Consta que no dia 21 de Julho de 1969 a
Humanidade deu um enorme salto em frente.
Precisamente às 2.56 UTC…
Mas eu não dei por nada…
Tinha sido um fim-de-semana desgastante a subir e a descer arribas
entre a Praia da Adraga e a Praia da Ursa com o meu amigo João Pedro, e quando
os pais dele me depositaram em casa no Domingo à hora do jantar, não obstante
toda a juventude dos meus dezasseis aninhos,
estava arrasado e só queria ver a cama à minha frente…
Pedi lá em casa para, na altura própria, me
acordarem.
Mas ninguém me veio chamar…
Esquecidos pela emoção do momento ou por se
estarem, pura e simplesmente, a borrifar para o puto, nenhuma santa alminha se
lembrou de me vir acordar, como lhes tinha pedido…
Assim, terei sido das poucas pessoas deste
Mundo dito civilizado a perder esse momento histórico.
Mas quando na manhã do dia seguinte me
levantei e vi, irritado, as imagens em repetição, larguei dois ou três berros
ofensivos para quem estava à minha volta e jurei que ainda um dia haveria de ir
ali…
Ali não era a lua, claro está, mas Cape
Canaveral, de onde Armstrong, Aldrin e Collins tinham partido cinco dias antes.
E o facto de só ter cumprido a promessa
quase 50 anos depois não teve, para mim,
qualquer importância…
A caminho do mítico lugar, e sem saber
muito bem o que me iria esperar, comecei a salivar imaginando o que gostaria
que fosse.
Os americanos, de tão profissionais que
são, não iriam deixar de me impressionar com uma magnífica e diversificada
exposição. Certamente que haveria, imaginei eu, um espaço destinado ao Cinema
de temática espacial, outro destinado à Música, um outro ainda à Literatura, e
por aí fora…
Em relação ao Cinema, não poderia haver
qualquer dúvida… Então não tinha o cinema de ficção começado, precisamente, com
uma deliciosa “Viagem à Lua” (Georges Méliés, 1902)…? E não deram as viagens
espaciais, por todo o Mundo e não apenas na América, pano para mangas ao
Cinema, desde os tempos do mudo (o dinamarquês “A Trip to Mars” de 1918, o
soviético “Aaelita”, de 1924 , o alemão “Uma Mulher na Lua” de 1929, …) até aos
grandes Clássicos dos dias de hoje,
passando por todos aqueles magníficos pequenos
filmes de série B dos anos 50 (“Destination Moon”, “Forbiden Planet”,
“From the Earth to the Moon”, “Day the Earth Stood Still”, “Earth vs. Flying
Saucers”, são tantos, meu Deus…!), em que tantas vezes naves espaciais e seres
vindos de outros Planetas mais não eram do que fantasmas do outro lado da
Cortina, próprios daqueles anos de “guerra fria”.
Na Literatura iria encontrar Jules Verne e H.
G. Welles, claro está, e tinha quase a certeza de que também iria descobrir,
algures no fundo da sala e em tamanho gigante, um poster daquela inesquecível
capa do Tintim e da sua “Viagem à Lua”, da minha meninice. Mas também não
deixaria de encontrar por lá, certamente, uma homenagem a todos aqueles
pequenos/grandes escritores da Ficção Cientifica dos anos 40/50 (Arthur C.
Clark, Isaac Asimov, Philip K. Dick, …) os quais, com exceção do Stanislaw Lem
e do Ray Bradbury, só conheço de ouvir falar e de ter visto alguns dos seus
livros adaptados ao Cinema, porque desde muito cedo o meu coração balançou
sempre muito mais para o Romance Policial do que para a Ficção Científica…
Em relação à Música, Kubrick fez com que
não pudéssemos deixar de imaginar passeios no espaço sem ouvirmos o “Danúbio
Azul” mas, muitos anos mais tarde, Clint Eastwwod provou que também poderemos
ter a mesma sensação ao som dos velhos “standards” da Música Popular Americana.
Mas foi ao relembrar as músicas da minha adolescência que deparei com uma
coincidência que nunca antes me tinha vindo à cabeça: então não é que uma das
bandas que mais gosto de usar em longas viagens de carro pela estrada fora (os
Byrds…) foi, entre o amor pelos aviões de Roger McGuinn e o pavor de andar
neles de Gene Clark, também aquela que
mais atenção dedicou à música espacial…?
E não me refiro, apenas, às suas músicas que acabaram por ser catalogadas
como “space rock” (Mr. Spaceman, “CTA – 102”, “Eight Miles High”, …), muitas delas meras metáforas de outras
“trips” e outros espaços, mas a homenagens mais óbvias e singelas, como “Spacey Oyssey” do álbum “The Notorious
Byrd Brothers”, que antecipa Kubrick ao se inspirar na mesma “short Story” de
Arthur C. Clarke que viria a dar origem ao “2001”, mas também, e acima de tudo,
a “Armstong, Aldrin and Collins”, do LP “Ballad of Easy Ryder”, que celebra o
lançamento da Apollo 11 e que começa com a contagem decrescente, passa ao
acionamento dos motores e acompanha o barulho da nave a subir enquanto é lançada pelos ares:
“Minus 20 in
counting … 19..18..17..16..15..14..13..12..11..10..9..8..7..6..5..
We have ignition
… 3..2..1
We have lift off”
E depois a voz de Roger McGuinn:
“Armstrong,
Aldrin and Collins were launched away is space
Millions of
hearts were lifted, proud of the human race
Space controla
at Huston , Radio Command
The team below
that gave the go, they had God’s helping hand”
E quanto mais pensava nisto tudo rolando
pela 528 a caminho de Cape Canaveral, mais salivava…
E
foi assim, com um sorriso no rosto, que finalmente entrei no Kennedy Space
Center, disposto a degustar todos estes meus pequenos prazeres…
E depois….
Bem, depois foi um tremendo soco no
estômago…
O espaço era gigantesco, mas estava
inteiramente devotado à Técnica, à história da exploração espacial e à propaganda
da NASA, e tudo o mais foi esquecido.
Como, aliás, teria sido de
esperar, não fosse eu o otimista que sou, os americanos borrifaram-se nas
outras formas de Cultura e da sua
ligação às viagens espaciais…!
Poderia ter almoçado com um astronauta veterano...
Teria sido possível, se não tivesse chegado
a desoras, apanhar um “shuttle” para a base da rampa de lançamento dos
foguetões…
Poderia ter tido (como na realidade tive…)
a sensação de viver uma simulação de lançamento no interior de uma nave espacial…
Mas dos meus pequenos prazeres, nicles…
Desolado e sabendo que a Técnica pouco me
interessava, limitei-me a fazer render o investimento deambulando pelo meio de
foguetes, foguetões, vai-vem espaciais, ogivas e outros peças de inquestionável
interesse histórico, como a réplica da cápsula da amaragem do Apollo 11, mas que não me aqueciam o
coração…
E foi entristecido que, com a minha mulher
e a minha filha, me meti de novo ao caminho, em direção a Daytona Beach.
Mas ainda me ri para comigo à saída, lembrando-me
do Bowie e do seu Major Tom, bem capaz de ainda andar lá por cima às voltas a
rir-se de todos nós:
“Ground control to Major Tom
Grand control to Major Tom
Your circuit’s dead, there’s something wrong…
Can you hear me, Major Tom…?
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“Here am I floating ‘round my tin can
Far above the moon
Planet heart is blue
And there’s nothing I can do…”
PS: Quanto à evolução da Humanidade,
estamos conversados…
Texto e fotografias de Luís Miguel Mira
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