segunda-feira, 2 de novembro de 2020

POSTAIS SEM SELO

Quando nos morre alguém, para lá de tudo o mais, passa a existir um espaço mental e físico desalinhado. Quem perdemos fazia parte de um ritmo antigo, de uma repetição cadenciada de experiências que se nos entranhou na pele. Esta perturbação é mais subtil do que a tristeza imensa, mas não menos letal. Aparece sob a forma de uma cadeira vazia à mesa de jantar, coisa com a qual já contávamos mas que mesmo assim nos surpreende; como uma campainha habitualmente pontual mas agora inexplicavelmente muda; ou, ainda, vestida de uma voz cujo silêncio, naquele exacto momento, nos arranca as orelhas.

Filipe Nunes Vicente 

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