Portugal conhece bem o problema dos refugiados. O fim
do império foi acompanhado pela chegada de centenas de milhares de
"retornados", que na verdade eram refugiados nacionais fugindo para
salvar a vida, como é o caso de todos os refugiados. Em 1974 e 1975, o Império
caiu, mas não o Estado. Mesmo os portugueses nascidos em África regressaram a
uma casa que era sua, com leis e políticas de acolhimento. Mas Portugal
conheceu também os refugiados que perderam tudo. A filósofa judia alemã Hannah
Arendt e o seu marido residiram na Rua da Sociedade Farmacêutica, n.º 6, em
Lisboa, entre janeiro e maio de 1941, à espera do navio para Nova Iorque. Ela
pertencia à categoria de refugiados sem Estado e sem pátria. Vítimas do Leviatã
que os deveria proteger. Em 1943, já em solo americano, ela escreveu:
"Perdemos o nosso lar, ou seja a familiaridade da nossa vida quotidiana.
Perdemos a nossa profissão, ou seja a segurança de termos alguma utilidade
neste mundo. Perdemos a nossa língua materna, ou seja as nossas reações naturais,
a simplicidade dos gestos e a expressão espontânea dos nossos sentimentos.
Deixámos os nossos pais nos ghettos da Polónia e os nossos melhores amigos
foram assassinados em campos de concentração, o que significa que as nossas
vidas privadas foram destruídas." As palavras de Arendt poderiam ser
repetidas por muitos daqueles que fogem hoje das garras do Estado Islâmico, e
das ruínas de sociedades destruídas. Politicamente, a Europa ainda não percebeu
o problema. Mas os Europeus, como indivíduos, parece que sim. Quando as
famílias islandesas se propõem receber 50 000 refugiados (o que corresponde a
um sexto da sua população!), isso significa que a ética essencial não foi
esquecida: quando o "deus mortal" cai, as pessoas só se têm uma às
outras.
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