É a maior festa de sempre.
Em que sentido? No sentido da sua duração. A Festa do Avante! tem duas partes: uma que acontece durante três dias na Quinta da Atalaia, no Seixal, e a da luta no espaço público que a antecede. São as duas boas, mas, sem desfazer da primeira, a da luta que precede a festa propriamente dita é extraordinária.
Este ano foi José Milhazes que, na SIC-Notícias, abriu a pista. Afirmou-se surpreendido por existirem artistas dispostos a atuar nos palcos de um evento que, recordou, é político. Mostrou o cartaz do evento, onde se podem ver nomes como Carminho, Paulo Bragança, Paula Oliveira e Ricardo Ribeiro.
Recordemos que já atuaram no Avante! Camané, Carlos do Carmo, Bernardo Sassetti, Blind Zero, Capicua, Ana Moura, Carlos Paredes, Zeca Afonso, Da Weasel, GNR, Jorge Palma, Madredeus, Trovante, Sérgio Godinho, Xutos e Pontapés e tantos outros. Difícil é encontrar grandes nomes da música em Portugal que não tenham atuado na festa.
O que mudou agora?
Milhazes lançou os artistas, que figuram no cartaz deste ano, num escrutínio popular que, sabemos, é feroz e intolerante. Estes artistas viram-se assim envolvidos numa discussão na qual provavelmente nunca participaram nem desejaram fazê-lo. Conseguiu o que queria. Muitas pessoas alinharam nessa crítica e na destilação de ódio ao partido e à Festa do Avante!. Outros, em menor número, escolheram defender a festa e a liberdade de ir ou de participar. É oficial: a festa começou.
Atuar na Festa do Avante!, ou ir lá, não implica necessariamente ser comunista. É certo que, quem lá vai, não sentirá pelo PCP o repúdio que José Milhazes sente. Não é caso único. Mais jornalistas, supostamente isentos porque o fazem no exercício desta profissão, continuam a vir a público premir o gatilho contra o partido ou incitar a que outros o façam.
As posições que o PCP
defende relativamente à guerra são diferentes das que lhe são atribuídas. Mas
adiante – já não é assunto. Sobretudo, não são merecedoras de um apagamento de
cem anos de História e de luta ao lado dos trabalhadores portugueses. Disse um
amigo que não é comunista: “Portugal não é grande coisa, mas seria muito pior
sem o PCP.”
Não gostaria de viver num país onde os artistas se recusassem atuar no Avante!. Seria sinal de tristes tempos. Tenho a convicção que parte dos artistas que aceitou atuar na festa não o fez por concordar com as posições do partido relativamente à guerra na Ucrânia ou tão pouco para marcar presença em prol do fim da precariedade laboral. Ter-se-ão limitado a reconhecer naquele evento um momento de divertimento, convívio e democracia que faz parte do calendário das festividades dos portugueses.
Retirar consequências políticas da presença no cartaz, e num tema tão polarizador como a guerra, não é sério e não é justo. Milhazes quer rebaixar o PCP à categoria de partido repulsivo e faz campanha pública nesse sentido. Sucede que, se fosse bem sucedido nessa demanda, não era a Rússia ou Putin que ficariam a perder; seriam os trabalhadores portugueses, a esquerda de um modo geral e a própria democracia.
Não se deve levar a mal porque estes episódios já são a festa. Aconteceu também no ano passado, mas com a pandemia. Houve o terrível escândalo de se atreverem a realizar o evento e de terem autorização para o efeito. Muita tinta correu. Recorde-se que fizeram tudo de forma organizada e exemplar. E que não houve notícia de qualquer surto. Recorde-se também que havia pessoas de grupos de risco a participar. Ou seja: recorde-se que, no fim, deram uma lição de como fazer as coisas bem feitas.
Alguém deveria
informar Milhazes, e seus congéneres, que esta forma de combater o Partido
Comunista Português não resulta. Sá Carneiro ao menos sabia qual era – e é – a
empreitada do PCP
Já no mês passado, em Tomar, na apresentação do seu livro, respondendo à provocação de poder vir a enriquecer com a venda, Milhazes anunciou que compraria a Quinta da Atalaia. Já queria festa. Nem o Natal se prepara com tanta antecedência.
Alguém deveria
informar Milhazes, e seus congéneres, que esta forma de combater o Partido
Comunista Português não resulta. Estão a radicalizar quem tiver uma mera
simpatia, a chamar para as trincheiras quem só estava a apanhar sol. Sá aqui não resisto: “A melhor maneira de
combater o comunismo é melhorar as condições dos trabalhadores.” Sá Carneiro ao
menos sabia qual era – e é – a empreitada do PCP.
Carmo Afonso no Público de hoje
1 comentário:
Excelente e muito oportuno este artigo d O PÚBLICO
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