domingo, 20 de setembro de 2015

OLHAR AS CAPAS


Poesia Um Dia

Carlos Alberto Machado, Hélia Correia, Jaime Rocha, José Mário Silva Margarida Vale de Gato, Miguel-Manso
Capa: Orlando José Martins Ruivo
Colecção Azulcobalto, Setembro 2014

O senhor por exemplo o que é que o leva a participar
numa manifestação numa tarde tão quente?
Era ontem um peixe sufocado o meu país,
hoje súbito tanta gente buscando brilho de água
que se move
Não sei onde fica, não é um lugar no mapa
É um espaço na boca com sede da gente
numa tarde a mover-se com muito calor, o meu país
Um peixe, um sítio pouco evidente,
ou corpo
exangue, coalho, desabituado de saber
como se juntam os membros, respira-se aqui
com dificuldade, desenvolve-se vocação de submerso
Precisamos de ar
que é uma pergunta a que não se teria de responder logo
porque de princípio devia haver em toda a parte
como O que faremos nós?
O que havemos de fazer
com este peixe? Peixe era cristo e repartiu-se
para se tornar maior – disseram-me que isso era amor
mas eu não sei se creio
De manhã lembrei-me de um país para todos
onde no interior voltassem a crescer crianças
a arregaçar as fraldas das velhotas, esta tarde na TV parece
que meu país é mais que peixe, mas não vou chamar-lhe frota nem mar
pois basta hoje a poesia dos fenómenos pouco óbvios
de quando se juntam pessoas e há sempre alguma coisa,
acontece

(Margarida Vale de Gato a partir de Ruy Belo in Palavras de Lugar)

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