O Parecer de equivalências é por si só um documento muito interessante, não só porque é feito à medida do aluno muito especial, mas também pelo que revela de uma certa maneira de pensar a política. O seu conteúdo é danoso para a Universidade Lusófona e compreende-se a preocupação dos seus alunos e professores de se porem a milhas deste processo. Mas é também um documento sobre o Portugal dos nossos dias.
Começa porque os saberes que o documento refere são todos vivenciais e não será difícil a todos os deputados da Assembleia, todos os dirigentes da JSD e JS, os funcionários dos grupos parlamentares, os presidentes de secções, distritais, federações, organismos regionais, seja lá o que forem, ou seja todo o pessoal com experiência de cargos partidários, de Monção a Vila Real de Santo António, que não tenha um grau académico, obter uma licenciatura na Universidade Lusófona e usar o "dr." antes do nome. É que os argumentos para dar o título a Relvas aplicam-se a todos eles e a muitos deles com mais mérito e razão.
Por exemplo, se Jerónimo de Sousa quisesse ser "doutor da mula ruça", como coloridamente se referiu ao título de Relvas, teria o curso de imediato. Não tem ele experiência do "exercício de cargos públicos, o exercício de funções políticas e o desempenho de funções em domínios empresariais, ou de intervenção social e cultural"? Militante e funcionário do PCP, dirigente sindical, autarca (tudo "exercício de cargos públicos, o exercício de funções políticas"), organizador tanto de greves como de festas como a do Avante! ("desempenho de funções em domínios empresariais, ou de intervenção social e cultural"), não encaixa nos critérios da Lusófona? Não tem ele "experiência (...) que se estende ao longo de mais de duas décadas de actividades essencialmente focadas no domínio da política nacional e local"? Até mais do que duas décadas, o que devia dar um doutoramento. Não tem ele "desde muito jovem uma participação activa nos mais relevantes palcos do debate e da discussão política nacional, nomeadamente enquanto deputado à Assembleia da República"? Não tem ele por essa experiência "a aquisição de competências relevantes na área de (...) Ciência Política e Relações Internacionais, nomeadamente aquelas que dizem respeito à compreensão dos quadros institucionais da actuação política e partidária em Portugal, (...) ao funcionamento dos sistemas eleitorais, (...) métodos e técnicas de análise política e (...) consequências sociais do fenómeno político"? Se tem! Até se podem acrescentar várias "universidades da vida" muito complicadas: fez a Guerra Colonial, trabalhou numa fábrica, estudou ao mesmo tempo que trabalhava, militou num partido "duro", em que os riscos sociais de exclusão são muito mais pesados do que no PS e no PSD depois de 1975.
Mas Jerónimo de Sousa nunca pediria equivalências académicas pela sua vida, até porque entenderia que isso a diminuiria no seu valor de esforço, ou naquilo a que chamaria "de luta". E não tenho dúvidas de que Jerónimo de Sousa, que é em grande parte um autodidacta, gostaria de ter tido mais qualificações académicas. Como muita gente que não pode estudar para além do ensino básico e profissional (também ele "frequentou" o antigo Curso Industrial, que interrompeu para ir trabalhar), com a sua condição social, valoriza o estudo, o conhecimento, e a escolaridade.
Começa porque os saberes que o documento refere são todos vivenciais e não será difícil a todos os deputados da Assembleia, todos os dirigentes da JSD e JS, os funcionários dos grupos parlamentares, os presidentes de secções, distritais, federações, organismos regionais, seja lá o que forem, ou seja todo o pessoal com experiência de cargos partidários, de Monção a Vila Real de Santo António, que não tenha um grau académico, obter uma licenciatura na Universidade Lusófona e usar o "dr." antes do nome. É que os argumentos para dar o título a Relvas aplicam-se a todos eles e a muitos deles com mais mérito e razão.
Por exemplo, se Jerónimo de Sousa quisesse ser "doutor da mula ruça", como coloridamente se referiu ao título de Relvas, teria o curso de imediato. Não tem ele experiência do "exercício de cargos públicos, o exercício de funções políticas e o desempenho de funções em domínios empresariais, ou de intervenção social e cultural"? Militante e funcionário do PCP, dirigente sindical, autarca (tudo "exercício de cargos públicos, o exercício de funções políticas"), organizador tanto de greves como de festas como a do Avante! ("desempenho de funções em domínios empresariais, ou de intervenção social e cultural"), não encaixa nos critérios da Lusófona? Não tem ele "experiência (...) que se estende ao longo de mais de duas décadas de actividades essencialmente focadas no domínio da política nacional e local"? Até mais do que duas décadas, o que devia dar um doutoramento. Não tem ele "desde muito jovem uma participação activa nos mais relevantes palcos do debate e da discussão política nacional, nomeadamente enquanto deputado à Assembleia da República"? Não tem ele por essa experiência "a aquisição de competências relevantes na área de (...) Ciência Política e Relações Internacionais, nomeadamente aquelas que dizem respeito à compreensão dos quadros institucionais da actuação política e partidária em Portugal, (...) ao funcionamento dos sistemas eleitorais, (...) métodos e técnicas de análise política e (...) consequências sociais do fenómeno político"? Se tem! Até se podem acrescentar várias "universidades da vida" muito complicadas: fez a Guerra Colonial, trabalhou numa fábrica, estudou ao mesmo tempo que trabalhava, militou num partido "duro", em que os riscos sociais de exclusão são muito mais pesados do que no PS e no PSD depois de 1975.
Mas Jerónimo de Sousa nunca pediria equivalências académicas pela sua vida, até porque entenderia que isso a diminuiria no seu valor de esforço, ou naquilo a que chamaria "de luta". E não tenho dúvidas de que Jerónimo de Sousa, que é em grande parte um autodidacta, gostaria de ter tido mais qualificações académicas. Como muita gente que não pode estudar para além do ensino básico e profissional (também ele "frequentou" o antigo Curso Industrial, que interrompeu para ir trabalhar), com a sua condição social, valoriza o estudo, o conhecimento, e a escolaridade.
José Pacheco Pereira no Abrupto
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