António ramos
Rosa escreveu da melhor poesia portuguesa contemporânea.
Um homem
amável que viveu quase sempre com imensas dificuldades económicas. agarrado a
uma saúde muito débil.
De manhã
escrevia os seus poemas, à tarde desenhava e elaborava as suas críticas
literárias, traduzia, escrevia cartas aos seus pares e essa é uma parte importantíssima
do seu espólio.
Grande parte das fotografias de Ramos Rosa mostram-no sempre rodeado
de livros, jornais, papéis e desenhos.
Gosto muito
de António Ramos Rosa.
Vergílio
Ferreira também.
Ao longo dos
volumes da sua Conta-Corrente, Vergílio Ferreira tem algumas referências
a António Ramos Rosa.
Esta pertence
ao 1º volume, foi escrita a 26 de Fevereiro de 1969, uma quarta-feira:
«Conversa pró-prandial com o Ramos Rosa
num café. Que personagem curiosa este grande poeta. Claude Roy disse dele,
salvo erro, que lembrava um Quixote surrado. Enganou-se de mundo, anda aqui por
se ter distraído. Porque ele nasceu para viver noutro lado onde não haja regras
de trânsito, de disciplina, de subsistência. De modo que faz um esforço enorme
para se acomodar. Um grande achado para ele foram as práticas do ioga ou coisa
que o valha. O mundo em que circula desarranja-lhe os mecanismos interiores. E
toda a sua preocupação é consertá-los. Mas ele a compor e a realidade a
estragar. Quando julga que venceu, fica radiante. Dias depois volta à oficina
com o psíquico esmurrado. Não chegará nunca a tirar a carta de condução no
mundo. Hoje trazia outra descoberta: mastigar interminavelmente um pedaço de
alimento até sentir vómitos. Isso lhe afinaria o sabor para recuperar um
paladar originário. E ria. E estava feliz. Nós alimentamo-nos tão
estupidamente, com um paladar tão encortiçado. Ele quer restaurar cá, o sabor que deve haver talvez do lado de lá.
Encantado com a descoberta. E eu com o encantamento. Adorável poeta.
Extraordinário poeta.»
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