Arranjos e direcção Musical José Mário Branco
Capa de Armando Alves e José Rodrigues
Gravação em 8 pistas no “Strawberry Studio” no Chateau d’ Hérouville.
Editado em 1971.
Lado 1
Aertura – Gare d’Austerlitz
Cantiga para pedir dois tostões – Sérgio Godinho/J.M. Branco
Cantiga do Fogo e da Guerra – Sérgio Godinho/J.M. Branco
O Charlatão – Sérgio Godinho
Queixa das Jovens Almas Censuradas – Natália Correia/ J.M. Branco
Lado 2
Nevoeiro – José Mário Branco
Mariazinha – José Mário Branco
Casa Comigo Marta – Sérgio Godinho/J. M. Branco
Perfilados de Medo – Alexandre O’ Neill/J.M. Branco
Mudam-se os Tempos, Mudam-se as Vontades – Luís de Camões/J.M. Branco e Jean Sommer
Bob Dylan já nos avisara que os tempos estavam a mudar.
Foi quando chegou José Mário, pela pena de um tal Luís de Camões, a dizer-nos que todo o mundo é composto de mudança.As vontades também.
A abertura conseguida de um som de comboios na Gare d’Austerlitz, um acordeão em fundo, lembrando quem, do país cinzento, saíu em busca de outras perspectivas de vida ,e em Austerlitz desembarcava. os outros, os perseguidos politicamente, passavam as fronteiras a salto.
“- Entregas-me as peles em Moiros.
- A que horas?
-Às onze”
As “peles”, explica Miguel Torga no seu “Diário”, eram os emigrantes clandestinos. “Onde pode chegar o aviltamento humano”, comenta Torga.
“assim se encerra a fase confusa
da nova música portuguesa
assim se inaugura uma época nova
onde também cantar bem e compor melhor
serão condições a exigir a canção útil
da afinação da palavra
à desafinação das cordas
à percussão das peles e teclas
à imaginação nos arranjos
à criação melódica à vocalização justa
aqui o circo foi desmantelado
com todas as ferramentas do som".
Palavras que José Duarte escreveu nas badanas de “Mudam-se os Tempos e as Vontades” e fez questão de deixar um abraço a Sérgio Godinho, porque “poeta bom não morre à sombra.”
"Queixa das Almas Jovens Censuradas"
“Dão-nos um lírio e um canivete
e uma alma para ir à escola
mais um letreiro que promete
raízes, hastes e corola
Dão-nos um mapa imaginário
que tem a forma de uma cidade
mais um relógio e um calendário
onde não vem a nossa idade
Dão-nos a honra de manequim
para dar corda à nossa ausência.
Dão-nos um prémio de ser assim
sem pecado e sem inocência
Dão-nos um barco e um chapéu
para tirarmos o retrato
Dão-nos bilhetes para o céul
evado à cena num teatro
Penteiam-nos os crâneos ermos
com as cabeleiras das avós
para jamais nos parecermos
connosco quando estamos sós
Dão-nos um bolo que é a história
da nossa historia sem enredo
e não nos soa na memória
outra palavra que o medo
Temos fantasmas tão educados
que adormecemos no seu ombro
somos vazios despovoados
de personagens de assombro
Dão-nos a capa do evangelho
e um pacote de tabaco
dão-nos um pente e um espelho
pra pentearmos um macaco
Dão-nos um cravo preso à cabeça
e uma cabeça presa à cintura
para que o corpo não pareça
a forma da alma que o procura
Dão-nos um esquife feito de ferro
com embutidos de diamante
para organizar já o enterro
do nosso corpo mais adiante
Dão-nos um nome e um jornal
um avião e um violino
mas não nos dão o animal
que espeta os cornos no destino
Dão-nos marujos de papelão
com carimbo no passaporte
por isso a nossa dimensão
não é a vida, nem é a morte”
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