segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

O ALENTEJO É ASSIM


Quem me conhece sabe de uma velha frase: «Não sou alentejano mas gostava de ser.»

No seu Diário Inédito, Vergílio Ferreira conta uma história sobre alentejanos.

Ele escreveu história e não anedota, note-se.

«Évora, 10 de Abril de 1949

O meu amigo A.M. contou-me esta história:

Um dia, num passeio pelo campo, deserto, encontrou ele um homem sozinho, sentado numa pedra, imóvel, como abandonado ao correr do tempo.

- Ora boa tarde. Então que faz vossemecê por aqui?

- Que faço… Vinha com um camarada que foi aí adiante. Disse-me que demorava pouco e já aqui estou à espera há três dias.

O Alentejo é assim.»

Este Diário Inédito corresponde a uma diarística que Vergílio Ferreira escreveu entre 1944 e 1949, e que regista a evolução do autor como futuro escritor (estes textos quase diários começam com a idade de 26 anos e terminam aos 32 anos, a 20 de Janeiro de 1949 revela que concluiu o romance Mudança «não sei bem se o tema interessará mas a mim diz-me muito, talvez por ter ainda à sua roda o calor com que o escrevi») e que se podem considerar a base dos futuros Conta-Corrente.

São os tempos em que anda à volta de filósofos como, entre outros) Hegel, Kirkegaard, Gabriel Marcel, Julien Benda mas principalmente Jean-Paul Sartre.

Entrada diarística de 21 de Março de 1944:

«Curiosa é a ignorância repousada dos nossos modernistas. Eles clamam por Sartre.Mas saberão que Sartre prega a verdade feita pelas mãos de cada um? Ou já sabem que o que vale em Sartre não e o que ele prega mas o que desgraçadamente realiza? Em todo o caso, vou rachar estes tipos qualquer dia, com um artigo.» 

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