É a pele da terra, dizia o Lince, colocando as grandes
fatias de musgo na canastra. O presépio de minha avó tinha fama. Construía-o
junto à parede do fundo da sala de jantar, utilizando caixas de papelão e
espelhos com que fazia as montanhas e os lagos da Judeia. Cobria os montes com
flocos de neve, punha a cabana em Belém, com o Menino nas palhinhas, rodeado
pela Mãe, por José, pelos pastores, pelo jumento e pela vaca. Depois as luzes,
de várias cores. E uma estrela amarela que apontava para o caminho aos reis do
Oriente.
Também armava a árvore de Natal, com um pinheiro que o
Lince cortava em Romarim. Mas eu preferia o presépio. Sempre achei que o da
minha avó era o mais bonito de Alma, mais ainda do que o da Igreja. Trazia os
meus amigos para eles verem. E toda a gente admirava, até Aurélio Silveira e
Florêncio Tavares, republicanos, laicos e anticlericais, ainda que
considerassem Jesus Cristo como um correligionário.
Então a casa ficava diferente. Talvez por causa do
cheiro do musgo, das luzes a acender e a apagar na árvore e no presépio, talvez
porque era Natal e havia um não sei quê no ar, tudo mudava, a casa, as pessoas,
o ritmo.
Manuel Alegre em
Alma
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