sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

OLHAR AS CAPAS


Luz de Agosto

William Faulkner
Tradução: Armando Ferreira
Capa: Infante do Carmo
Colecção Dois Mundos nº 58
Livros do Brasil Lisboa, s/d

Eis do que Byron Bunch se recorda: Foi há três anos numa sexta-feira de manhã. Os homens, na secção de aplainamento, levantaram os olhos e viram um desconhecido, de pé, que os olhava. Não sabiam há quanto tempo ali estava. Tinha o aspecto de um vagabundo, e no entanto, não era exactamente como um vagabundo. Tinha os sapatos cheios de poeira e as calças também estavam sujas. Mas eram de uma sarja decente e bem vincadas; a camisa estava porca, embora fosse uma camisa branca, e trazia gravata e chapéu de palha quase novo, que usava de banda, num jeito arrogante, sobre o rosto impassível. Não tinha o ar de vagabundo profissional com os seus andrajos profissionais, mas parecia um ser sem raízes, como se não pertencesse a nenhuma cidade, como se não houvesse uma rua, uma parede, um bocado de terra que lhe fosse familiar. Apenas levava consigo a sua sabedoria, como se transportasse um estandarte, com seu quê de bravata, de solidão e até de altivez. «Era como se estivesse passando um mau bocado que esperava ver acabado depressa, sem se importar saber de que nunca se sairia dele», disseram os homens mais tarde. Era novo. E Byron observava-o: de pé, um cigarro ao canto da boca, cabeça um pouco inclinada por causa do fumo, olhando com uma expressão de sombria calma desdenhosa os homens de fatos-macaco manchados de suor. Ao fim de algum tempo, cuspiu a beata, sem a agarrar com a mão, e, dando meia volta, dirigiu-se para o escritório da serraria. Os homens dos fatos-macaco desbotados e sujos olhavam-no pelas costas com uma expressão indignada e perpelexa. «Devíamos passa-lo à plaina – diz o contra-mestre – talvez lhe tirássemos o aspecto que tem».

1 comentário:

Seve disse...

Grande livro. Vale a pena ler.