quinta-feira, 1 de abril de 2010

MEMÓRIAS

Volta e meia vem à conversa o “vocês foram felizes durante a ditadura”.
Há sempre que dizer: Não, não fomos felizes durante a ditadura. Fomos felizes contra a ditadura.Assim é que está certo. porque se fomos felizes, não o sabíamos.
O que havia era companheirismo, solidariedade, pequenos gestos.
Vividos os primeiros meses da Festa de Abril, meses de arrebatamento, cada um passou a percorrer outros caminhos, ao mesmo tempo que aquele romantismo e generosidade que fizeram os dias de luta começou a diluir-se.
Entendeu-se desejar, que cada português fosse um dos nossos.
O desequilíbrio apoderou-se dos nossos passos.
“Vê lá tu, que o Álvaro Guerra, só porque não sou do partido dele, deixou de me falar”, dizia com um sorriso triste o Mário-Henrique Leiria.
A 1ª edição da “Praça da Canção” do Manuel Alegre foi publicada pela revista “Vértice” e quase todos os exemplares foram distribuídos pelos seus assinantes.
Os poucos exemplares postos à venda foram, de imediato, apreendidos pela PIDE.
O pai do Zé Ferraz era assinante da “Vértice”. O Zé trouxe-nos o livro para leitura colectiva. Mas ficava a faltar o ter o livro, senti-lo quando necessário.
Não havia máquinas de fotocópias, esses avanços da técnica que hoje permitem o que quer que seja.
Foi quando a Aida se prontificou a copiar o livro para cadernos de linhas.
Um para nós, outro para o Armindo, outro para o Zé Leal Ferreira.
O exemplar do Leal Ferreira acompanhou-o para a guerra e, muitas vezes, falou ele da “Praça da Canção” copiada pela Aida, e o quanto isso o ajudou a passar os dias difíceis.
Hoje sabemos que já morreram muitas das coisas em que um dia acreditámos.
E não nos ocorre saber por onde, uns e outros, andam.
Certamente, alguns já não estarão por cá.
Também deixámos de querer saber.

1 comentário:

ié-ié disse...

Ganda história!

LT