Quem muito viu, sofreu,
passou trabalhos,
mágoas, humilhações, tristes surpresas;
e foi traído, e foi roubado, e foi
privado em extremo da justiça justa;
e andou terras e gentes, conheceu
os mundos e submundos; e viveu
dentro de si o amor de ter criado;
quem tudo leu e amou, quem tudo foi –
não sabe nada, nem triunfar lhe cabe
em sorte como a todos os que vivem.
Apenas não viver lhe dava tudo.
Inquieto e franco, altivo e carinhoso,
será sempre sem pátria. E a própria morte,
quando o buscar, há-de encontrá-lo morto.
mágoas, humilhações, tristes surpresas;
e foi traído, e foi roubado, e foi
privado em extremo da justiça justa;
e andou terras e gentes, conheceu
os mundos e submundos; e viveu
dentro de si o amor de ter criado;
quem tudo leu e amou, quem tudo foi –
não sabe nada, nem triunfar lhe cabe
em sorte como a todos os que vivem.
Apenas não viver lhe dava tudo.
Inquieto e franco, altivo e carinhoso,
será sempre sem pátria. E a própria morte,
quando o buscar, há-de encontrá-lo morto.
Jorge de Sena, soneto retirado de Entrevistas
3 comentários:
um auto-retrato poético...
Apesar de difícil, Jorge de Sena é um nome incontornável da nossa literatura. E tão esquecido que ele está!... Nem no centenário do seu nascimento recebeu a atenção que mereceria. Se compararmos com as atenções que rodeiam o centenário de Sophia, percebemos que Sena continua a ser aquela pessoa não grata para as esferas culturais e governamentais. Como se não lhe bastasse os tempos de exílio!
Aos poucos vou entrando na sua larga e multifacetada obra e as surpresas não deixam de acontecer. Este soneto, notável soneto, que o Luís chama justamente «um auto-retrato poético», é uma dessas surpresas que encontrei no meio dum grosso volume que constitui as entrevistas que Sena concedeu ao longo dos tempos.
Não sei se se recorda que, em tempo de Feira do Livro, me perguntou pela Correspondência que Sena trocou com João Gaspar Simões, livro publicado pela «Guerra e Paz»e respondi-lhe que ainda não tinha lido. Adquiri-o posteriormente e terminei-o agora. Não é bem uma correspondência como outras que Sena possui. Em tempo antigo, zangaram-se e só muito tarde voltaram a entender-se, daí serem escassas as cartas, apesar da ajuda que Mécia de Sena solicitou a João Gaspar Simões e este, aparentemente, não correspondeu, por não as encontrar ou não estar interessado na sua publicação.
O livro está em linha para um «Olhar as Capas«.
"Se compararmos com as atenções que rodeiam o centenário de Sofia..."
Muito bem observado (e estou de acordo com o que escreveu Sammy).
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