Este salto sem rede, no vazio incógnito de um novo ano.
Chamem-lhe futuro.
Sophia Mello Breyner
Andresen sempre se admirou por as pessoas celebrarem a passagem do ano, dizia
ela que o ano está sempre a passar.
Há quem nunca deseje bom
ano a ninguém, dizem que dá azar.
E há a velha sabedoria que nos diz que os anos só são novos enquanto os novos somos nós.
Se viram um amável filme da norte-americana Nora Ephron, com Meg Ryan e Billy Cristal, «When Harry Meet Sally», que, parvamente, em português se chamou, Um Amor Inevitável, o tal filme em que a Meg Ryan simula um orgasmo em pleno snack e, finda a performance, a cliente da mesa ao lado, que esperava para fazer o seu pedido, volta-se para o empregado e diz: «quero o mesmo que aquela senhora», e certamente lembrar-se-ão que quase no final do filme, quando, numa festa de fim de ano, Harry reencontra Sally, começam a ouvir-se os acordes de Auld Lang Syne, e Henry diz que nunca entendeu o significado da canção pois diz que os velhos conhecidos devem ser esquecidos ou que se os esquecemos devemos recordá-los mas como recordar se já os esquecemos? Sally não tem resposta mas, sorrindo, acaba por lhe dizer: “seja o que for é uma canção sobre velhas amizades”.
Chegamos a bom porto: velhas amizades, lembrar os que já não estão connosco,
com os que estão, os que ainda fazem do Tempo de Natal a festa dos amigos,
celebrar a amizade, sempre, enquanto não chega a hora do adeus.
É isso!
E sabendo que o meu cachimbo está apagado, o meu copo vazio, ouvir aquela canção celta:
«Que a estrada se abra
à tua frente,
Que o vento sopre levemente nas tuas costas,
Que o sol brilhe morno e suave na tua face,
Que a chuva caia de mansinho nos teus campos.
Ou aqueles versos de um poema do Jorge de Sena:
«Já tudo
escureceu;
contudo ainda resta
algum dia
suspenso de onde veio a noite que chegou primeiro.
É de sempre este resto de dia
e acompanha-a pelo céu em busca das estrelas frágeis.
A noite, uma vez,
compreenderá que ele vem do mesmo lado que ela.»
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