quarta-feira, 2 de junho de 2021

O QUOTIDIANO «NÃO»


Estamos todos bem servidos
de solidão.
De manhã a recolhemos
do saco, em lugar de pão.

Pão é claro que temos
(não sou exageradão)
mas esta imagem do saco
contendo um pequeno «não»

não figura nesta prosa
assim do pé para a mão,
pois o saco utilizado,
que pode ser o do pão,

recebe modestamente
a corriqueira fracção
desse alimento que é
tão distribuído, tão

a domicílio como
o leite ou o pão.
Mas esse leitor aí
(bem real!) já diz que não,

que nunca viu no tal saco
o tal «não».
Ao que o poeta responde,
sem maior desilusão:

– Para dizer a verdade,
eu também não…
Mas estava confiante
na sua imaginação

(ou na minha…) e que sentia
como eu a solidão
e quanto ela é objecto
da carinhosa atenção

de quem hoje nos fornece
o quotidiano «não»,
por todos os meios, desde
a fingida distracção,

até ao entre-parêntesis
de qualquer reclusão…

Alexandre O´Neill de Abandono Vigiado em No Reino da Dinamarca

3 comentários:

Simon Durochefort disse...

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Seve disse...

Simon Durochefor - um mecenas ou um agiota?

Ou ter-se-à enganado no n°. da porta?

Sammy, o paquete disse...

Eles nunca se enganam, Seve. Vão mandando barro à parede em busca de incautos. E encontram muitos...
Chegámos a isto!...