O governo de direita-ultra-liberal de Luís Montenegro, nos poucos meses em que vem actuando, tem-nos dado atitudes e imagens verdadeiramente lamentáveis.
A exibição policial na Rua do Benformoso terá sido a mais execrável.
«A noção de necropolítica foi introduzida
por Achille Mbembe para designar as operações cirúrgicas praticadas sem
anestesia no corpo das populações, em que as intervenções, comportando uma boa
dose de violência efectiva e, ainda mais, de violência simbólica, são sempre
político-cirúrgicas. A necropolítica usa a necropolícia para realizar a
cirurgia política.
Tem “necro” no nome porque governa a partir da produção da morte, física ou
social, e está ancorada no estabelecimento de uma hierarquia dos vivos. O
conceito de necropolítica engloba, portanto, o direito de impor a morte social
ou civil, a submissão incondicional e diversas formas de violência política.
Uma imensa fila de corpos encostados à parede pela necropolícia, numa rua de um
bairro da cidade habitado maioritariamente por migrantes, serve para mostrar
corpos que perderam todo o seu poder, socialmente mortos. É isto a política do
medo, longamente testada noutras ocasiões históricas.»
António Guerreiro no Público de 27 de Dezembro
«Fugindo à gritaria, o que mesmo importa é a pergunta que nos deixou Pacheco Pereira: “se fosse eu a caminhar pela rua, teria sido encostado à parede e revistado?”E a isso, claro, não respondeu o primeiro-ministro. Fazendo prova de uma lógica rebuscada – talvez Marcelo Rebelo de Sousa lhe chamasse lógica urbano-ó-rural, numa palavra, rústica – veio Luís Montenegro afirmar, justificando o aparato: "Muitas vezes não é preciso que haja muitos crimes para que as pessoas se sintam inseguras".
Tem toda a razão. Entre realidade e percepção da realidade existem muitas diferenças. O que me encanitou na frase foi a conclusão a que ela obriga. Considerados os resultados práticos da operação – escassíssimos, to say the least – terá redundado do espectáculo do alinhamento a convicção de que, afinal, há mesmo poucos crimes na zona e podemos todos sentirmo-nos seguros? Os mais velhos, chegando a acrescentar: “Ó Ernestina, vamo-nos embora qu’ isto foi tudo uma grande aldrabice!”?»
Ana Cristina Leonardo no Público de 27 de Dezembro
Sem comentários:
Enviar um comentário