6 de Março de 1943
Há momentos nestes primeiros ensaios da
primavera em que parece que é por um tris que a verdade última da vida não
rasga o seu véu misteriosos e aparece toda nua diante dos olhos do mundo. Ou
porque um pássaro acabou por encontrar o sítio para fazer o ninho, ou porque
uma flor começou a abrir, ou por qualquer outra razão que se não vê, as árvores
parram de mexer, as aves param de cantar, as águas param de correr, e um grande
silêncio de espectativa pura paira na cósmica alegria de tudo. A natureza
parece inteira em jejum de comunhão.
Mas os segundos passam, aquela tensão exaspera-se, começa a bulir uma folha, a trinar um melro, a murmurar uma fonte, e nada acontece.
Miguel Torga em
Diário Volume II
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