hoje promovidos pelo Governo.


Legenda: Richard Burton em A Noite de Iguana, filme de John Huston, 1964

É PERMITIDO AFIXAR ANÚNCIOS


O que me comove nas casas alentejanas é o azul-évora a quebrar a cal branca.
Como o deste pequeno restaurante na aldeia do Alqueva.
Infelizmente estava fechado pelo que não se conseguiu entrar na petisqueira.

ITINERÁRIOS


Mote encontrada numa parede do Retiro dos Caçadores em Trigaches, perto de Beja

terça-feira, 17 de julho de 2012

A "VIDA FÁCIL" DOS OUTROS


A crónica de Manuel António Pina no Jornal de Notícias de ontem:

Os números são relativos a 2010, ainda antes do PEC 1, PEC 2 e PEC 3, do memorando da "troika" e do Governo PSD/CDS: 18% dos portugueses, segundo o INE, e 25,3%, segundo o Eurostat, estavam em "risco de pobreza", eufemismo estatístico que significa que viviam com menos de 421 euros/mês, ou seja, que eram pobres.

Entretanto, Passos Coelho chegou a primeiro-ministro, clamando que "os portugueses não podem suportar mais sacrifícios". Afinal, podiam: em pouco mais de um ano, o desemprego subiu de 10,8% para 15,2%, foram drasticamente reduzidas as prestações sociais, confiscados, contra todas as promessas eleitorais, os subsídios de férias e Natal a funcionários públicos e pensionistas e aumentado o IVA para 23%, subiram para valores incomportáveis as taxas moderadoras no SNS, reduziram-se até à irrelevância as deduções no IRS e IRC e as isenções no IMI, aumentaram brutalmente os transportes, a electricidade e o gás, despedir tornou-se fácil e barato, multiplicou-se o trabalho precário e sem direitos, regressou o trabalho infantil...

Hoje há 1,4 milhões de pensionistas a viver com menos de 500 euros/mês, 550 mil trabalhadores com 485 euros (431,6 após os descontos) e 416 mil desempregados não recebem subsídio de desemprego. Tudo isto, como explicou Cavaco Silva a um jornal holandês, porque foram "demasiado negligentes e estão hoje a sofrer as consequências de "uma vida fácil".

DO BAÚ DOS POSTAIS


Porta na Rua da Muralha em Beja.

SARAMAGUEANDO


Mais uma espreitadela à correspondência de José Saramago e José Rodrigues Miguéis.

Em carta datada de 22 de Março de 1960, José Saramago acusa a recepção dos primeiros capítulos de A Escola do Paraíso:

Vou ler a Escola desde o princípio, regaladamente, com vagares de sibarita. Sem intenções de crítico, que o não sou, mas com os olhos que puder arranjar, lerei – e direi o que me parecer: tome a minha futura apreciação pelo que vale. Quanto ao Mário Dionísio, nós não temos de estar de acordo, uma vez que o nosso desacordo seria estulto e um pouco impertinente. O meu caro amigo é que dirá se efectivamente deseja que outros leiam o seu trabalho: de antemão concordamos com o seu desejo.

Deliciosa a parte final da carta:

Uma coisa continua a ser verdadeira: para best-seller só lhe falta que Portugal tenha 80 milhões de habitantes, em vez dos escassos 8 milhões, com 50% de analfabetos e 45% de leitores de letras gordas…

Numa carta de Nova Iorque datada de 12 de Maio de 1960, Migueis lamenta-se dos elevados custos das despesas de correio que tem de desembolsar para mandar livros e cópias corrigidas para a Editorial Cor. O lamento mostra, uma vez mais, as muitas e terríveis dificuldades económicas que sempre teve de enfrentar durante o seu exílio americano.

Acabo de botar no Correio, com destino ao reino di-a (sic) COR, as últimas 100 folhas (épico) do Paraíso: boa viagem e good luck, como se diz deste lado do rio. O pacote vai por via marítima, por economia – mesmo assim foram mais de 30 esc. Por avião seria uma barbaridade.

Esta carta tem um outro aspecto curioso: Miguéis conta que o capítulo O Pântano Fermenta da Escola do Paraíso sofreu censura familiar.

O penúltimo episódio (Pântano) acaba com uma cena para-pornográfica (?) que me fez suar: estava uma maravilha, mas a minha mulher protestou e foi um trabalhão para reduzir a isso. Mesmo assim talvez não possa passar. Quero a sua opinião desassombrada, no fim. Isto é um romance panorâmico, epocal, diferente, sem enredo nem intriga, cuja acção está no crescimento do pequeno Gabriel, que é o fulcro de tudo. Não sei se há outro parecido na nossa terra. Estou a terminar a Nota Explicativa («entrevista comigo mesmo») que talvez não junte ao livro, mas reserve para ser distribuída com as ofertas aos Proficientes Zoilos.


Legenda: José Rodrigues Miguéis, com a mulher Camila,, em Central Park no ano de 1939.
               Fotografia tirada do catálogo da exposição comemorativa do centenário do seu nascimento.